A Confederação Nacional dos Trabalhadores do Ramo Financeiro (Contraf-CUT) promoveu, na quarta-feira (5), um debate sobre o sistema de previdência do Chile e as propostas de capitalização da Previdência Social no Brasil. A reflexão, realizada durante reunião da diretoria executiva nacional, contou com a contribuição de Carlos Gabbas, ex-ministro da Previdência no Brasil, e do chileno Andras Uthoff, Conselheiro Regional da Organização Internacional do Trabalho (OIT) e Coordenador da Unidade de Estudos Especiais da Comissão Econômica para América Latina y Caribe (CEPAL).
“Quase todos os dias a imprensa brasileira divulga alguma informação sobre a reforma da Previdência. Mas, não há profundidade na reflexão sobre o assunto. Apenas reproduzem a posição do mercado. Nós, como sindicalistas, representantes da classe trabalhadora, temos a obrigação de estarmos bem preparados para aprofundar esse debate e defender uma reforma que não prejudique a classe trabalhadora, nem mantenha privilégios para as castas que detêm o poder há muito tempo no país e sempre são beneficiadas”, disse a presidenta da Contraf-CUT, Juvandia Moreira, antes de anunciar que a entidade, em parceria com outras confederações sindicais e a Central Única dos Trabalhadores (CUT), vai realizar um seminário sobre o assunto no início do ano que vem. “Estamos contatando parceiros para ampliar o alcance do debate. Quanto mais entidades estiverem envolvidas na organização da atividade melhor. Este tema tem que fazer parte das rodas de conversas de todo trabalhador”, explicou Juvandia.
Segundo a imprensa, a intenção do futuro ministro da Economia, Paulo Guedes, o Brasil deve adotar o sistema de capitalização da Previdência, tendo como modelo o sistema chileno.
No Chile, o trabalhador contribui obrigatoriamente com 10% de seus rendimentos e ainda paga uma taxa de 1,4% para a administração do fundo de previdência, que é semelhante aos fundos de previdências privados existentes no Brasil. Quando se aposenta o trabalhador recebe apenas os recursos que economizou.
Andras Uthoff explicou que nos anos 1980 e 1990 o Banco Mundial, o Fundo Monetário Internacional e o Banco Interamericano de Desenvolvimento condicionou a concessão de empréstimos à implantação do sistema de previdência capitalizado. “Em países democráticos isso não é possível, pois o custo para a transição do sistema era de 4% a 5% do PIB dos países. O Chile fez porque estávamos em uma ditadura. Mas, tiveram que cortar investimentos em educação, em saúde, endividaram o país para custear o sistema previdência capitalizado individual”.
O Estado, e todos os cidadãos por meio de impostos, se responsabilizou pela substituição por custear a transição do sistema, que é de 4,5% do PIB do Chile. Ou seja, pagar os valores de pessoas aposentadas, o déficit operacional e também os “bônus de reconhecimento”, que são os valores pagos por pessoas não aposentadas que já haviam contribuído para o sistema anterior.
As administradoras dos fundos de pensão e os grupos econômicos, que vão ao mercado financeiro e fazem a intermediação dos recursos dos trabalhadores são os únicos beneficiados.
“Criou-se uma ‘indústria de administradores de fundos de pensão’ que hoje são responsáveis por um montante que representa 75% do PIB anual do país e que, a cada quatro anos, lucram o equivalente a 100% do fundo”, criticou Uthoff.
Trabalhadores assumem os ônus
O representante da OIT disse ainda que o sistema de previdência capitalizado não protege os trabalhadores. “Eles assumem todas as consequências dos problemas do sistema capitalista. Se há mudanças demográficas, como o aumento da capacidade de vida, econômicos ou no mercado de trabalho, o trabalhador tem que arcar com todas as responsabilidades dessas alterações e da queda de seu rendimento. O sistema não assume nada”.
“Temos que vencer a narrativa que está sendo imposta e mostrar que o nosso sistema solidário não apenas é melhor, mas que ele é viável”, disse Carlos Gabbas.
Uthoff defende um sistema com múltiplas bases, semelhante ao brasileiro. Uma com benefício universal, mesmo que pequeno, para todo mundo, uma base coletiva, solidário, para melhorar os valores das aposentadorias, e uma base para aqueles que têm maior rendimento, que pode ser voluntária, ou obrigatória, com contas individuais, mas somente para complementar o rendimento. “No caso chileno foi priorizado o sistema de contribuição com contas individuais. Isso gerou diversos problemas que agora não sabemos como corrigi-lo”, disse Uthoff.
“Quando criaram esse sistema, a promessa era a de que haveria grande geração de emprego, crescimento econômico, combate à informalidade. Mas, seguimos com o desemprego, com a informalidade, com o subemprego e o milagre não se produziu”, concluiu o chileno.