Representantes de entidades defensoras da inclusão de negros no mercado de trabalho cobraram da Federação Brasileira de Bancos (Febraban) mais oportunidade para os afrodescendentes no sistema financeiro nacional. Em audiência pública da Subcomissão Permanente em Defesa do Emprego e da Previdência Social do Senado, na manhã de segunda-feira (19), os participantes reclamaram da falta de oportunidade e da pouca presença dos negros atuando nas instituições bancárias brasileiras.
A situação já foi pior, mas ainda precisa melhorar, segundo frei David Santos, diretor-executivo da Educafro, ONG que atua na área da educação:
– Os bancos só acordaram para o problema a partir de 2003, quando houve uma ocupação de movimentos negros de uma agência do Itaú. A partir de então, a instituição que tinha pouco mais de 170 funcionários negros passou para mais de 2.700 – afirmou.
De acordo com frei David, atualmente, no Brasil, 81% dos bancários são brancos. Além de serem minoria nas agências, os negros ainda têm dificuldade de obter promoção: apenas 20% conseguem ascensão na carreira. Os dados são do Mapa da Diversidade no Setor Bancário, elaborado pela Febraban, que aponta ainda defasagem salarial: funcionários negros recebem em média 64,2% do salário dos brancos.
O procurador-geral do Trabalho, Luís Antônio Camargo de Melo, lembrou que a Procuradoria chegou a entrar com ações civis públicas contra os bancos, mostrando a discriminação existente no setor, mas lamentou a falta de sensibilidade do Judiciário, já que todas foram julgadas improcedentes.
– Apesar disso, a iniciativa foi válida, pois mostramos situação violadora dos direitos humanos existente na área financeira – acrescentou.
Diante das críticas, a Febraban comunicou ao presidente da audiência, senador Paulo Paim (PT-RS), que aceitaria o diálogo com representantes dos movimentos negros. O encontro já foi marcado para esta terça-feira (20), fato comemorado pelo público presente.
Qualificação profissional
Os convidados defenderam a reservas de vagas para os negros. Entretanto, a procuradora do Trabalho, Andrea Nice Lima Lopes, alertou para o fato de não ser possível falar em política de cotas sem tratar da educação e da qualificação profissional. Ela citou o que ocorre em concursos públicos, nos quais as vagas reservadas a portadores de deficiência nem sempre são preenchidas.
– As empresas não são obrigadas a fazer favor. Seja qual for o sistema de cota, para negros ou deficientes, elas precisam de gente competente e que produza – afirmou.
Outro fato comemorado pelo público presente à audiência foi o anúncio do defensor público-geral do Rio de Janeiro, Nilson Bruno Filho, de que o próximo concurso público da Defensoria do Estado, previsto para 2012, terá 20% das vagas reservadas para negros.
Segundo, Nilson, a Defensoria fluminense é a maior do país, com 800 defensores, entretanto, apenas 12 são negros.
– Ainda para 2011, pretendo fazer a mesma coisa com a cota de estagiários. Para os brasileiros, é normal ver negros e pardos em profissões mais simples, mas não é normal vê-los em uma universidade – lamentou, após fazer um relato emocionado de sua história de vida.
Ao defender o sistema de cotas, Nilson Filho – que também é negro – disse que essa medida “não é uma facilitação, mas uma forma de oferecer acesso aos que não tiveram as mesmas oportunidades na vida”.
Analfabetismo
O senador Cristovam Buarque (PDT-DF) também defendeu o sistema de cotas raciais, mas fez uma ressalva: a luta dos movimentos precisa ser mais ampla, incluindo, por exemplo, a erradicação do analfabetismo.
– A cota para universidades, por exemplo, só é válida para os que concluíram o ensino médio. Mas e aqueles que foram abrigados a abandonar a escola ou sequer sabem ler ou escrever? Estes sequer terão a chance de qualquer sistema de cota – disse.