A União Europeia surpreendeu nesta sexta-feira (29) ao anunciar um conjunto de medidas, ainda carentes de detalhamento e com diversos trâmites burocráticos pelo caminho, no sentido de aliviar a situação financeira dos países mais fragilizados e dar espaço para iniciativas pró-crescimento.
Entre as mais importantes se destaca a recapitalização dos bancos europeus por meio dos fundos de resgate (já usados para “salvar” Grécia e Portugal), uma reivindicação da Espanha, e que representa uma “vitória” para o primeiro-ministro Mariano Rajoy. Na prática, a medida representa um resgate financeiro para o país, mas sem a desvantagem de incrementar a dívida soberana, como nos casos anteriores.
O setor bancário europeu é uma fonte primordial de preocupação no Velho Continente, e nos últimos meses o BCE (Banco Central Europeu) já ajudou as instituições financeiras por meio de empréstimos de bilhões de euros a juros bastante baixos.
Os mercados financeiros reagiram com entusiasmo às novidades. Somente em Milão, a Bolsa de Valores italiana valoriza mais de 4%, enquanto a Bolsa alemã sobe 3,8% e a Bolsa do Reino Unido, outros 2%. Na Espanha, um dos países favorecidos pelas novas medidas, a Bolsa dispara quase 5%.
Em Bruxelas, a chanceler da Alemanha, Angela Merkel, considerou que foram tomadas decisões importantes, mas salientou que os países beneficiados terão que prestar contas.
“Vamos nos manter totalmente em nosso esquema de prestação, contraprestação, condicionalidade e controle, e neste sentido creio que fizemos algo de importante”, disse ela, ao chegar para o segundo dia da reunião de cúpula em Bruxelas.
RECAPITALIZAÇÃO DOS BANCOS
A medida mais visível entre as anunciadas hoje, e que representa uma vitória para o premiê espanhol Mariano Rajoy, diz respeito à capitalização dos bancos europeus.
O setor bancário europeu está no epicentro da crise no Velho Continente. Carregados de títulos emitidos pelos governos, os bancos estão expostos à frágil situação financeira de nações muito endividadas e com rombos em suas contas públicas.
Na Espanha, o quadro é ainda pior, devido a uma recente crise imobiliária, que resultou em taxas de inadimplência históricas.
Hoje de madrugada, as lideranças europeias atenderam uma reivindicação da Espanha, ao permitir que os recursos dos fundos de resgate (que já salvaram Grécia e Portugal) sejam direcionados para ajudar diretamente os bancos europeus.
O alvo claro são os bancos espanhóis. O empréstimo já acertado de até 100 bilhões de euros (US$ 125 bihões) para recapitalizar esse setor bancário vai ser canalizado através do Fundo Europeu de Estabilidade (FEEF) e que será transferido ao Mecanismo Europeu de Estabilidade (MEDE).
O FEEF é o fundo de resgate financeiro de caráter temporário, que será absorvido pelo fundo permanente MEDE assim que entrar em vigor, provavelmente no início do segundo semestre.
Essa forma de “resgate” disfarçado era uma reivindicação da Espanha, que não queria ser estigmatizada com o mesmo tipo de ajuda financeira fornecido pela UE para a Grécia, Portugal e Irlanda.
MERCADO DE TÍTULOS
Os líderes da UE também concordaram em permitir que esses fundos de resgate sejam utilizados nos chamados mercados de títulos soberanos.
Os países regularmente acessam esses mercados como alternativa de financiamento para suas contas públicas. Os Tesouros nacionais emitem títulos soberanos (parcelas dívida pública) que pagam juros aos compradores.
O problema é que, diante da situação financeira complicada de várias nações, esses investidores começaram a exigir juros cada vez mais altos para adquirir esses títulos, o que passou a comprometer o quadro fiscal desses países, numa espécie de círculo vicioso.
Ao acessar esses mercados de títulos, portanto, os fundos de resgate podem amenizar a pressão dos investidores por juros mais altos, aliviando a situação dos países.
BUROCRACIAS
Apesar da recepção positiva dos mercados, essas medidas não terão efeito imediato.
A recapitalização dos bancos, por exemplo, que pode beneficiar os bancos espanhóis e italianos, por exemplo, está dependente da criação de um órgão de supervisão bancária unificado para o bloco europeu, o que está previsto para o final deste ano.
“Esses passos são medidas óbvias para tentar restaurar a confiança dos mercados, no curto prazo. Sozinhas, não resolvem os problemas mas podem ganhar tempo, o que é provavelmente o melhor que podem fazer agora”, disse Gary Jenkins, diretor da Swordfish Research, em Londres.
A própria Merkel apontou os obstáculos à execução das medidas.
Em relação ao futuro órgão de supervisão bancária, a chanceler afirmou que “primeiro deve haver um acordo unânime do Conselho [Europeu, braço executivo da UE] para que se crie uma autoridade desse tipo”.
“[Também] deve haver um acordo unânime no MEDE (o fundo permanente de resgate financeiro) que possibilite uma recapitalização direta dos bancos, (…) e deve haver uma decisão para cada banco”, acrescentou.
PLANO DE CRESCIMENTO
A União Europeia também aprovou na madrugada um plano de 120 bilhões de euros (US$ 150 bilhões) para incentivar o crescimento econômico e a geração de empregos, informou o presidente permanente do Conselho Europeu, Hernan Von Rompuy.
O valor é equivalente a 1% da riqueza nacional bruta dos países europeus, e vem de planos econômicos anteriores, não podendo ser considerado um financiamento novo, e é menor que os ? 130 bilhões pedidos por Espanha, Itália, França e Alemanha, proposto em uma cúpula na semana passada.
Para alcançar a verba pedida, os 27 membros do bloco usarão recursos do Banco Europeu de Investimento, os chamados bônus projeto e o Fundo Europeu de Investimento. “Não é apenas injetar dinheiro, mas fomentar a geração de empregos e a atividade empresarial sustentável”, explicou Van Rompuy.
De acordo com o plano da União Europeia, o Banco Europeu de Investimento poderá emprestar de 150 bilhões de euros a 180 bilhões de euros até o início de 2013, mas antes receberá uma ampliação de capital que será referendada pelo conselho da instituição até o fim do ano.