(São Paulo) Dirigente do Observatório Social, da CUT, Kjeld Jakobsen participou no final de semana em Genebra, Suíça, do debate sobre NAMA (sigla em inglês de "acesso ao mercado de produtos não-agrícolas"), que vem sendo realizado no âmbito da Organização Mundial do Comércio (OMC). Ao lado de Jacy Afonso, da executiva nacional da CUT e Fernando Lopes, da Federação Internacional dos Trabalhadores Metalúrgicos, Kjeld representou o Brasil na reunião com a Central Sindical Internacional (CSI), que divulgou documento cobrando dos governos dos países em desenvolvimento que não façam novas concessões nas negociações que tratam da liberalização do mercado de produtos industriais. Abaixo, a entrevista de Kjeld ao Portal do Mundo do Trabalho.
O que aconteceu em Genebra?
Foram três dias e duas reuniões, principalmente dos sindicatos dos países do chamado NAMA 11, que inclui Brasil, Argentina, Venezuela, África do Sul, Egito, Índia, Tunísia, Indonésia, Namíbia e Filipinas, que estão participando das atuais negociações da Organização Mundial do Comércio. Os sindicatos de trabalhadores destes países fizeram um acordo, principalmente na área agrícola, pois não estão dispostos a aceitar a redução tarifária do acordo NAMA, que significa acesso a mercados não-agrícolas, que envolve tarifas industriais, mineração, pesca; enfim, tudo o que não for agrícola e não for serviços está ali.
Uma contribuição dos trabalhadores ao debate…
Exato. E isso é uma iniciativa importante porque é a primeira vez que se faz uma coalizão específica como essa no âmbito da Central Sindical Internacional, além da visão desses sindicatos terem o apoio da própria CSI.
E a declaração?
Assinamos uma declaração, que foi formalizada nesta reunião, e também participamos de uma conferência de imprensa onde colocamos nossa posição. Basicamente é que não aceitamos maiores concessões no NAMA. Temos a compreensão que os nossos governos já foram longe demais, achamos que eles devem recuar, pois não faz muito sentido negociar produtos industriais por agricultura. Isso por uma razão muito simples: o que se consegue no mercado agrícola hoje não é necessariamente a mesma coisa que se consegue no ano que vem. É um mercado muito volátil. Ou seja, você tem chuva, depende dos preços mundiais, o que você pode barganhar hoje, amanhã poderá perder. E no caso de bens industriais, o que perder você dificilmente recupera.
Seria uma troca perversa.
É uma troca desigual e o risco que nós temos é grande, se forem aceitas as redações tarifárias que os países poderosos querem. Isso afetaria vários setores industriais dos países em desenvolvimento. No caso do Brasil, seria principalmente o setor têxtil, vestuário, mobiliário, químico e automobilístico.
Um retorno ao período da República Velha?
Se corre o risco de continuar um processo de desindustrialização, como o que estamos vivendo. Há uma tendência clara das empresas multinacionais de que a América Latina, e o Brasil em particular, deveria explorar mais o seu potencial de terra, água e de bens naturais, enquanto eles exploram os bens industriais.
Para as multinacionais, a parte mais suculenta do bolo…
Claro, com maior valor agregado. Ou seja voltaríamos àquela situação da teoria da dependência: para ter acesso a produtos industriais, você precisa importar. A troca acaba sendo desigual. Para você comprar um automóvel teria que pagar com toneladas de milho e quanto mais milho você colocar no mercado, mais terá de colocar para pagar o automóvel, num ciclo vicioso. Por isso decidimos continuar a pressão sobre os nossos governos no sentido de não fazer mais concessões. Os Sindicatos dos países NAMA 11 têm uma visão diferente dos seus governos, mais contra o acordo.
Quais os próximos passos?
A vinda na CUT na sede nacional da CUT, em São Paulo, na próxima sexta-feira, de um diplomata, secretário do Itamaraty, já é fruto da carta que a Central mandou cobrando medidas do governo. Estamos caminhando juntos com a Central Sindical Internacional para somar força e ampliar a pressão
Fonte: Leonardo Severo, CUT