Modelo sob égide do capital viola direitos humanos e precariza trabalho

Conferência no Fórum Mundial de Direitos Humanos, em Brasília

O Fórum Mundial de Direitos Humanos reservou na manhã desta quinta-feira (12) um espaço para o debate sobre os reflexos da crise econômica do modelo hegemônico sobre o mundo do trabalho e na precarização das relações humanas.

A convergência de ideias nas apresentações feitas pelos painelistas remonta a um cenário mundial diferente daquele vivenciado no século passado, quando o capitalismo industrial ditava às regras. Hoje, a égide do capitalismo encontra-se nas mãos do poder financeiro, das multinacionais e bancos.

Na opinião de João Pedro Stédile, integrante da coordenação nacional
do MST (Movimento dos Trabalhadores Rurais Sem Terra) e da Via Campesina, a nova dinâmica do capital já está enraizada na agricultura. “Não é mais o latifundiário atrasado. Hoje, em todo o mundo, a classe dominante no campo é mais complexa e poderosa, uma aliança entre bancos, multinacionais, fazendeiros e mídia burguesa que divulga e reproduz o modelo de dominação como se fosse o único, o melhor e legítimo”, disse.

Stédille recordou que no século passado o maior problema no campo era o acesso a terra para a reprodução social, o direito ao trabalho e a alimentação. “E para defender seus privilégios os fazendeiros passaram a utilizar a violência como principal forma de combate à luta dos camponeses, com torturas, prisões, assassinatos e, muitas vezes, massacres. Os trabalhadores são agredidos coletivamente por uma só classe dominante muito mais poderosa”, afirmou Stédille, relatando que a disputa de classe é permanente quando existem interesses tão antagônicos.

Entre 1984 a 2002 foram assassinadas 1.670 lideranças camponesas no Brasil. Pistoleiros, jagunços ou policiais militares que praticaram tais crimes assim como seus mandantes (fazendeiros) seguem protegidos pelo estado discricionário. Do total, só 80 casos resultaram em processo judicial e, destes, apenas 13 houve condenação.

O padrão de consumo e produção imposto pelo modelo hegemônico também foi destacado pelo dirigente do MST. Diariamente, um bilhão de pessoas passa fome no mundo e cerca de 60 milhões de crianças morrem pelo mesmo motivo, o que Stédille classificou como assassinato coletivo.

“Nosso problema não é de produção, mas sobre o direito a alimentação para todo povo. No Brasil, 300 milhões de hectares são destinados a pastagem. A exportação de gado bovino para a Europa, Estados Unidos e Japão rende ao país 8 bilhões de dólares, o que é divulgado pela Globo, pela Friboi, como grande sucesso. Se pegarmos esses mesmos hectares e distribuirmos para a agricultura o Brasil quintuplicaria sua produção. Portanto, é preciso uma mudança deste modelo que prioriza o agronegócio e a monocultura e criarmos outro paradigma na agricultura pensando na soberania alimentar da população”, ressaltou.

De acordo com Leonardo Sakamoto, jornalista e membro da Ong Repórter Brasil, a sociedade foi moldada de maneira que as pessoas acreditassem como verdade absoluta que só o trabalho libertaria o indivíduo. “E o trabalho infantil é visto como uma condição natural do desenvolvimento individualista. Nosso desafio é criar condições para que estas crianças tenham acesso à educação, possam estudar, brincar até o momento em que estejam preparadas e sejam demandas pela sociedade”, completou.

Apesar dos avanços no combate ao trabalho infantil, Sakamoto avalia que o País não tem evoluído na velocidade necessária para garantir o fim dessa condição degradante, o combate a impunidade e a ganância do empresariado.

Para ele, “erradicar as piores formas de violação dos direitos humanos, como o próprio trabalho infantil, o trabalho escravo, requer uma mudança estrutural do modelo hegemônico”.

Expedito Solaney, secretário de Políticas Sociais da CUT, que coordenou a mesa de debate, afirmou que “os direitos Humanos são indivisíveis e que tratar deste tema no Fórum Mundial sobre a ótica do mundo do trabalho para nós sindicalistas é muito operante, pois queremos ir além de caracterizar a violação de direitos humanos restrita ao trabalho infantil e escravo, mas todas as violações das normas e convenções dos organismos internacionais como a OIT, do direito a livre organização sindical e de greve, de igualdade salarial, o trabalho com todas as condições.”

Movimento sindical sob ataque do neoliberalismo

A hegemonia do pensamento neoliberal no Brasil e no mundo nos últimos 30 anos resultou em sucessivos ataques ao movimento sindical e, consequentemente, na perda de direitos.

E este cenário reflete taxa de sindicalização mundial: 10%, ou seja, de cada 10 trabalhadores no mundo apenas um possui representação sindical.

Jana Silverman, diretora de projetos no Brasil da AFL-CIO Solidarity Center, falou em sua apresentação sobre as sucessivas violações de direitos humanos ocorridas especificamente na Colômbia. Segundo a OIT (Organização Internacional do Trabalho), “o país é o mais perigoso do mundo para o/a sindicalista”. Cerca de três mil dirigentes sindicais e ativistas foram assassinados desde 1984, principalmente em ações patrocinadas por paramilitares.

“Há uma manipulação das informações para elencar esses assassinatos como consequência da guerra civil que assola o País há 40 anos. Mas as estatísticas mostram que as ameaças, torturas e assassinatos ocorreram principalmente quando os sindicatos estavam em processo de negociação coletiva, greve, mobilizações, com o claro objetivo de limitar a ação sindical e a criação de novos sindicatos”, disse.

Ela acredita que, apesar do País apresentar uma baixa taxa de sindicalização (5%), há um ressurgimento do sindicalismo, com greves em setores não tradicionais como o rural e o bloqueio de estradas, o fortalecimento do sistema de inspeção do trabalho, o plano de reparação integral para vítimas de violência antissindical e medidas pela sua não repetição.

A mesa também contou com a participação de Ruth Coelho, dirigente da Força Sindical.

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