O Globo
Deborah Berlinck,correspondente
PARIS – Ministros das Finanças e presidentes dos bancos centrais do G-20 – grupo que reúne as 20 maiores economias do mundo – chegaram, sábado, a um acordo sobre uma série de indicadores que vão medir os desequilíbrios e guiar a política dos países do bloco. A grande novidade é o fato de a China – a segunda maior economia mundial – ter cedido num dos pontos mais controversos: aceitou incluir a taxa de câmbio como um dos indicadores de desequilíbrio, o que foi comemorado pelo Brasil.
Inicialmente, o país se manteve discreto na questão do câmbio, para não desagradar a Pequim, seu forte aliado no bloco dos países emergentes, os Brics, grupo que reúne os emergentes China, Brasil, Rússia, Índia e África do Sul. Os chineses vêm sendo pressionados a flexibilizar sua moeda, o yuan, artificialmente desvalorizada, para estimular suas exportações.
Entre os indicadores aprovados sábado estão os que apontam desequilíbrios internos de um país (dívida e déficit públicos, poupança privada) e para desequilíbrios externos, como saldo em transações correntes (que inclui balança comercial, viagens, pagamento de juros e remessas de lucros e dividendos).
– Os principais indicadores para nós foram taxa de câmbio e contas externas. O Brasil não cedeu em nada. Tudo o que esta aí interessa ao Brasil. Estamos plenamente satisfeitos com o acordo – garantiu o ministro da Fazenda, Guido Mantega.
Na sexta-feira, os Brics endureceram o jogo e enterrou a possibilidade de um acordo esta semana na reunião do G-20 sobre os indicadores que definiriam os desequilíbrios na economia mundial e levariam à correção de políticas econômicas.
Peso da taxa de câmbio ainda está indefinido
Outra novidade do acordo, que agradou especialmente ao Brasil e à China, foi a desistência de se incluir como indicador de desequilíbrio o excesso de reservas em alguns países. A China, que detém as maiores reservas do mundo – quase 2 trilhões, o equivalente a 31% das reservas mundiais – não quer saber de limites. E Mantega já havia avisado que o Brasil também não cederia neste ponto.
Todos concordaram que o principal desequilíbrio hoje na economia mundial, como descreveu a ministra das Finanças da França, Christine Lagarde, é o fato de a China vender e poupar muito, e a Europa e os Estados Unidos gastarem muito. Os indicadores, segundo ela, são o primeiro passo do G-20 para corrigir isso.
– Temos um acordo! Não foi simples. As negociações foram francas, às vezes tensas, mas frutíferas – comemorou Lagarde, que presidiu o encontro.
A linguagem do acordo, entretanto, não é clara. O texto diz, por exemplo, que, para medir os desequilíbrios externos, o indicador principal serão as transações correntes, “levando em consideração o câmbio e as políticas fiscal e monetária”. Ou seja, uma linguagem diplomática para acomodar as resistências da China, mas que deixam em aberto o peso que o câmbio terá na medição.
Assim, a próxima missão do G-20 passa a ser definir as chamadas “orientações indicativas” para acompanhar cada um dos critérios. Lagarde disse que o objetivo é chegar a um consenso sobre isso na próxima reunião dos ministros de Finanças e presidentes de bancos centrais do grupo, prevista para abril, em Washington.
Debate sobre controle de ‘commodities’ é adiado
Os Brics eram contra o uso das transações correntes como indicador. Tiveram que ceder neste ponto, mas obtiveram como contrapartida a exclusão das reservas. Outro ponto que agradou ao Brasil e os outros países dos Brics: os indicadores não vão resultar em nada compulsório.
– São indicadores, não são metas – disse Lagarde.
Outra vitória do Brasil foi adiar o debate sobre regulação do mercado das commodities – um ponto que a presidência francesa do G-20 vem insistindo. Este foi o motivo, segundo Mantega, de uma longa discussão na reunião. O Brasil não conseguiu, entretanto, tirar o assunto da pauta: o documento final do G-20 diz que organizações internacionais vão analisar os mercados de commodities agrícolas e de energia (petróleo, gás e carvão) e poderão propor soluções.
– Há grande convergência entre países desenvolvidos e emergentes na questão da volatilidade dos derivativos, mas devemos ir mais longe na questão da transparência e identificação dos estoques – disse Lagarde.
O G-20 também manteve outra reivindicação dos países emergentes: liberdade para adotar medidas de controle de capitais. Mas, em contrapartida, decidiu que será negociado um “código de conduta” nesta questão. No fim do comunicado, o G-20 indica os avanços para fortalecer o sistema monetário internacional e diz que o grupo seguirá com a reforma do sistema financeiro.