Luis Nassif: A mídia internacional de olho no mercado brasileiro

Nas últimas décadas Mario Vargas Llosa transformou-se em um dos ícones da modernização liberal na América Latina. Como colunista do diário espanhol El País, tornou-se uma espécie de paradigma para outros colunistas da imprensa latino-americana – e, particularmente, a brasileira.

Cada qual tentou emular o personagem Llosa em seu colunismo.

Para quem não o conhece como colunista, Llosa é uma espécie de Arnaldo Jabor mais sofisticado, com críticas severas a hábitos populistas latino-americanos, mas sem o histrionismo e a paranoia do nosso Jabor – que considera que o fim do comunismo disseminou células cancerígenas por todo o Ocidente cristão.

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Em sua última contribuição ao El Pais, Llosa mira como um dos pontos centrais do atraso latino-americano os oligopólios de mídia, sustentados por pactos com sucessivos governos que se consumaram em legislações anacrônicas.

E aí, cria um paradoxo curioso com o padrão de cobertura da velha mídia do eixo Rio-São Paulo.

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O setor de mídia é o último reduto da reserva de mercado no país. Só se aceita participação de até 30% de grupos estrangeiros no capital de empresas nacionais. Na parte televisiva e radiofônica, os grupos são defendidos pelo sistema de concessão do espaço público, com tal liberdade de uso que lhes é permitido até alugar horário para terceiros.

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Esse sistema criou diversos anacronismos e distorções.

O mais grave deles foi o da sub-representação política e regional. A enorme concentração de poder político e econômico no eixo Rio-São Paulo – no período pós-redemocratização – deveu-se fundamentalmente à influência dos seus grupos de mídia.

Não apenas outras regiões viram-se sub-representadas, mas também vastos setores da economia e da sociedade. O enorme atraso do país, no combate à miséria, deveu-se em grande parte à postura dos grupos de mídia, avessos a qualquer política social pública.

Gastos ínfimos do Bolsa Família, em relação ao dispendido com pagamento de juros, foram tratados como ameaça à estabilidade fiscal.

Aliás, a retórica do fim do mundo sempre foi utilizada abundantemente para bloquear qualquer forma de gasto público que não contemplasse setores ideologicamente afinados com os grupos de mídia – como o mercado financeiro.

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No último mês, El País lançou sua edição brasileira – apenas na Internet. Alguns anos atrás o grupo português Ongoing entrou no mercado de mídia – mas graças ao fato de uma das herdeiras ter nacionalidade brasileira.

Nos últimos anos, coube a grupos estrangeiros a cobertura jornalística mais isenta sobre o Brasil. Empresas como a britânica BBC, a agência Reuters, diários internacionais, como El Pais e Financial Times, independentemente de sua orientação ideológica, foram os que respeitaram mais os fatos.

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Nos próximos meses, além de acossadas pelas redes sociais e pelo novo jornalismo online, os grandes grupos de mídia terão que gastar energia para defender seu mercado da mídia regional e dos grupos internacionais.

E terão que se conformar, quando forem colocados ao lado de outros símbolos do atraso latino-americano – que, nas últimas décadas, transformaram-se em seu prato predileto, para colocarem-se como defensores da modernização ocidental contra o atraso do continente.

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