KRISHNA GUHA
MICHAEL MACKENZIE
GILLIAN TETT
DO “FINANCIAL TIMES”
O pânico nos mercados de crédito atingiu intensidade histórica, ontem, provocando uma fuga rumo à segurança de intensidade não vista desde a Segunda Guerra (1939-45).
Os barômetros de problemas financeiros atingiram picos históricos em todo o mundo. O rendimento dos títulos de curto prazo do Tesouro americano atingiu sua marca mais baixa desde os ataques aéreos alemães contra Londres. Os empréstimos interbancários estão literalmente paralisados, e os investidores estão correndo para retirar seus fundos de qualquer instituição ou setor cujo futuro tenha sido colocado em dúvida.
O empréstimo de emergência de US$ 85 bilhões que o Federal Reserve (Fed, o BC dos EUA) fez à gigante dos seguros AIG, anunciado na noite de terça-feira, não bastou para conter a disparada na aversão a riscos. Em lugar disso, os mercados foram atingidos por nova onda de ansiedade.
Uma das causas de medo emergiu quando as cotas em um fundo mútuo de mercado monetário supostamente seguro caíram abaixo de seu valor de face -um fenômeno conhecido como “breaking the buck”- devido a prejuízos relacionados a dívidas do Lehman Brothers. Isso agravou o risco de que os investidores de varejo em outros fundos como esse entrem em pânico e retirem seu dinheiro.
A busca por lucro foi abandonada enquanto os operadores corriam para a segurança dos títulos de curto prazo do Tesouro, e o rendimento da nota de três meses caiu a apenas 0,03% -semelhante aos níveis que caracterizaram a “década perdida” do Japão. A última ocasião em que o rendimento esteve tão baixo foi em janeiro de 1941.
As ações dos dois últimos bancos de investimento de grande porte que mantiveram a independência nos Estados Unidos, o Morgan Stanley e o Goldman Sachs, despencaram devido à elevação do custo de garantia de suas dívidas, o que coloca em risco a capacidade de ambos para se financiarem com recursos de mercado.
As repercussões se fizeram sentir bem além dos Estados Unidos. Houve transações turbulentas de papéis da HBOS, uma grande companhia britânica de crédito hipotecário, que foi forçada -sob pressão do governo britânico- a iniciar negociações de fusão com o banco de varejo Lloyds TBS, depois de registrar quedas drásticas nos preços de suas ações.
Os empréstimos interbancários na Europa e nos Estados Unidos estão para todos os efeitos suspensos. O chamado “spread Ted” -a diferença entre a taxa Libor de três meses e o rendimento dos títulos de Tesouro americano do mesmo prazo, que serve para medir os temores do mercado quanto aos bancos- subiu a mais de 3%, o que supera seu fechamento recorde depois do crash dos mercados de ações conhecido como “segunda-feira negra”, em 1987.
As autoridades americanas reagiram, e o Departamento do Tesouro anunciou que tomaria dinheiro para fornecer recursos ao Fed, que poderia usá-los em suas operações de empréstimos de emergência -na prática, isso equivale a remover quaisquer restrições contábeis aos gastos em socorro.
A Securities and Exchange Commission (SEC, órgão que fiscaliza e regulamenta o mercado de valores mobiliários) anunciou novas restrições, classificadas pelos operadores como draconianas, para operações de venda a descoberto. Os adeptos da prática, que lucram quando os preços das ações caem, vêm sendo culpados pelos problemas da AIG. Mas essas medidas não bastaram para evitar pesadas vendas, especialmente de ações de companhias financeiras dos EUA, que caíram na média 9,4%.
A instabilidade é a mais alta registrada desde março nos mercados de ações. O dólar caiu ligeiramente, e o iene japonês se recuperou, à medida que arriscadas transações de financiamento cambial eram liquidadas. O ouro subiu 9%. Um índice que acompanha o custo de garantias de crédito para os grandes operadoras no mercado de derivativos de crédito sublinhava os sentimentos negativos com relação aos bancos. O índice de risco de contraparte em transações de CDR subiu acima dos 400 pontos básicos, ante 180 na semana passada. As ações dos mercados emergentes caíram em mais de 7%, de acordo com o índice MSCI, bem mais do que as ações européias e americanas.
Andrew Brenner, co-diretor de produtos estruturados e mercados emergentes na MF Global, disse que “parece que ninguém deseja aceitar o crédito de ninguém mais… É como se estivéssemos num precipício”.
Muitos analistas criticaram severamente as autoridades por sua ação arbitrária quanto a operações de resgate financeiro, a AIG foi salva, o Lehman Brothers, não, o que torna impossível aos investidores prever o que vai acontecer, o que solapa ainda mais a confiança.