“Substituíram a ditadura militar pela ditadura midiática”, compara Kucinsky

“Substituíram a ditadura militar pela ditadura midiática, a dominação pelo consenso”, disse no sábado (2) o jornalista e escritor Bernardo Kucinski, sob aplausos da plateia que participou da segunda mesa da Feira Literária Internacional de Paraty (Flip), no interior do Rio de Janeiro.

A irmã e o cunhado de Kucinski foram presos e mortos pela ditadura e seus corpos continuam desaparecidos. Segundo ele, a Comissão Nacional da Verdade não terá resultados concretos, pois os poderosos que apoiaram o golpe de 64 continuam no poder.

“E as Forças Armadas não se reciclaram, não condenaram as atrocidades cometidas no passado. A tentativa de desinformar e a guerra psicológica continua em alguns setores militares, continua, ainda que diminuto,” declarou.

Filho de Rubens Paiva, que foi preso, torturado e morto pelos militares em 1971, o escritor Marcelo Rubens Paiva chorou ao ler um texto sobre o sofrimento da mãe e da família pela incerteza do paradeiro do deputado, cujo corpo continua desaparecido. O pai morreu na noite em que a esposa foi presa. Apenas em 1996, foi feito o registro de óbito de Ruben Paiva.

Marcelo foi aplaudido de pé ao lembrar da coragem e determinação da mãe, Eunice Paiva, na luta contra a ditadura. “Mamãe era uma dondoca. De repente, foi presa e saiu de lá muito magra e sozinha. E então começou a peitar a ditadura”, disse. “Passou a fazer parte de vários movimentos, a ser uma voz quase solitária contra a ditadura”. Posteriormente, Eunice estudou direito e passou a se dedicar às causas indígenas.

A mediadora da mesa e historiadora Lilia M. Schwarcz argumentou que os relatos dos participantes falavam de uma memória de um tempo que não passou e de uma história que ainda incomoda os brasileiros.

Revisitar os fatos e desnudar as verdades são fundamentais nos dias de hoje para os debatedores. “A história é complexa e por isso mesmo requer reflexão, uma boa pesquisa, leitura”, disse o economista Pérsio Arida, preso e torturado quando tinha 18 anos. “Se até pessoas que participaram do período têm essa confusão, imagina os garotos que moram na periferia de grandes cidades, que não têm acesso a essa história nas escolas”, disse Paiva.

“As novas gerações têm muitos poucos pontos de contato com as outras gerações, não tem continuidade. Para eles, a ditadura é um capítulo remoto da história do Brasil. O nível de desconhecimento é impressionante”, disse Kucinski.

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