A Federação dos Bancários RS e o Sindicato dos Bancários de Porto Alegre e Região promoveram na manhã de sexta-feira, dia 22, mais uma atividade de formação voltada para delegados sindicais. O terceiro módulo do projeto Diálogos para a Ação teve um painel sobre as transformações no trabalho bancário, com a economista do Dieese, Lucia Garcia.
Na abertura a atividade, o diretor da Feeb/RS Amaro Souza falou sobre a importância da concepção das entidades de priorizar atividades formação, a fim de transformar as relações de trabalho. “Estamos no rumo certo, apontando a formação como uma grande ferramenta de luta para as nossas entidades sindicais”, destacou.
A economista Lucia Garcia salientou, que a maioria dos bancários de hoje presenciaram as transformações ocorridas desde a década de 80 e são sobreviventes de um processo de reestruturação produtiva, que reduziu a categoria em 40%.
“Não houve apenas uma redução da categoria, ocorreu uma transformação radical no conteúdo do trabalho. Desde a reforma bancária de 1964 temos um setor que se expandiu a partir de grandes conglomerados, funcionando com redes de agências. Em 1980 ocorre uma automação na vanguarda dos bancos. A convivência com a estabilidade monetária e o crescimento no mundo inteiro fez o setor entrar de cabeça na reestruturação produtiva”.
Volume de emprego
Segundo Lucia, qualidade e quantidade de emprego implicam em fatores como ambiente macroeconômico, relações de trabalho e padrão tecnológico. “Quando nós temos uma flexibilidade nas relações de trabalho ou mudança no padrão tecnológico, temos grande impacto na quantidade e qualidade de emprego. No caso dos bancários tudo mudou. Estamos falando de um mundo totalmente diferente do que em 1970”.
A economista observa que dois grandes modelos foram os norteadores da estruturação produtiva no setor bancário: o da Grã-Bretanha, baseado na aquisição de clientes e o adotado na França e Alemanha, que prioriza o cultivo ou a fidelização de clientes. Estas estratégias de reestruturação mudaram a organização e o mercado de trabalho.
Ela explica que na estratégia de cultivo de clientes há uma necessidade de qualificação dos trabalhadores, a partir de altos investimentos em formação e treinamentos. Além disso, o modelo exige que a empresa também conte com o conhecimento adquirido através da experiência do trabalhador.
“No Brasil a estratégia adotada foi a de cultivo ou fidelização de clientes. Primeiro houve uma mudança no espaço físico de trabalho. Hoje a agência é uma loja. Tem todos os elementos promocionais, é colorida, atrativa e segmenta os clientes. A maior parte deles é atendida no auto-atendimento. A idéia é justamente essa, que o cliente não entre na agência, ou que pelo menos a massa de clientes não entre. Além disso, nós temos um novo tipo de organização do trabalho, da produção e das atividades cotidianas, quando surgem novos papéis. O processo de decisão torna-se mais compartilhado o que não é necessariamente algo positivo. Junto com trabalho em equipe e mais cooperativo também há estímulo à criatividade. O papel do gerente mudou muito nisso”.
Extinção de funções
De acordo com Lucia, as conseqüências dessa estratégia reduziram o número de funções, devido ao processo de decisão compartilhada. Quase todos os bancários viraram gerentes, que contam com vários produtos. Os níveis hierárquicos intermediários foram extintos pelos bancos e a organização do trabalho passou a ocorrer por meio de processos e não mais em função e na focalização de todo trabalho, de modo que as demais atividades foram terceirizadas.
Com isso, boa parte do trabalho burocrático sumiu, o que resultou na constituição de um novo perfil de bancário. A especialidade do novo bancário é saber vender, com conhecimentos em mercados e matemática financeira, atitude negocial aliado ao domínio de softwares para simulação de negócios e de idiomas, no caso de alguns nichos.
“Por outro lado, houve uma reconstrução do conceito de funcionalismo bancário. Nós tínhamos um trabalhador de elevado status na sociedade na década de 60. Nas décadas de 70 e 80 tivemos uma desvalorização do trabalho devido à rotatividade muito elevada, que coincidiu com os momentos de pico de inflação do Brasil. Em seguida se recompôs um perfil do funcionalismo bancário, mas baseado nestas condições”.
Lucia enfatiza que, com as mudanças hierárquicas, o gerente de agência passa a cuidar da unidade quase na integralidade, pois ela é quase uma franquia. A avaliação do gerente também mudou. Ele não é mais avaliado pelo volume de trabalho ou de clientes, mas pela rentabilidade da agência e pelo cumprimento das metas estabelecidas pelo banco.
“Quando nós temos uma estrutura de trabalho baseada em metas, os limites do trabalho tornam-se cada vez mais fluídos. Os profissionais que não se adaptaram a este processo foram eliminados”.