A falta de regulamentação dos mercados é a origem da crise econômica mundial, que nada mais é do que uma convergência das crises financeira, alimentícia e energética. Sendo que as duas últimas são agravadas pela especulação de commodites, que têm preços dos alimentos e do petróleo controlados exclusivamente por interesses de um mercado que tem nome e endereço: seguradoras multinacionais, investidores, bancos, empresas ou mesmo pessoas. Essa avaliação é de Kjeld Jakobsen, professor de Relações Internacionais, que fez uma análise de conjuntura nesta segunda-feira (6), na sede do Sindicato dos Bancários de São Paulo.
Kjeld, ex-secretário de Relações Internacionais da CUT, lembrou que a face mais visível dessa crise atinge a Europa, embora seja decorrente da de 2007, nos EUA. Ele avalia que a crise americana deu para ser controlada por meio da injeção de trilhões de dólares para salvar o sistema financeiro, mas fez com que os governos gastassem o que tinham e o que não tinham neste socorro.
“Agora vem a fatura. Os países que tiveram de se adaptar mais, situados na periferia da União Europeia, como a Grécia, não tinham recursos para saldar suas dívidas”, destacou.
Kjeld criticou os governos europeus por cortar gastos para tentar solucionar a crise, enquanto o momento è disponibilizar crédito para fomentar a economia. “A crise deve se agravar, porque eles adotaram a pior medida: economizar em um momento que você precisa por dinheiro na economia, dar crédito. A exemplo do que foi feito aqui, no Brasil. Mas os europeus estão adotando medidas neoliberais extremas, cortando fundos de bem estar social”, disse, ao destacar o aumento do desemprego e a diminuição da renda da população.
Desemprego
O professor apresentou números preocupantes. Ele disse que, em média, o desemprego na Europa ultrapassa o patamar de 10% – percentual que dobra entre os jovens. Na Espanha, a situação é ainda pior, pois o desemprego chega a 20% e no caso dos jovens a 40%.
Segundo dados da Organização Internacional do Trabalho (OIT), 200 milhões de pessoas estão desempregadas no mundo e, a cada ano, 40 milhões de jovens entram no mercado de trabalho. Além disso, 900 milhões de trabalhadores recebem menos de U$ 60 por mês. Ou seja, 20% do salário mínimo brasileiro.
“Os governos são ruins? Isso é uma pressão de empresas que querem reduzir despesas. E uma das formas é a flexibilização do mercado de trabalho”, afirmou ao destacar um mecanismo muito utilizado na Espanha: o contrato temporário de trabalho. “A empresa demite e contrata a mesma pessoa em vez de formalizá-la, só para fugir dos encargos trabalhistas.”
Efeitos da crise
O professor chama ainda atenção sobre a eleição de governos neoliberais e de extrema direita na Europa. Para ele, a crise política assume essa dimensão, de modo que a soberania nacional se perde. E aponta a situação da Grécia, cujo primeiro-ministro foi pressionado por Alemanha e França a fazer reformas com retirada de direitos.
O primeiro-ministro cedeu à pressão, mas foi demitido, pagando o preço por impor medidas impopulares. Quem faz a reforma é retirado do poder, que passa a ser exercido por grupos ainda mais conservadores.
Para o professor na América Latina a situação é diferente, mas ainda há repercussão do que ocorre no mundo. No Brasil a estimativa é de que o PIB cresça 3%, ante 7% do ano anterior. Isso decorre da crise, dos efeitos no câmbio e da redução dos mercados americano e europeu.
Para Kjeld, os desafios para os trabalhadores são grandes. Eles precisam intensificar cada vez mais suas formas de organização para construir propostas coletivas frente aos projetos individuais de mercado e, sobretudo, levantar a bandeira da igualdade para contrapor os avanços da ideologia de extrema direita que se instala à sombra da crise econômica e social.
No encontro, também abordados os mecanismos de interferência dos trabalhadores nas relações internacionais por meio das normas da OIT e das diretrizes para empresas multinacionais no âmbito da OCDE.
A participação do professor em seminário do Sindicato segue as determinações do planejamento da entidade, realizado no final de 2011, objetivando aprimorar o conhecimento dos bancários sobre os instrumentos internacionais para fazer frente às empresas globalizadas.
“Os bancos estão cada vez mais internacionalizados. A estratégia dos trabalhadores organizados também mudou com o passar dos anos e ganhou uma atuação também internacional. Por isso estamos sempre ampliando nosso conhecimento e buscando utilizar as estruturas e mecanismos possíveis para defender e inserir a pauta dos trabalhadores seja nas discussões nacionais ou globais”, disse Raquel Kacelnikas, secretária-geral do Sindicato.
Participaram também do seminário José Drummond, assessor da Secretaria de Relações Internacionais da CUT; Ericson Crivelli, da Crivelli Advogados que presta assessoria ao Sindicato, além de Isabela Moori de Andrade, do Ponto de Contato Nacional da OCDE (Organização para Cooperação e Desenvolvimento Econômico) no Brasil.