Brasil 247
Pisão de 0,5 meio ponto percentual na Selic pode representar instante de inflexão para a política econômica; taxa a 8% ao ano retoma patamar de julho de 2012; alinhamento entre Banco Central de Alexandre Tombini e Ministério da Fazenda de Guido Mantega é quebrado; resultados como a criação de 4,1 milhões de empregos desde o início do governo Dilma Rousseff poderão continuar?; burocracia do Copom zera estímulos de crescimento ao encarecer custo do dinheiro para combater inflação; ortodoxia recupera terreno.
Dois anos de estímulos ao crescimento da economia, coordenados pelo ministro Guido Mantega, podem ter sido catapultados pela gangorra dos juros na quarta-feira 29. Vale marcar bem essa data. Depois de passar o ano passado agindo em linha com a Fazenda, o Banco Central dirigido por Alexandre Tombini escolheu a última reunião do Copom no mês de maio para fazer a Selic voltar ao patamar de julho do ano passado, quando também era de 8%. A taxa está retomada agora, depois do pisão de 0,5 ponto percentual dado pela diretoria da instituição na contramão da política econômica do governo.
Com a Fazenda procurando esquentar e o BC jogando para esfriar a economia, a primeira buscando o crescimento, o segundo agindo como bombeiro da inflação, o sinal passado ao mercado é esse mesmo: dois objetivos diferentes para Tombini, um, e Mantega, outro. Entre eles, convencida pelos resultados que vão sendo, a duras penas, alcançados – inflação do mês passado dentro da meta e investimentos maiores, com o PIB do primeiro trimestre superando a melhor marca do ano passado, com 0,6% -, a presidente Dilma Rousseff.
Ela tem se esforçado para manter a maior autonomia do Banco Central, sem dar declarações que possam sugerir algum tipo de pressão. Mantega faz o mesmo. Mas parece óbvio que a presidente teria preferido, se tanto, uma elevação de juros em 0,25 ponto porcentual, a exemplo do que ocorreu na reunião anterior do Copom, ou a manutenção da Selic em 7,5%. O meio ponto, por unanimidade, surpreendeu negativamente muita gente, na mesma medido em que foi festejado pela chamada “tigrada” dos juros.
Entre os dois opostos, como deve se posicionar, por exemplo, um empresário que está pensando em investir para dinamizar seu negócio? Qual a verdade que fica para ele: a de Tombini que escolhe a maneira ortodoxa de combater a alta dos preços, sacrificando o crescimento pela majoração do custo do dinheiro, ou a de Mantega, que resiste a um tsunami de críticas da mídia tradicional em nome de manter o Brasil numa posição única no mundo, criando empregos à razão de 4,1 milhões desde o início do governo Dilma – 470 mil apenas no primeiro trimestre deste ano?
Escolhido para substituir Henrique Meirelles, no início do governo Dilma, por ser o quadro considerado de maior capacidade técnica na diretoria do BC, Alexandre Tombini é um funcionário de carreira concursado em 1998. Desde lá, afastou-se da instituição entre 2001 e 2005, para trabalhar como assessor sênior da diretoria executiva do Brasil no Fundo Monetário Internacional, em Washington. Não estava no País, assim, quando o então presidente Lula e o BC chefiado por Meirelles jogaram em sintonia com o Ministério da Fazenda para fazer o que Lula chamou, na ocasião, de “espetáculo do crescimento”.
Além do próprio Tombini, a maioria dos integrantes do Copom é de carreira do BC. Participam do comitê que decide os juros os diretores de Administração, Assuntos Internacionais e de Gestão de Riscos Corporativos, Fiscalização, Organização do Sistema Financeiro e Controle de Operações do Crédito Rural, Política Econômica, Política Monetária, Regulação do Sistema Financeiro, e Relacionamento Institucional e Cidadania. Esses titulares têm a força – e foram unânimes em tascar meio ponto porcentual sobre a Selic na reunião da quarta 29.
A burocracia do BC, distante dos centros nervosos da economia brasileira, pode entrar para a história como responsável pelo ponto de inflexão nos resultados da política econômica da presidente Dilma. Afinal, o que vier a acontecer com os níveis da inflação, do emprego e do crescimento estará diretamente ligado à unanimidade deles pela alta nos juros em maio.