Arthur Rosa e Laura Ignacio
Valor Econômico | De São Paulo
Empresas do setor de telefonia têm fechado acordos com trabalhadores e retirado da pauta do Tribunal Superior do Trabalho (TST) processos que discutem a terceirização de call center. As companhias TIM, Telemar Norte Leste (atual Oi) e Embratel e seus fornecedores de serviços encerraram recentemente oito ações. Os acordos fazem parte de uma estratégia para evitar a formação de novos precedentes contra o setor na Subseção I Especializada em Dissídios Individuais (SDI-1). O órgão unificador da jurisprudência do TST reconheceu recentemente o vínculo de emprego entre uma funcionária terceirizada da área de telemarketing e a Claro.
O setores de telefonia e de energia – assim como os de água e rodovias – apostam em uma reviravolta sobre a questão no Supremo Tribunal Federal (STF). Já obtiveram pelo menos quatro liminares contra decisões de segunda instância e do TST na Corte Suprema. No fim de novembro, o ministro Marco Aurélio atendeu o pedido formulado pela Companhia Energética do Ceará (Coelce), condenada em ação civil pública do Ministério Público (MPT) contra a terceirização de serviços de construção e manutenção da rede de distribuição elétrica.
A Coelce argumenta em reclamação que o TST não analisou a constitucionalidade do parágrafo 1º do artigo 25 da Lei nº 8.987, de 1995, que trata da concessão de serviços públicos. Apenas afastou sua aplicação, o que seria descumprimento da Súmula Vinculante nº 10 do STF. De acordo com o enunciado, viola a cláusula de reserva de plenário a decisão que, embora não declare expressamente a inconstitucionalidade de lei ou ato normativo do Poder Público, afasta sua incidência, no todo ou em parte.
Por meio de outra reclamação, a Federação Brasileira de Telecomunicações (Febratel) tentou suspender a tramitação de todos os processos nos tribunais trabalhistas que tratassem de tercerização. O pedido, porém, foi negado no início de novembro pelo ministro Gilmar Mendes, que havia anteriormente concedido liminar para a Vivo.
“A providência é inviável em sede de reclamação constitucional, ação impugnativa cujo escopo é combater atos que impliquem usurpação de competência do STF ou descumprimento de orientação jurisprudencial com efeito vinculante”, diz o ministro na decisão.
No fim de 2010, o ministro Ricardo Lewandowski também negou pedido da Associação Brasileira de Distribuidores de Energia Elétrica (Abradee) para suspender o andamento de todas as ações civis públicas em que se discute a terceirização. A solicitação foi feita em ação declaratória de constitucionalidade (ADC). Por meio do processo, a entidade pretende ver declarada a constitucionalidade do parágrafo 1º do artigo 25 da Lei nº 8.987.
A permissão para contratar com terceiros o desenvolvimento de atividades inerentes, acessórias ou complementares está prevista na norma que trata da concessão de serviços públicos e nas leis específicas desses setores. “Ao afastar a aplicação da lei sem declará-la inconstitucional, o TST esvazia todo o comando normativo”, afirma o diretor jurídico do Sindicato Nacional das Empresas de Telefonia e de Serviço Móvel Celular e Pessoal (Sinditelebrasil) e da Febratel, o advogado José Américo Leite Filho.
Ao analisar o caso da Vivo, o ministro Gilmar Mendes havia adiantado que poderia haver “uma possível contradição entre os termos da Súmula 331, III, do TST e o artigo 94, II, da Lei nº 9.472/1997 [Lei Geral de Telecomunicações]”. A súmula trabalhista limita a terceirização à atividade-meio das companhias.
“A lei permite a terceirização de atividades inerentes, essenciais”, diz o advogado José Alberto Couto Maciel, que defende as empresas Vivo, Oi, Embratel e Contax, que oferece serviço de contact center. “O TST, de uma forma retógrada, não está aceitando a terceirização no país. Por isso, decidimos ir ao Supremo.”
De acordo com o advogado Fábio Lopes Vilela Berbel, do escritório Bichara, Barata & Costa Advogados, que representa a TIM em alguns dos processos sobre terceirização, os acordos foram firmados entre as empresas de call center e os ex-funcionários. “Por meio desses acordos, os trabalhadores recebem valores que corresponderiam aos benefícios que pleiteiam e renunciam à discussão sobre a terceirização”, afirma. “O acordo dá tranquilidade aos ex-funcionários e ao mercado, enquanto o Supremo não julga o mérito da questão.”
Para advogados trabalhistas, o acordo é a melhor estratégia para impedir que decisões de mérito se consolidem contra as empresas no TST. Se a jurisprudência seguir esses caminho, poderia ser editada uma Orientação Jurisprudencial (OJ), o que torna muito mais difícil rediscutir a matéria. Para a instituição de uma OJ é preciso haver dez decisões unânimes ou 20 por maioria dos votos da SDI-1 no mesmo sentido. Na prática, na maioria das vezes, as OJs são seguidas pelos magistrados de todas as instâncias da Justiça do Trabalho.
“Ao contrário do que pode parecer, os acordos firmados não significam que a matéria está pacificada no sentido do reconhecimento do vínculo porque as empresas de telefonia e energia estão longe de se curvar a isso”, afirma o advogado Daniel Domingues Chiode, do escritório Gasparini, De Cresci e Nogueira de Lima Advogados. A razão disso é o fato de ainda haver um debate constitucional a ser travado, segundo ele. “E essa discussão deve favorecer as empresas.”