Flavio Aguiar
Blog do Velho Mundo
Uma nova tendência subliminar vem ocupando o discurso conservador hegemônico na União Europeia e em particular na Zona do Euro: são as contínuas greves que estão “aleijando” as economias imersas na crise das dívidas públicas, como no caso da Grécia.
As greves “paralisam” a economia, “bloqueiam” a vontade política de adesão entusiástica ou resignada aos “imprescindíveis” planos de austeridade, sem os quais aqueles países, “inevitavelmente”, mergulhariam “no caos” – como se já não estivessem mergulhados no caos.
Novamente vem à baila o caso grego. Se o Parlamento de lá não votasse os novos capítulos do plano de austeridade nesta semana que ora termina, a Grécia teria de abandonar a Zona do Euro, as poupanças seriam pulverizadas, a dívida pública iria para a estratosfera, o desemprego campearia à solta… Só falta um detalhe neste pensamento: constatar que o que ele prevê para um futuro sem o euro já está acontecendo agora, com o euro.
Dessa forma transformam-se os grevistas em “arautos do caos” e, é claro, sem mencionar isso extrovertidamente, justifica-se a repressão sobre eles. Ainda mais quando, “inevitavelmente”, as manifestações descambam em tumulto. Claro: sempre há os que buscam o tumulto. Na semana que passou, por exemplo, enquanto o Parlamento grego debatia e votava os novos cortes orçamentários, aumentos de impostos, novas “flexibilizações” nas leis de proteção ao trabalho etc., mais de 100 mil pessoas fizeram manifestações pacíficas na praça em frente, durante os dias de greve (três, de segunda a quarta).
Mas um pequeno grupo tentou forçar a passagem pelas barreiras levantadas, e houve um enfrentamento com a polícia: pronto, isso foi suficiente para que esse capítulo ocupassem manchetes e fotos garrafais, obliterando o resto.
As novas determinações do plano de austeridade passaram, mas por uma margem mínima. Dos 300 parlamentares, 153 votaram pela aprovação. Seis deputados socialistas se rebelaram e não aprovaram as medidas, junto com um do partido do primeiro-ministro Antonis Samaras. Foram todos imediatamente expulsos de seus respectivos partidos, mas isso não impede a constatação de que a base do governo se estreitou consideravelmente.
Enquanto isso, os movimentos grevistas tendem a se ampliar na semana que vem. A Confederação Europeia de Sindicatos declarou o próximo dia 14, quarta-feira, uma jornada de luta em toda a Europa. Haverá diferentes graus de adesão à proposta. Espera-se uma “greve geral ibérica”, tomando conta de Portugal e Espanha. Espera-se também uma adesão importante na Itália e na Bélgica.
Nesse dia haverá pelo menos manifestações de rua massivas na França, onde cinco centrais sindicais – inclusive a CGT – as estão chamando, em diversas cidades. Esperam-se as decisões em Chipre e Malta. Haverá também manifestações na Áustria, Polônia, Dinamarca, Reino Unido, Holanda, Suíça, Suécia, Finlândia, Romênia, República Tcheca e Eslovênia.
Na Alemanh, a DGB – a central sindical social-democrata – está chamando uma manifestação em frente ao Portão de Brandemburgo, em Berlim, quando uma carta deverá ser encaminhada à chanceler Angela Merkel. Deverá haver manifestações também em outras cidades, como Hamburgo e Munique.
Ainda não se sabe o que ocorrerá na Grécia. Em princípio deveria haver uma adesão massiva à greve geral, mas como a votação do plano de austeridade “puxou” manifestações nesta semana que ora finda, pode ser que o fôlego dos manifestantes esteja algo comprometido.
Há muita expectativa em torno do grau de adesão, de como ocorrerão as manifestações, sobre qual será a reação da mídia e se isso significará um aumento de pressão dos trabalhadores no plano da política institucional. A ver, no dia 14 e depois.