Durante reunião da CSA (Confederação Sindical dos Trabalhadores e Trabalhadoras das Américas), realizada em São Paulo nesta terça e quarta-feiras, o presidente da CUT Colômbia (Central Unitária de Trabalhadores), Tarsicio Mora Godoy, falou ao Portal do Mundo do Trabalho sobre a luta dos sindicalistas de seu país pela democracia e o direito à vida, denunciou a multiplicação dos assassinatos, a política de tortura e terrorismo de Estado. Nas linhas que se seguem, uma exortação à solidariedade e uma denúncia contundente dos descaminhos do governo de Álvaro Uribe, em conluiou com os paramilitares, em favor do grande capital transnacional.
Qual a situação do movimento sindical em seu país?
Há dois grandes elementos que têm levado à destruição do movimento sindical na Colômbia. Em primeiro lugar, o modelo econômico de globalização neoliberal, de abertura ao estrangeiro, para quem os sindicalistas representam um incômodo. Para este modelo, o sindicalismo é uma interferência indesejável, que necessita ser suprimida, já que se baseia na negação de direitos. Assim, é preciso eliminar os sindicatos, a fim de que os trabalhadores não tenham as mínimas garantias, maximizando os lucros das grandes empresas. O estado colombiano então, em vez de cumprir com suas obrigações, se converte então em escudo dos interesses das transnacionais, que desrespeitam convenções coletivas e direitos. Em segundo lugar está a eliminação física, com o comprometimento de várias instituições e autoridades com os paramilitares, que fazem da tortura e do assassinato uma dura realidade para os sindicalistas em nosso país.
A multinacional bananeira norte-americana Chiquita Brands reconhece que deu mais de US 1,7 milhão para grupos paramilitares de extrema direita colombianos, vinculados ao tráfico de drogas e responsáveis pela morte de centenas de lideranças.
Exato. Há muitos testemunhos a respeito disso e denúncias em nível nacional e internacional sobre o envolvimento da Chiquita Brands e da Coca-Cola, mas também contra várias multinacionais que, comprovadamente, financiam o assassinato de dirigentes. Além desses grupos paramilitares, há a atuação da própria força pública do Estado, de grupos delinqüentes, o que nos torna vítimas de um processo de extermínio físico que alcança mais de três mil dirigentes na última década. Neste ano somamos 36 companheiros assassinados, muitos sob tortura, em ações aterrorizantes.
Uma tragédia anunciada e praticada, já que sob o governo Uribe mais de 400 sindicalistas foram assassinados…
A situação, como disse, é gravíssima. Outro elemento para a destruição do movimento sindical tem a ver com a desregulamentação normativa. O governo Uribe acabou com os ministérios do Trabalho e da Saúde. Eles desapareceram, foram transformados em Ministério da Proteção Social, onde o trabalhador ficou completamente fragilizado, inteiramente desprotegido. Se tentamos cadastrar uma entidade sindical, no dia seguinte temos todos os seus dirigentes, todos, no olho da rua. Há um conluio entre o governo e as grandes empresas para evitar a ação dos sindicatos, que ficam sem as mínimas condições de fazer frente à proliferação das terceirizações e dos contratos temporários de trabalho, onde são negados direitos básicos como o atendimento à saúde. Dessa forma, o empregador economiza, pois paga o mínimo e se livra de todas as responsabilidades.
O esvaziamento das entidades é portanto uma conseqüência desta tragédia?
Evidente, principalmente porque o governo faz de tudo para burlar a normatividade do trabalho, com muitos funcionários envolvidos em ações violentas contra o sindicalismo. Nosso país vive uma situação de guerra constante, onde os dirigentes sindicais precisam chegar escoltados em carros blindados, com seguranças armados. Como fazer uma assembléia nestas condições? Com isso a sindicalização despencou e para uma população economicamente ativa de 18 milhões, temos apenas um milhão de sindicalizados.
Uribe fez recentemente uma reforma trabalhista que agravou o caos já imperante, como foi isso?
Costumamos dizer que agora na Colômbia o sol se põe às dez da noite. Obviamente que isso não é um fenômeno físico, mas determinado pelo governo, que roubou quatro horas dos trabalhadores para não pagar adicional noturno, nem horas extras. Também fez uma reforma da Previdência onde o trabalhador consegue se aposentar num dia para morrer no outro, já que dificultaram imensamente o acesso ao benefício.
Por um lado assassinam, por outro asfixiam a ação sindical.
Os grupos paramilitares foram criados para exterminar a todos os que se opõem ao governo e hoje estão confessando os seus crimes. Por isso Uribe os mandou para os EUA, onde são julgados por tráfico de drogas e não pelos assassinatos de opositores. Assim, enquanto na Colômbia seriam sentenciados há 20 ou 30 anos pela morte de dirigentes sindicais, foram mandados para os EUA, onde além de não repercutirem as denúncias pelos crimes que cometeram, tem diminuída a pena para oito a dez anos, pois respondem somente pelo tráfico. Ou seja, sai mais barato para os paramilitares e para o governo, que por isso enviou para lá.
Enquanto isso, os assassinatos continuam?
Infelizmente, sim. O último dirigente assassinado foi o companheiro Guillermo Rivera, um servidor público nacional. Ele desapareceu em Bogotá e há o registro de câmaras de tevê do envolvimento de uma rádio patrulha da Polícia. Rivera foi torturado durante horas antes de morrer. Casos como esse continuam ocorrendo, estimulados pela impunidade que alcança 99% dos casos na Colômbia. Uma parcela de responsabilidade por esta situação é dos meios de comunicação que, controlados pelo governo, desinformam sobre as torturas e assassinatos, escondem o que ocorre.
Diante deste quadro perverso, que papel joga a solidariedade internacional?
O fundamental é ampliar a pressão pelo respeito à democracia, pelo direito não só às liberdades sindicais como à própria vida, garantir este direito elementar às lideranças. Do ponto de vista do sindicalismo brasileiro, cobrar das multinacionais do Brasil e do resto do mundo que revejam suas práticas, pois são intocáveis em nosso país. No campo internacional, junto com a CSI e a CSA, precisamos garantir instrumentos de sanção, como os aplicados contra os nazistas, pois é uma ação de Estado que viola direitos elementares.