MPF-SP oferece primeira denúncia de insider trading no Brasil

O Ministério Público Federal pediu a abertura de ação penal contra dois ex-executivos da Sadia e um ex-executivo do banco ABN-Amro que lucraram na Bolsa de Valores de Nova York mediante o uso de informações privilegiadas (insider trading) obtidas em São Paulo relativas à oferta da Sadia pelo controle acionário da concorrente Perdigão, em julho de 2006.

Apesar de o crime de insider trading ter sido introduzido na legislação brasileira em 2001, mediante alterações na redação da lei 6.385/1976, esta é a primeira denúncia oferecida no país, visando a condenação de executivos por essa fraude no mercado de capitais. O caso em questão já teve punição administrativa, em 2007, no âmbito da Securities and Exchange Comission (SEC), órgão que exerce nos Estados Unidos o mesmo papel da Comissão de Valores Mobiliários (CVM).

Foram denunciados pelo procurador da República Rodrigo de Grandis o ex-diretor de Finanças e Relações com Investidores da Sadia, Luiz Gonzaga Murat Júnior, o ex-membro do Conselho de Administração da Sadia, Romano Ancelmo Fontana Filho, e o ex-superintendente executivo de empréstimos estruturados do ABN-Amro, Alexandre Ponzio de Azevedo. Todos foram demitidos de seus cargos em virtude do caso.

A oferta da Sadia pela Perdigão ocorreu em 16 de julho de 2006 e o edital foi publicado no dia seguinte. Murat, Azevedo e Fontana Filho participaram das discussões e tratativas visando a elaboração da oferta ao mercado e obtiveram informações privilegiadas.

No dia 7 de abril de 2006, quando a proposta foi aprovada pelo conselho da Sadia, Murat fez a primeira compra de ações da Perdigão na bolsa de Nova York, comprando 15.300 ADR´s (american depositary receipts), a US$ 23,07 cada. Em junho, sabedor da proximidade do anúncio do negócio, o executivo comprou mais 30.600 ADR´s, elevando sua carteira para 45.900 ações, a US$ 19,17 cada papel. Cada compra ocorreu mediante informações privilegiadas que obteve sobre os andamentos da oferta da Sadia pela Perdigão, incorrendo duas vezes no crime de insider trading.

Em 21 de julho, assim que soube que a Perdigão havia recusado a proposta da Sadia, e sabedor que os papéis não mais se valorizariam, Murat vendeu 15.300 ações, a US$ 23 cada uma, lucrando US$ 58.500 com a operação.

Fontana Filho incorreu quatro vezes no crime de insider trading, pois efetuou quatro operações de compra e venda mediante informações privilegiadas. O executivo comprou três lotes da Perdigão, totalizando 18000 ações, na Bolsa de Nova York, por US$ 344.100, entre 5 e 12 de julho, poucos dias antes do anúncio da oferta. Ele vendeu todas as ações em 21 de julho de 2006, mesmo dia da recusa da Perdigão, por US$ 483.215,40, lucrando US$ 139.114,50.

Azevedo, assim que soube que a matriz do ABN-Amro, na Holanda, avalizaria a oferta da Sadia pela Perdigão, adquiriu 14.000 ações da Perdigão na bolsa de Nova York em 20 de junho de 2006, por US$ 269.919,95 (US$ 19,27, cada). Em 17 de julho de 2006, dia da publicação do edital da oferta, o executivo do banco vendeu 10.500 ações por US$ 254.046,90, lucrando US$ 51.606,00.

Se condenados, os executivos estão sujeitos a penas de um a cinco anos de reclusão, e multa de até três vezes o valor da vantagem ilícita obtida em decorrência do crime. Nos EUA, Murat e Azevedo fizeram um acordo com a SEC para não serem processados criminalmente e receberam sanção administrativa em fevereiro de 2007, estão proibidos de atuar no mercado financeiro por três anos e receberam multas de US$ 364.432,12 e US$ 135.380,45, respectivamente.

“A denúncia oferecida é fruto da cooperação entre o MPF-SP e a CVM”, informou o procurador Rodrigo de Grandis. Ao encaminhar a acusação, o procurador pediu que a Justiça Federal notifique a Comissão para que ela avalie se deseja participar do processo como assistente de acusação.

No Brasil, a CVM concluiu os processos administrativos contra os três acusados pelo MPF. Murat e Fontana Filho, em fevereiro de 2008, receberam sanção da CVM e estão proibidos de exercer cargos de administrador ou conselheiro fiscal de companhia aberta por cinco anos. Cabe recurso ao Conselho de Recursos do Sistema Financeiro Nacional. O processo de Azevedo foi concluído em março de 2008. Ele apresentou proposta de pagamento de R$ 238 mil ao órgão e o processo administrativo contra ele foi arquivado.

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