Valor Econômico
Sergio Lamucci, de São Paulo
O mercado de trabalho teve um primeiro trimestre extremamente positivo, com forte criação de empregos e avanço da renda. A taxa de desemprego nas seis principais regiões metropolitanas encerrou março em 7,6%, um pouco acima dos 7,4% de fevereiro, mas muito abaixo dos 9% do mesmo mês do ano passado.
Na série livre de influências sazonais, a taxa ficou em 7%, a menor da série histórica iniciada em 2001, segundo cálculos da Rosenberg & Associados. Para alguns analistas, o mercado de trabalho já se encontra numa situação de pleno emprego, com um nível de desemprego que acelera a inflação – uma tese controvertida.
O aumento da ocupação foi um dos grandes destaques do mês passado, como destaca a economista-chefe da Rosenberg, Thaís Marzola Zara. É uma tendência que ganha força a cada mês. Em março, a população ocupada aumentou 3,8% em relação ao mesmo mês de 2009, um ritmo superior aos já elevados 3,5% de fevereiro. Em novembro do ano passado, a alta tinha sido de 0,7% nessa base de comparação.
Segundo Thaís, a demanda robusta tem dado confiança às empresas, que contratam mais para atender a um consumo que se afigura como expressivo nos próximos meses. “As perspectivas são de que o mercado de trabalho continue aquecido, com a falta de mão de obra qualificada e especializada começando a aparecer em alguns segmentos”, afirma.
O caso mais evidente é o da construção civil. Em março, a renda média no setor cresceu 11,1% em relação a março de 2009, já descontada a inflação, enquanto o rendimento médio de todos os setores subiu 1,5%. O estoque de ocupados na construção também cresceu com força: 10,6%. Segundo a LCA Consultores, a construção ajudou no aumento geral da ocupação pela intensidade da alta.
O setor de serviços, com alta em março de 4% na população ocupada, foi importante não apenas pela variação expressiva, como também por seu peso, já que se trata do segmento que mais emprega, diz a LCA.
O economista José Márcio Camargo, da Opus Gestão de Recursos, acredita que a taxa média de desemprego pode encerrar o ano abaixo de 7%, num cenário de forte crescimento da atividade econômica. Se confirmada, será com folga a menor taxa média de desocupação da série iniciada em 2001, que tem como ponto mais baixo os 7,9% de 2008. “O desemprego é sazonalmente mais alto no começo do ano. Depois de abril ou maio, ele tende a cair mais”, afirma ele, que projeta um crescimento do Produto Interno Bruto (PIB) de 7% em 2010.
A LCA Consultores reduziu a sua projeção para a taxa média de desemprego em 2010, mas ela continua bem acima de 7% – a revisão foi de 7,6% para 7,5%. A estimativa é mais cautelosa que a de Camargo, porque a consultoria acredita que um número mais expressivo de pessoas passe a procurar emprego nos próximos meses por conta da economia aquecida, levando à diminuição do fenômeno conhecido como desalento. Com alta da população economicamente ativa (PEA), isso pode dificultar novas reduções significativas da taxa de desemprego na série com ajuste sazonal, considera a LCA.
Camargo acredita que o desemprego no Brasil já atinge níveis que causam a aceleração da taxa de inflação. Também professor da PUC-Rio, diz que estudos feitos por ele em 2008 apontam que uma taxa de desocupação de 7,5% a 8% tende a provocar pressões inflacionárias, ao levar os salários a crescer acima da produtividade. “Acho que de lá para cá a situação não mudou”, acredita Camargo, para quem o aquecimento do mercado de trabalho foi um dos vários fatores que fizeram o Banco Central aumentar os juros na reunião do Comitê de Política Monetária (Copom) de quarta-feira. Em março, a massa salarial cresceu 5,2% sobre março de 2009, em termos reais.
O diretor-adjunto do Centro de Estudos Sindicais e da Economia do Trabalho (Cesit) da Unicamp, Anselmo Luiz dos Santos, tem uma visão diferente. Ele vê uma redução importante da desocupação nos últimos anos, em função do crescimento mais forte a partir de 2004, mas considera que o país ainda está longe de uma situação de pleno emprego.
Ele lembra que a metodologia da Pesquisa Mensal de Emprego (PME) do IBGE mede apenas o chamado desemprego aberto, que classifica como desocupado quem procurou trabalho nos 30 dias anteriores. Quem não procurou emprego ou fez algum bico no período não entra na estatística dos desempregados da pesquisa do IBGE.
Na pesquisa divulgada pela Fundação Seade/Dieese, que inclui também a desocupação oculta por desalento (quem não foi atrás de emprego nos últimos 30 dias) e o desemprego oculto por trabalho precário (quem faz bico, por exemplo), a taxa é bem mais alta – 13,7% no mês passado, a menor para um mês de março desde 1998.
“No Brasil, ainda há muita gente que vive de bicos ou tem trabalhos precários, que caracterizam na verdade estratégias de sobrevivência”, diz Santos. Para ele, se a economia continuar a crescer na casa de 5%, é possível que o país fique mais próximo de uma situação de pleno emprego, mas isso só tende a ocorrer num prazo superior a cinco anos.