A deputada federal Maria do Rosário (PT-RS), ex-ministra dos Direitos Humanos, acredita que a ameaça de estupro que recebeu em dezembro do ano passado do também deputado Jair Bolsonaro (PP-RJ) é mais uma situação de violência e opressão que as mulheres ainda enfrentam cotidianamente. Na ocasião, o deputado afirmou, em discurso no plenário da Câmara, que não a estupraria “porque ela não merece”.
“É uma ameaça que cotidianamente as mulheres vivem, mas que fica invisível. Ocorre dentro de casa, no trabalho, e muitas vezes em condições hierárquicas diferentes, pelo histórico que leva as mulheres a ocuparem mais os cargos menos remunerados”, afirma a deputada.
Uma semana após receber a ameaça, ela protocolou uma queixa-crime no Supremo Tribunal Federal (STF) por danos morais e calúnia contra Bolsonaro, conhecido por suas posições contrárias aos direitos humanos. No mesmo dia, o Ministério Público Federal denunciou Bolsonaro por incitação pública ao crime de estupro.
“Vou até o fim nesse processo e acredito na Justiça, não só por mim, mas por todas as mulheres que passam por situações de violência, para que elas percebam que é possível ter força e reagir. Não é me dado o direito de desistir disso”, afirmou Rosário. “A violência contra a mulher é cometida também nas distorções do exercício do poder, no ambiente familiar, no trabalho e na sociedade como um todo, continuou.
A deputada considerou “um avanço importante” a aprovação na última terça-feira (3) da lei que passou a considerar o feminicídio um crime hediondo. “Acredito que será uma complementação da Lei Maria da Penha, porque a violência contra a mulher cresce de tal modo que chega ao assassinato. São demonstrações de crueldade pela condição dela de mulher.”
O projeto aprovado e sancionado nesta segunda-feira (9) pela presidenta Dilma, classifica o feminicídio como crime hediondo e o inclui como homicídio qualificado, alterando o Código Penal. A proposta aprovada estabelece que existem razões de gênero quando o crime envolver violência doméstica e familiar, ou menosprezo e discriminação contra a condição de mulher.
O projeto, elaborado pela Comissão Parlamentar Mista de Inquérito (CPMI) da Violência contra a Mulher, prevê aumento da pena em um terço se o crime acontecer durante a gestação ou nos três meses posteriores ao parto; se for contra adolescente menor de 14 anos ou adulto acima de 60 anos ou ainda pessoa com deficiência. Também se o assassinato for cometido na presença de descendente ou ascendente da vítima.
Minoritárias
Para Maria do Rosário, falta ainda avançar no aumento da representatividade das mulheres na Câmara e no Senado. A Proposta de Emenda à Constituição (PEC 352/13) para a reforma política defendida pelo presidente da Câmara, deputado Eduardo Cunha (PMDB-RJ), que será analisada por uma comissão especial, vai na contramão do projeto apresentado pela Ordem dos Advogados do Brasil (OAB) e pela Conferência Nacional dos Bispos do Brasil (CNBB), que é defendida pelo governo, e que prevê mecanismos claros para aumentar a participação feminina no Legislativo, entendendo que esta sub-representação prejudica a democracia.
Segundo o Tribunal Superior Eleitoral (TSE), as mulheres representam 51,3% do eleitorado. Todavia entre os 513 deputados federais somente 46 são mulheres (8,96%) e entre os 81 senadores, 8 são mulheres (9,81%).
A proposta de Cunha se centra em medidas entendidas como um retrocesso, entre elas o fim da reeleição para presidente, governadores e prefeitos, a extinção do voto obrigatório, que passa a ser facultativo e a adoção de um sistema misto (privado e público) para o financiamento de campanhas. O texto não propõe medidas para aumentar o número de mulheres deputada s e senadoras.
“Garantir a equidade de gênero no Legislativo é um passo importante inclusive para combater a violência contra a mulher. Para isso, seria extremamente importante garantir o fim do financiamento privado de campanha, pois como as mulheres ainda participam pouco do poder econômico, acabam tendo menos recursos para campanhas e não conseguem se eleger, independentemente das propostas. Equilibrar os recursos da campanha seria um primeiro passo, porque mesmo assim enfrentaríamos uma barreira cultural”, conclui.