VALOR ECONÔMICO
Cristiane Perini Lucchesi, de São Paulo
O movimento de alta do dólar contra o real Brasil tem sido causado pela ação de bancos e fundos mais agressivos e não por empresas em busca de proteção contra oscilações cambiais. Os exportadores também estão tímidos e ainda esperam para adiantar seus fechamentos de câmbio. Pelo menos por enquanto, são os especuladores que têm se aproveitado da saída de estrangeiros do país para repor perdas no mercado internacional e puxado o dólar para cima. Ontem, foi a R$ 1,8180, alta de 1,67%. Muitos analistas já falam em exagero. Em relação ao seu menor nível, no início de agosto, já subiu 16,61%. No ano, a alta da moeda americana é de 2,31%. Em setembro o dólar subiu 11,19%.
Durante o dia, a moeda americana chegou a ter valorização de 2,87%, mas o Banco Central deixou de comprar no mercado à vista pela primeira vez desde outubro do ano passando. Nos últimos dias, com o agravamento da crise externa, o BC vinha comprando pouco: cerca de US$ 50 milhões por dia. Mas, segundo analistas, a autoridade monetária teria ficado de fora do mercado justamente para não dar mais munição aos especuladores. Os rumores de que o BC pode deixar de rolar os swaps cambiais reversos de US$ 2 bilhões que vencem no início de outubro começaram a circular. Isso significaria na prática venda de dólar no mercado futuro e contribuiria para derrubar seu valor, se o BC julgasse necessário.
O BC tem armas de sobra para conter uma puxada especulativa no câmbio. Além das reservas de mais de US$ 200 bilhões, pode simplesmente deixar de rolar os swaps cambiais reversos que chegam a somar US$ 20 bilhões e dão prejuízo a ele. Nos swaps reversos, o BC ganha dólar mais o cupom cambial (juros em dólar no mercado interno) e paga real mais os juros internos.
É por causa dessas armas todas e da própria taxa de juros alta no mercado interno brasileiro que apostar em uma puxada forte no câmbio é arriscado. Ainda mais considerando-se que a economia do país continua a crescer. Mas as tesourarias dos bancos e fundos mais agressivos têm procurado ganhar com as oscilações de curto prazo. Os fundos mais sofisticados têm até mesmo montado posições compradas em volatilidade, que são estruturas com opções (direito de compra ou venda do dólar no futuro). Quem fez essas apostas na volatilidade de curto prazo ganhou. A volatilidade implícita nas opções de 15 a 20 dias de vencimento passou de 13% a 15% para 26% a 27%.
“Localmente, os bancos estão alavancando o preço da moeda americana para otimizar ganhos nas saídas dos estrangeiros”, diz Sidnei Moura Nehme, diretor-executivo e economista da NGO Corretora de Câmbio.
Isso, segundo ele, levou a um movimento “especulativo” no mercado futuro, com apostas contra o real na Bovespa BM&F, que “turbinaram” o movimento de alta. Até anteontem, o total de posições compradas em dólar (vendidas em reais) dos estrangeiros no mercado futuro, considerando-se o dólar mais o DDI (cupom cambial), chegava a quase US$ 3 bilhões, mas vinha crescendo em relação aos US$ 800 milhões do dia anterior.
Banco nacional informa que muitos importadores seus clientes já trabalhavam com o dólar a R$ 1,90 ou até R$ 2 em seus orçamentos para este ano e por isso não estão preocupados com a cotação hoje. “As empresas não estão procurando nem comprar nem vender dólar neste momento: estão esperando para ver”, afirma Alexandre Ferreira, vice-presidente de tesouraria do WestLB. Para ele, o dólar já subiu demais e a compra da moeda brasileira começa a ficar atrativa.
Grandes bancos dizem ter observado exportadores esperando para entrar vendendo dólar, trazendo ao país suas receitas com exportação ao menor sinal de que a moeda americana vai começar a cair. Isso pode provocar uma apreciação rápida do real, acreditam analistas.
Há riscos, no entanto. O principal é a crise externa. Não há quem consiga ver um final para a falta de crédito, liquidez e solvência do sistema financeiro dos países ricos, que já dura mais de um ano. Sempre que um banco é socorrido, outra instituição financeira passa a se tornar a bola da vez e suas ações despencam. Ontem, o Bank of America iniciou negociações para comprar o Lehman Brothers, após as ações da empresa caírem mais do que 45% na terça-feira.
Alguns bancos acreditam que empresas brasileiras que compraram opções de compra com o dólar de exercício baixo demais teriam de vir a mercado em breve em busca de proteção caso a moeda americana continuasse a subir e se mantivesse em níveis elevados. Essas empresas pressionariam o dólar para cima. Há também vencimentos de dívida externa corporativa que dificilmente serão rolados em um momento conturbado como esse nos mercados internacionais. Essas empresas vão comprar dólar para remeter, causando uma valorização da moeda.