Apesar de todas as evidências, o Carrefour ainda não admite o crime de discriminação racial praticado contra o vigilante Januário Alves de Santana.
Em reunião na sede nacional da rede de hipermercados, na tarde desta sexta-feira (11), o diretor executivo da empresa, Armando Almeida, afirmou que somente após as investigações comprovarem a ação racista, haverá uma retratação pública.
“Não sei se por uma questão de proteção, mas o caso chegou para nós com uma distância de 10 dias do ocorrido. Trata-se de uma confusão que até agora não está clara”, comentou.
O encontro contou com representantes da direção do Carrefour e dos movimentos sociais para discutir a violência da qual Santana foi vítima. No dia 7 de agosto, ele foi agredido por cinco seguranças no estacionamento da loja de Osasco, após ser ‘confundido’ com um ladrão. O vigilante cometeu dois crimes graves: ser negro e possuir um carro esportivo.
O fato ocorreu enquanto aguardava a família voltar das compras dentro de um veículo EcoSport. Após ser ‘identificado’ e levado para uma sala da unidade, foi espancado com socos, chutes, cabeçadas e coronhadas.
A tortura continuou com os policiais militares acionados para atender a ocorrência “Você tem cara de que tem pelo menos três passagens. Pode falar. Não nega. Confessa, que não tem problema”, ouviu dos agentes do Estado.
Discriminação e políticas afirmativas
O diretor destacou que a empresa prestadora de serviços de segurança e a gerência da loja foram afastadas e que dentro da “filosofia do Carrefour, não há espaço para diferenças étnicas e políticas”.
Secretária de Combate à Discriminação Racial da CUT/SP, Rosana Silva, ressaltou que apesar da segurança ser terceirizada, o atendimento ao cliente é de responsabilidade do Carrefour e cobrou também a presença de negros nas peças de divulgação da rede de hipermercados. “É importante que tenhamos gerentes e clientes negros nos comerciais para mostrar a igualdade de tratamento que vocês dizem oferecer.”
Almeida afirmou também que na empresa as pessoas são promovidas única e exclusivamente por seus méritos. “Não somos filantrópicos, somos mercantis, mas empregamos pessoas, remuneramos, oferecemos oportunidade de carreira e pagamos impostos”.
Representante do Círculo Palmarino do Instituto de Estudos Afro-Brasileiro Manuel Querino, Joselicio Junior, lembrou que “ao mesmo tempo em que oferece emprego, o Carrefour também lucra com os esforços dos trabalhadores brasileiros”.
Para ele, é preciso que a empresa assuma publicamente o erro. “Mesmo que digam que foi o funcionário de determinada loja quem praticou a agressão, era o emblema de vocês que estava ao fundo”.
Grupo de trabalho e próximos passos
Armando Almeida se comprometeu a criar uma comissão com participação dos representantes dos movimentos sociais para reformular o processo de treinamento dos funcionários e implementar políticas afirmativas.
O diretor disse ainda que irá investigar a existência de ‘salinhas de tortura’ na rede de hipermercados como aquela para a qual Januário Santana foi levado.
Uma nova reunião entre a direção do Carrefour e os movimentos sociais acontece no dia 22 de setembro.
Uma coisa é certa: a mobilização continua: “não iremos parar. Ingressaremos com uma ação no Ministério Público, enviaremos as denúncias a entidades parceiras na França e solicitaremos audiências públicas nas câmaras municipais de São Paulo e Osasco”, comentou Julião Vieira, diretor da Unegro (União de Negros pela Igualdade).