Pesquisa inédita da Universidade de Brasília (UnB) revela que, entre 1996 e 2005, 181 bancários cometeram suicídio. Uma média de um suicídio a cada 20 dias, segundo informações reunidas pelo Ministério da Saúde.
“Eu quis verificar se um fator social – as pressões no ambiente de trabalho – poderia contribuir para desencadear transtornos mentais de tal gravidade que as pessoas perdiam a vontade de viver”, explica Marcelo Finazzi, mestre em Administração pela UnB e autor da dissertação Patologia da Solidão: o suicídio de bancários no contexto da nova organização do trabalho.
Dados obtidos junto a um grande banco mostraram que, entre 1995 e 2008, 32% dos afastamentos de bancários decorreram de doenças do tecido músculo esquelético, como as Ler/Dorts, transtornos diretamente correlacionados com problemas da organização do trabalho. Outros 23% apresentaram transtornos mentais.
Outro estudo, encomendado por entidades de classe dos bancários em 2006, demonstrou que aproximadamente 18 mil profissionais do país sofriam, à época, ideação suicida (vontade de tirar a própria vida).
Marcelo associa a taxa de suicídios e doenças do trabalho às transformações ocorridas no mercado financeiro a partir da década de 1990. No período, 430 mil bancários foram demitidos no Brasil. Se antes os bancos tinham lucros com a inflação, após 1995 o papel do bancário mudou. “Ele passa a ser vendedor e consultor. As cobranças se acentuaram”, afirma. O vínculo estabelecido entre as empresas e o trabalhador muda bruscamente e passa a ser o de submissão.
ASSÉDIO MORAL
“As pessoas que antes faziam carreira nos bancos e se aposentavam nas empresas se deparam com um contexto em que seus empregos não estão mais garantidos”, declara o pesquisador. O custo para o trabalhador foi muito alto. Ele foi convidado a ser dono da própria carreira, em nome do lucro. Além de pressão por causa das demissões, começaram as violências, como as múltiplas formas de assédio moral.
Marcelo entrevistou ainda quatro bancários que estavam afastados do trabalho por conta de sérios transtornos mentais e a família de uma pessoa que se suicidou por razões profissionais. As perguntas tratavam de vivências positivas e negativas no trabalho. “Não queria tocar de imediato no suicídio, porque poderia induzi-los, mas eles estavam cientes das perguntas sobre temas difíceis. Consegui a confissão espontânea dos entrevistados”, reforça.
Os entrevistados e a família do suicida manifestaram, por conta própria, a correlação entre as violências vivenciadas no trabalho e a vontade de morrer. Segundo Marcelo, o suicídio é um assunto demasiadamente complexo para se fazer simples conexões lineares. “O trabalho apareceu como fator importante, mas não podemos descartar outros fatores, como questões genéticas, familiares, econômicas e sociais”, disse.
Para o autor, o estudo indica a necessidade de humanização das relações de trabalho nas empresas. “Falta o cumprimento da legislação trabalhista, metas de produção condizentes com a capacidade física e psicológica dos funcionários, assim como o treinamento dos gestores para lidar com os conflitos. O suicídio tem sido o desfecho trágico de muitos trabalhadores que sucumbem às violências do trabalho”, conclui.
Marcelo Finazzi é graduado e mestre em Administração na UnB.
Contato pelo email: [email protected]