Sergio Lamucci
Valor Econômico
A expectativa de um crescimento mais fraco nas principais economias emergentes e de uma recessão mais prolongada na zona do euro levou o Fundo Monetário Internacional (FMI) a cortar as suas estimativas para a expansão global em 2013 e 2014, um movimento também influenciado pelo desempenho um pouco abaixo do esperado nos EUA.
As reduções nas previsões de crescimento para os países emergentes foram generalizadas e, em alguns casos, como Brasil e Rússia, bastante significativas. Todos os Brics (Brasil, Rússia, Índia, China e África do Sul) tiveram as suas estimativas rebaixadas, tanto para 2013 quanto para 2014, disse o economista-chefe do FMI, Olivier Blanchard.
“Se você olha país por país, parece haver um motivo específico para cada um deles. Na China, são os investimentos improdutivos, no Brasil, o investimento baixo, na Índia, incertezas administrativas e sobre políticas”, disse Blanchard, se perguntando, porém, se não há algo por trás desses componentes cíclicos.
“Acho que o que está por trás desse movimento é uma desaceleração do crescimento potencial [aquele que não acelera a inflação]”. Em entrevista coletiva realizada na terça-feira (9), Blanchard disse os emergentes devem continuar a crescer mais que as economias avançadas, mas o ritmo tende a ser substancialmente menor do que antes da crise.
Uma desaceleração mais forte do crescimento dos emergentes pode fazer estragos consideráveis na economia global. Segundo Blanchard, se o crescimento dos Brics ficar 2 pontos percentuais abaixo do esperado pelo FMI, a expansão dos EUA poderia ficar 0,5 ponto menor. “É algo que realmente tem importância”, disse ele. A instituição projeta crescimento de 5% para os emergentes em 2013, abaixo dos 5,3% previstos em abril. Para 2014, a estimativa foi reduzida de 5,7% para 5,4%.
No caso da Europa, a recessão se mostrou mais forte. O FMI espera que o PIB da zona do euro encolha 0,6% neste ano, e não mais 0,4%. Segundo Blanchard, houve alguma melhora da competitividade em países da periferia (como Espanha, Portugal, Grécia e Itália), com um desempenho razoável das exportações, mas a demanda interna continua fraca, num quadro de ajuste fiscal muito forte e juros ainda elevados. Para a Espanha, por exemplo, o FMI espera contração do PIB de 1,6% neste ano.
Nos países centrais (como Alemanha, França e Holanda), a situação é melhor, mas em casos importantes as projeções também foram revisadas para baixo. O FMI prevê um crescimento de 0,3% para a Alemanha, abaixo dos 0,6% estimados em abril. As exportações da principal economia da zona do euro estão um pouco mais fracas, afetando a indústria e o seu investimento.
Na França, por sua vez, o ajuste fiscal é muito forte, observou Blanchard. Medidas na direção da união bancária e que reduzam a desconfiança nos bancos são importantes para a região, segundo o FMI, que vê espaço para o Banco Central Europeu (BCE) continuar com uma política monetária expansionista. Para 2014, o FMI espera um crescimento de 0,9% para a zona do euro.
No caso dos EUA, o FMI revisou a projeção de expansão do PIB de 1,9% para 1,7% neste ano e de 2,9% para 2,7% no ano que vem. Segundo Blanchard, não é algo preocupante. “As estimativas consideram que o sequestro [os cortes automáticos de gastos de US$ 85 bilhões, que entraram em vigor em março] vai continuar até 2014, um período mais longo do que projetado anteriormente, embora o ritmo de consolidação fiscal ainda vá desacelerar.
A demanda privada deve continuar sólida, num cenário de aumento da riqueza das famílias, devido à recuperação do mercado imobiliário e das condições financeiras ainda favoráveis”, aponta o relatório do FMI.
Para Blanchard, esse quadro da economia global indica que o mundo tem hoje “três velocidades e meia”. A primeira e mais rápida delas é a dos emergentes, que continuam a crescer a taxas mais altas do que o resto do mundo, ainda que a um ritmo mais fraco do que antes da crise. Os EUA aparecem num estágio intermediário, enquanto a zona do euro vem atrás, ainda em recessão. A “meia velocidade” a que se referiu Blanchard é o Japão, que passou a avançar mais rapidamente depois dos fortes estímulos monetários e fiscais adotados no governo do primeiro-ministro Shinzo Abe.
Na semana anterior à reunião de primavera do FMI e do Banco Mundial, em abril, a diretora-gerente do Fundo, Christine Lagarde, disse pela primeira vez que o mundo avançava a três velocidades diferentes. Alguns dias depois, Blanchard voltou a usar a imagem, e chegou a citar o Japão como um país que parecia um caso à parte, podendo configurar uma “meia velocidade”. Na entrevista coletiva de ontem, ele falou com mais convicção sobre o desempenho do país asiático – que deve crescer 2% neste ano, segundo o FMI, que projetava 1,5% em abril.
Para Blanchard, ainda não está claro que essa aceleração é reflexo da Abenomics (a política econômica assim batizada em referência ao primeiro-ministro Shinzo Abe), mas houve de fato um aumento da confiança e na demanda privada.
Para 2014, porém, houve redução da estimativa para o crescimento japonês, de 1,5% para 1,2%, dada a expectativa de um cenário global pior do que o esperado em abril. Blanchard manifestou ainda dúvidas quanto à sustentabilidade da nova política econômica japonesa