CUT reuniu no FSM Emir Sader, Beto Almeida e Ovídio Garcia, da TeleSul
CUT Nacional
Leonardo Severo e Paula Brandão, de Belém
A mesa “A Comunicação dos trabalhadores na disputa ideológica” foi sucesso de crítica e de público durante o Fórum Social Mundial realizado em Belém de 27 de janeiro a 1º de fevereiro, mobilizando, além de sindicalistas e intelectuais, inúmeras lideranças dos movimentos sociais e de entidades ligadas à democratização da comunicação, como o FNDC e o Coletivo Intervozes.
Participaram do evento como debatedores o sociólogo Emir Sader, secretário executivo do Conselho Latino-americano de Ciências Sociais (Clacso) e dirigente do Laboratório de Políticas Públicas da UERJ; o jornalista Beto Almeida, do Canal Comunitário de Brasília, da TV Senado e responsável no Brasil pela Televisão do Sul (TeleSul); o jornalista cubano Ovídio Garcia, do Conselho Internacional da Telesul e a secretária nacional de Comunicação da Central Única dos Trabalhadores, Rosane Bertotti. A mesa foi mediada pelo secretário de Políticas Sociais da CUT, Expedito Solaney.
Com o auditório do Setorial Básico da Universidade Federal do Pará (UFPA) completamente lotado, Beto Almeida frisou que a mídia (anti) brasileira é hoje o grande partido de direita em nosso país e destacou a importância da sociedade passar a contar com instrumentos como a TV Brasil para interferir na disputa político-ideológica e enfrentar os setores contrários à democracia e à própria soberania nacional. Beto fez um retrospecto sobre a criação da Televisão do Sul, canal público que têm como objetivo “fortalecer a integração da América Latina por meio do intercâmbio de informações entre os países” e apontou como a TeleSul tem expandido o número de entidades parceiras: “esta cooperação deve ser ampliada ainda mais para que a mídias do campo público se fortaleçam”. “Não existe saída para fazer frente à disputa ideológica se não conseguirmos fortalecer as mídias do campo público, e desta forma, escapar da midiocracia estabelecida”, ressaltou. “A TeleSul nasce com o propósito de integração latino-americana e como uma resposta à ditadura das mídias. No Brasil, temos o Canal Brasil, a TV Senado e outros canais públicos que deveriam ter esse papel, mas ainda não têm. Há necessidade e urgência no processo de transformação e efetivação desses e outros canais para que se tornem públicos de fato, afinal, são espaços da sociedade e se isso não se cumpre, o Estado deve ser cobrado”, acrescentou.
DISPUTA – “A TV Brasil é do povo, precisamos disputar o seu Conselho Curador, interferir na sua concepção ideológica, garantindo espaço em sua grade para os movimentos sociais”, declarou o jornalista, lembrando que “foi exatamente o presidente que teve menos acesso à leitura o que teve a grande sensibilidade de ver que boa parte da programação brasileira é simplesmente degradante, embrutecedora, animalizante. Por isso a criação da TV Brasil”. Denunciando a campanha midiática contra o presidente Lula que, após ter falado explicitamente contra certo tipo de leitura, “por fazer mal ao fígado”, foi caluniado como se houvesse se posicionado contra a leitura em geral, o jornalista lembrou a aversão histórica e persistente da oligarquia midiática à popularização da cultura. Beto exemplificou a ojeriza, citando uma conversa entre Monteiro Lobato com o proprietário de um dos maiores jornais paulistas, onde propôs que seu diário se engajasse numa campanha para erradicar o analfabetismo, obtendo uma resposta “desconcertante, mas sociologicamente explicativa”: “Ô Monteiro, mas se todos aprenderem a ler, quem é que vai trabalhar na enxada???”.
PÚBLICO X MERCANTIL – O professor Emir Sader dissecou a “ideologia da globalização” e a sua exacerbação da cultura de consumo, de mercado e de competição, que alimenta uma concepção de concorrência contra a solidariedade, de salve-se quem puder, “onde se fecham os espaços públicos e tudo se privatiza”. “A América Latina foi o laboratório de experiências neoliberais: aqui o modelo nasceu, se estendeu e assumiu suas formas mais radicais. Por causa disso, o continente sofreu uma ressaca neoliberal e passou a ser o elo mais fraco dessa cadeia, onde proliferam governos eleitos no bojo da rejeição ao neoliberalismo, na contramão das tendências mundiais”.
Para Emir, o momento que estamos vivendo é de superação: “uma passagem da fase de resistência à de construção de alternativas, que tem a América Latina como seu principal cenário e seus governos como os principais protagonistas”. Na compreensão do professor, esta é uma questão chave para romper com as limitações dos Fóruns Sociais Mundiais, que inicialmente consolidaram uma visão que reduzia a exclusividade da luta aos movimentos sociais, “privilegiando uma suposta sociedade civil”. A participação dos presidentes Lula, Chávez, Evo, Rafael Correa e Lugo no Fórum Social Mundial do Pará, avalia, mostra que são esses governos populares, com suas diferenças e eventuais limitações, que vêm construindo com políticas estatais “as alternativas superadoras do neoliberalismo, seja pela garantia e extensão de direitos, pela regulamentação do capital financeiro ou a construção de alternativas à Organização Mundial do Comércio”.
Emir enfatizou o papel da democratização da comunicação na luta pela libertação das consciências, pois “cinco famílias em nosso país detêm os cinco maiores canais de comunicação, numa dinastia familiar midiática que passa de pai para filho”. Quebrar a espinha dorsal desta ditadura dos meios que impõe a comunicação das classes dominantes e seu sistema, declarou, é imprescindível para o avanço da democracia: “a atual polarização é entre a comunicação pública e a mercantil”. A serviço do sistema financeiro privado e das transnacionais, denunciou o professor, a imprensa (anti) brasileira projeta uma visão negativa do Estado, servindo como propagandista do seu debilitamento, da privatização de serviços, da precarização das relações de trabalho. Daí a importância da construção de uma mídia contra-hegemônica para combater a desinformação e a alienação, explicou.
MULTIESTATAL – O cubano Ovídio Garcia, da TeleSul, enumerou vários avanços obtidos a partir da existência da nova Televisão do Sul, “canal multiestatal que incorpora contribuições da Venezuela, Cuba, Argentina, Uruguai, Nicarágua e Bolívia no campo da integração comunicacional e da disputa ideológica”. “A Telesul foi pela primeira vez ao ar no dia 24 de julho de 2005, em homenagem ao nascimento do libertador Simón Bolíviar (1783), símbolo da luta de redenção nacional. É um canal de informação, de opinião, de entretenimento, educativo e político, que confronta os grandes meios de comunicação – sempre alinhados ao governo norte-americano, aos grandes industriais e latifundiários na exploração da mão-de-obra de trabalhadores e camponeses”, destacou.
“Ao lado de quem está a TeleSul?”, questionou Ovídio, respondendo de imediato: “ao lado dos palestinos em Gaza, bombardeada por Israel, mostrando o que é encoberto pela CNN; promovendo o entendimento na Colômbia; lutando contra o bloqueio à Cuba e pela libertação dos cinco cubanos presos por anti-terrorismo; em defesa das causas justas da América Latina. Em suma, dizendo não à manipulação, falando sobre a causa das coisas, como evoluem os fenômenos, sempre guiada pelo amor à verdade e à luta por um amanhã melhor para os nossos países e povos”, acrescentou.
CUT – Na avaliação de Rosane Bertotti, a mesa cumpriu com seu papel, não apenas por reunir a reflexão de tantos intelectuais, jornalistas e movimentos sociais que atuam para virar a página de escuridão a que nos relegou o latifúndio midiático, como por estimular à ação desde a base das entidades para construir o novo, por meio de instrumentos próprios e também de espaços públicos. Neste sentido, ressaltou, o anúncio feito no Fórum Social Mundial pelo ministro da Secretaria Geral da Presidência, Luiz Dulci, foi extremamente importante, “pois atendendo a uma reivindicação histórica dos movimentos pela democratização da comunicação, o governo abre espaço para corrigir uma grave distorção, que tantos problemas têm causado ao sistema democrático”. “Precisamos, e vamos, transformar este sistema, mudando a fundo o coração dos meios de comunicação, construindo um novo marco regulatório e rompendo com o atual monopólio da palavra de alguns poucos interesses privados sobre o conjunto da sociedade”, acrescentou a secretária nacional de Comunicação da CUT. Rosane aproveitou para conclamar a militância cutista a estar na linha de frente dos debates da Conferência e asseverou que a direção da CUT se empenhará e trabalhará com afinco nos próximos meses para potencializar e qualificar a intervenção dos sindicalistas no evento, que acontecerá de 1 a 3 de dezembro.