Motivo pelo qual líderes de 193 países estão reunidos em Copenhague, na Dinamarca, na tentativa de fechar um acordo de redução das emissões de gases de efeito estufa, o aumento da temperatura média do planeta deverá trazer sérias conseqüências também à saúde da população de todo o mundo. Por isso, há alguns anos, cientistas pesquisam a associação desse fenômeno à insegurança alimentar e à proliferação de doenças.
O pesquisador Ulisses Canfalonieri, do Programa de Mudanças Ambientais Globais e Saúde da Escola Nacional de Saúde Pública da Fundação Oswaldo Cruz (Fiocruz) e integrante do Painel Intergovernamental sobre Mudanças Climáticas (IPCC), da Organização das Nações Unidas, explica que as alterações climáticas afetarão a saúde de várias maneiras.
Diretamente, os eventos meteorológicos extremos, como ondas de calor, períodos prolongados de seca e inundações aumentarão as populações de agentes transmissores de doenças, como insetos e roedores. Indiretamente, afetarão a produção de alimentos e colocarão em risco a segurança alimentar – o que também traz prejuízos à saúde das populações vulneráveis.
Segundo ele, estudos indicam que doenças hoje frequentes nas regiões tropicais, como a dengue, podem se espalhar para outras áreas do globo, elevando de 2,5 bilhões para 3,5 bilhões o número de pessoas vivendo em zonas com risco de contrair a enfermidade. “Os casos devem aumentar em países que já convivem com a enfermidade, como o Brasil”, explica. “Uma elevação na temperatura média do planeta até o final do século, como previsto nos cenários mais pessimistas do IPCC, pode reduzir a disponibilidade de alimentos e levar mais de 530 milhões de pessoas a passar fome”.
Calcula-se também que a escassez de água deve afetar 3,2 bilhões de pessoas, enquanto que as regiões sujeitas a enchentes passarão a ameaçar 20% da população mundial. No caso brasileiro, invernos mais quentes favoreceriam a reprodução de insetos transmissores de doenças, como a malária e a leishmaniose, que podem afetar muito mais pessoas, em diversas regiões.
Também se prevê o aumento de enfermidades transmitidas pela água, como a diarreia e a leptospirose. Em uma região economicamente frágil como o semiárido nordestino, por exemplo, as conseqüências podem ser muito graves. A redução da produção agrícola e a falta de trabalho desencadeariam importantes ondas migratórias.
Esse rearranjo populacional demandará empenho e rapidez das autoridades municipais, estaduais e federais para tomar medidas de adaptação, como a construção de cisternas para amenizar a falta d’água e o desenvolvimento de culturas mais resistentes à seca para enfrentar as alterações do clima.
No cenário mais drástico, até 2050, essas mudanças podem provocar uma redução média de 11,4% do Produto Interno Bruto (PIB) do Nordeste. Essa perda equivale a dois anos de crescimento da economia da região no período 2000-2005.
O impacto das mudanças climáticas sobre a vida das pessoas deve aumentar os gastos municipais e estaduais com saúde e assistência social. A necessidade de investimento nessas áreas pode ainda ser ampliada por outro fator: o envelhecimento da população, consequência da queda na fecundidade e do aumento da longevidade.
Segundo o pesquisador, os números do IPCC não têm caráter alarmista. E sim de sinalizar a gravidade das alterações ambientais esperadas para as próximas décadas para que as autoridades possam desenhar políticas que reduzam as vulnerabilidades socioambientais e de saúde