DCI
Pedro Garcia
A taxa de juros média do rotativo do cartão, linha de crédito aberta automaticamente pelo banco quando o cliente não liquida a fatura de uma compra parcelada, registrou uma alta de 24,5 pontos percentuais em janeiro e iniciou 2015 em 334% ao ano.
O Banco Central divulgou o valor médio da taxa em seção inédita do seu boletim de crédito, apontando que o consumidor que fica devendo durante um ano nesta linha, vê sua dívida quadruplicar, em média.
O total de empréstimos feitos por meio da modalidade também registrou aumento na variação anual, passando de um saldo R$ 26,14 bilhões no início do ano passado, para R$ 30,9 bilhões em janeiro deste ano, alta de 18,4%.
A inadimplência, por sua vez, foi a maior do sistema financeiro para consumidores: ficou em 39,1%, crescimento de 4,6 pontos em relação a janeiro de 2014.
Embora possa ser solicitada no banco com antecedência, essa linha de crédito normalmente é usada quando a conta do cliente não possui fundos suficientes para saldar a dívida mensal do cartão de crédito.
Segundo o diretor executivo da Associação Brasileira do Consumidor (ABC), Marcelo Segredo, os juros pagos pela maior parte dos consumidores no rotativo, entretanto, é maior que a média apontada pela autoridade monetária.
“Se considerássemos apenas os cinco maiores bancos [Itaú, Bradesco, Santander, Banco do Brasil e Caixa], que detêm a maior fatia dos clientes bancários, a taxa média seria muito maior”, afirmou. No Bradesco, por exemplo, os juros do rotativo podem chegar a 407,7% ao ano (ou seja, fazem a dívida ficar 5 vezes maior), dependendo do cliente.
Para Segredo, o aumento das taxas é resultado de “pura especulação”. O diretor ponderou que somente as altas da inadimplência e da taxa básica de juros (Selic) – que está em 12,25% ao ano – não justificam o preço do crédito.
Na avaliação de Flávio Calife, economista da Boa Vista, administradora do Serviço Central de Proteção ao Crédito (SCPC), as taxas estão balizadas nos riscos. “É uma linha que não possui garantias. Os juros subiram em todas as linhas. No empréstimo pessoal não consignado, os jurosestão em 107,4% ao ano, o que é metade do cheque especial”.
Segredo acrescentou, todavia, que o consumidor possui sua fatia de culpa na questão: a maior parte das famílias tem o costume de parcelar as compras em longos prazos (em 12 ou 15 vezes no cartão, por exemplo), o que resulta em várias pequenas dívidas que, somadas, acarretam em uma fatura mensal enorme, que pode consumir boa parte da renda do trabalhador.
Endividamento
Dados do BC apontam que, em novembro, o endividamento das famílias com os bancos – relação entre o estoque total de empréstimos para consumidores e a renda anual das famílias – estava em 45,8%. Naquele mês, o consumidor tinha, em média, 21,2% da renda comprometida com pagamentos de dívidas financeiras, contra 21,6% em 2013.
Pesquisa da Confederação Nacional do Comércio (CNC), por sua vez, mostra que 57,5% das famílias estavam endividadas no início do ano, contra 63,4% em janeiro de 2014.
Para Segredo, entretanto, diante da conjuntura econômica projetada para 2015, composta por uma alta no desemprego e na inflação, além de um aperto monetário e fiscal, o endividamento deve aumentar neste ano.
O especialista afirmou que o Brasil irá sofrer o efeito cascata da expansão do crédito iniciada em 2008, quando as famílias foram estimuladas a tomar empréstimos, e isso irá impactar na inadimplência e, por tabela, no aumento dos juros do rotativo do cartão.
“As pessoas financiaram carros em 70 vezes, casas em 420 vezes, a geladeira em 24 vezes. Se perderem o emprego, como vão honrar essas dívidas?”, questionou.
Calife, por sua vez, afirmou que os consumidores estão mais cautelosos com o endividamento e mais retraídos no consumo, o que está reduzindo a demanda por crédito. “E os bancos estão mais preocupados com as linhas mais arriscadas”, disse.
Para o especialista, o cenário econômico projetado para 2015 pode aumentar o uso do rotativo, porém, inicialmente, não deve influenciar no nível de calotes.
O economista avaliou, no entanto, que os juros devem subir independentemente da demanda, em parte devido à Selic, mas principalmente por conta de os bancos privados estarem recompondo os spreads – diferença entre os juros pagos pelos bancos para captar recursos e os cobrados para emprestar.
O DCI procurou o Bradesco, por meio de sua assessoria de imprensa, ontem à tarde, porém não obteve retorno até o fechamento desta edição.