CUT cobra do governo novas medidas para proteger o emprego

Na audiência desta quarta-feira 10, após o ministro da Fazenda Guido Mantega ter feito um relato de medidas que o governo vem tomando para enfrentar a crise financeira e tentar defender os empregos, o presidente da CUT, Artur Henrique, classificou as medidas de “insuficientes”. Artur afirmou a Mantega que, entre as iniciativas que precisam ser tomadas com maior rapidez, a maior ausência são instrumentos para cobrar do empresariado e do setor financeiro o compromisso expresso de manter os empregos atuais e continuar gerando novas vagas. Para Artur, o governo pode interferir nesse comportamento através das contrapartidas sociais – que vão atrelar os financiamentos, empréstimos, “socorros” ou isenções fiscais com dinheiro público a metas explícitas de emprego.

Diante da cobrança, Mantega comprometeu-se a marcar encontros setoriais, com a maior rapidez possível, entre trabalhadores, empresários e governo para formatar esse instrumento. Tais encontros poderiam ser interpretados, na avaliação da CUT, como embriões de novas câmaras setoriais – proposta que faz parte da pauta entregue ao ministro hoje.

Tendo como centro a questão do emprego, a CUT cobrou também a correção da tabela do imposto de renda e uma nova estrutura para essa tabela – como forma de desonerar assalariados e ampliar a tributação sobre os que mais ganham. Não houve anúncio de nenhuma medida nesse sentido por parte do governo, o que foi considerado “frustrante” pela comissão da CUT presente ao encontro.

A CUT também defendeu que haja desoneração da folha de pagamento, mas apenas para empresas e setores que garantam a redução da jornada de trabalho sem redução de salários e com as contrapartidas sociais. A Convenção 158 também foi destaque na explanação de Artur.

O ministro da Fazenda afirmou que a nova tabela do IR ainda depende de conversa com o presidente Lula -embora o ministro Luís Dulci, da Secretaria Especial da Presidência já tenha sinalizado positivamente sobre o tema à imprensa, na mesma tarde. Mantega também afirmou, durante a audiência, que medidas para reduzir o custo do crédito ao consumo e à produção serão anunciadas nos próximos dias.

“Não houve nenhuma informação mais objetiva sobre que medidas são essas. Mas, de qualquer maneira, já podemos avaliar que o conjunto das medidas continuam insuficientes”, informou Artur.

Participaram da audiência pela CUT também o secretário-geral Quintino Severo, o secretário nacional de Finanças Jacy Afonso, a secretária nacional sobre a Mulher Trabalhadora, Rosane da Silva, o secretário nacional de Políticas Sociais, Expedito Solaney, e o diretor executivo José Lopez Feijóo.

Veja, a seguir, a carta entregue ao ministro:

Excelentíssimo Senhor

Dr. Guido Mantega

Ministro da Fazenda

No presente momento, a economia capitalista passa pela mais grave crise desde 1929. É uma crise estrutural do sistema que explora a classe trabalhadora, que concentra renda e que condena milhões à fome e à miséria. Este sistema, desde as últimas décadas do século XX, tem se guiado por políticas de liberalização financeira e comercial. As políticas de desregulamentação e da auto-regulação do mercado estão na base da crise financeira atual. O resultado desta liberdade sem controles resultou em um processo de financeirização sem limites, cuja expressão é a existência de um fosso entre a riqueza produzida na forma de papéis (títulos públicos, ações e derivativos) e a riqueza real alcançada pela produção e pelo trabalho. De acordo com dados do Bank for International Settlements (BIS), a riqueza em papéis denominados de “derivativos e outras inovações financeiras” é de cerca de US$ 600 trilhões comparado a um valor de produção efetiva de riquezas, medida pelo PIB mundial, de US$ 65 trilhões. O colapso do sistema de financiamento imobiliário americano é apenas a face mais visível de uma crise mais profunda.

Diante do número de instituições e empresas envolvidas, da somatória dos valores em jogo e do risco de propagação rápida dos efeitos da crise sobre os investimentos, a produção e o emprego, os governos dos países desenvolvidos e em desenvolvimento vêm adotando um conjunto de ações, como a aplicação de mecanismos de “socorro” às instituições afetadas, o aumento da liquidez na economia e as alterações nas taxas de juros e nas taxas de câmbio etc.

A economia brasileira apresentou taxas de crescimento expressivas entre 2004 e 2007: taxa anual média de crescimento do PIB de 4,4% contra 2,1% em média anual nas duas décadas anteriores. Este desempenho alicerçou-se, em grande medida, na expansão da economia doméstica e em três vetores fundamentais: o aumento das exportações, o incremento do crédito e as medidas de distribuição de renda, especialmente as políticas de valorização do salário mínimo e o Programa Bolsa Família. Como conseqüência, no Governo Lula, expandiu-se a contratação de empregos formais nos diversos setores da atividade econômica e iniciou-se um processo de recuperação dos salários em geral, por meio das negociações coletivas.

A CUT contribuiu diretamente para este cenário positivo, por intermédio, entre outros, de suas propostas e mobilizações, como as Marchas à Brasília, que foram determinantes para a execução da Política de Recuperação do Salário Mínimo; dos acordos de atualização da tabela do Imposto de Renda; das negociações que resultaram na redução das taxas de juros nos empréstimos com consignação em folha; da pressão por mais investimentos em políticas sociais como a educação e saúde e por recursos adicionais para a agricultura familiar.

Os efeitos da crise financeira internacional sobre a economia brasileira já começam a se fazer sentir, como o anúncio de demissões, férias coletivas e suspensão dos investimentos programados em setores importantes de nossa economia. Portanto, é fundamental uma intervenção rápida, correta e decisiva do Estado brasileiro, para impedir que estes efeitos se espraiem sobre os vários setores, interrompendo bruscamente o referido processo de crescimento econômico. Mais ainda: a intervenção é essencial, porque, em um cenário de propagação da crise, os trabalhadores são certamente as maiores vítimas, por meio da perda do emprego e da rápida queda do nível de renda, entre outros.

Reconhecemos que o governo brasileiro tem adotado medidas para salvaguardar o funcionamento do sistema de crédito no Brasil e preservar da crise a economia real, como a medida de liberação do compulsório e a permissão para que os bancos públicos (Caixa Econômica Federal e Banco do Brasil) possam incorporar instituições financeiras e não-financeiras em dificuldades. A CUT defende que medidas como estas sejam obrigatoriamente acompanhadas de contrapartidas para o Estado e os trabalhadores.

A CUT entende que a intervenção do Estado não pode significar a “socialização das perdas” do setor financeiro com a sociedade em geral – sendo que, no período do crescimento recente, o que se percebeu foi a “privatização dos ganhos” expressa nos gigantescos lucros anuais dos bancos, que atingem a casa de dezenas de bilhões de dólares no Brasil.

Diante deste diagnóstico, apresentamos ao Sr. Ministro da Fazenda o seguinte conjunto de diretrizes de propostas para o enfrentamento da crise:

A) DEFESA DO EMPREGO E DA RENDA DOS TRABALHADORES

1) CONTRAPARTIDA DE MANUTENÇÃO E AMPLIAÇÃO DO EMPREGO EM TODAS AS POLÍTICAS DE APOIO GOVERNAMENTAL (DE CARÁTER FISCAL, CREDITICIO OU OUTRAS) AS EMPRESAS

Qualquer apoio que o governo tenha concedido ou resolva conceder às instituições financeiras e não-financeiras devem ter as seguintes contrapartidas:

1.1 Garantia da manutenção do nível de emprego nas instituições financeiras e não-financeiras.

1.2 Garantia de estabilidade de emprego nos processos de fusões e incorporações.

1.3 Garantia que os volumes de recursos dos programas de apoio serão devolvidos ao Estado, em parcelas e prazos previamente determinados.

1.4 Limitação dos rendimentos dos executivos das instituições financeiras e não-financeiras.

1.5 Qualquer empresa que tenha se beneficiado de apoio governamental e que tenham demitido, alegando a crise, deve rever as demissões e recontratar os trabalhadores como são os casos da Vale do Rio Doce e da Aracruz.

2) DESONERAÇÃO DA FOLHA DE PAGAMENTOS SOMENTE SE ASSOCIADA À REDUÇÃO DA JORNADA DE TRABALHO E MANUTENÇÃO DO NÍVEL DE EMPREGO:

No Programa de desoneração da folha de pagamentos, que vem sendo atualmente debatido pela equipe econômica do governo com o empresariado, estabelecer que o Programa de Desoneração da Folha somente ocorrerá para as empresas que se comprometerem a reduzir a jornada de trabalho sem redução de salário e que mantenham ou ampliem o atual nível de emprego. Este Programa teria duração de 12 meses.

Para a preservação dos recursos da seguridade, o Tesouro compromete-se a manter o atual nível de arrecadação. A perda de arrecadação estimada é de R$ 4 bilhões por ponto percentual de redução da alíquota.

A proposta em definitivo de desoneração da folha de pagamentos, debatida na Reforma Tributária, deve, do nosso ponto de vista, associar à desoneração da folha de pagamentos com a transferência da cobrança da contribuição previdenciária patronal da folha de pagamentos para o Imposto sobre Valor Adicionado Federal.

3) APOIO DO GOVERNO FEDERAL AOS PROJETOS DE LEI DE INTERESSE DOS TRABALHADORES QUE RESULTEM NA GERAÇÃO DE EMPREGO, ENTRE OS QUAIS:

3.1 Ratificação da Convenção nº 158 da OIT

3.2 Redução Constitucional da Jornada Semanal de Trabalho, de 44 h para 40 h

3.3 Alteração do artigo 59 da OIT, com a limitação das horas extras

4) CÂMARAS SETORIAIS: Constituição, em caráter emergencial, de Câmaras Setoriais e especialmente nos setores mais atingidos pela crise do crédito e retração da atividade econômica, de forma que as iniciativas de apoio do Estado representem contrapartidas na área da garantia do emprego, melhoria das relações de trabalho em cada setor.

5) SALÁRIO MÍNIMO: Manutenção da Política de Valorização do Salário Mínimo e a incorporação da variação dos preços da alimentação já no reajuste de 2009.

6) APOSENTADORIAS E POLÍTICAS DE SAÚDE E EDUCAÇÃO: Fim do fator previdenciário; Valorização das aposentadorias; e garantia de recursos para as políticas públicas de saúde e educação, com a ampliação de recursos do orçamento público para as áreas sociais (EC29, FUNDEB etc) e os programas de transferência de renda.

7) CUMPRIMENTO DOS ACORDOS COM OS SERVIDORES: Cumprimento pleno dos acordos coletivos firmados com os servidores públicos em todas as esferas de governo (federal, estadual e municipal) e ratificação da Convenção nº 151 da OIT, que prevê a negociação coletiva para os servidores públicos.

8) PREÇOS DOS BENS IMPORTADOS DE PRIMEIRA NECESSIDADE: Redução do impacto da desvalorização do real nos preços dos alimentos e produtos de primeira necessidade, por meio, entre outros, da redução dos impostos internos, com a contrapartida da manutenção de preços.

Ao mesmo tempo, o governo deve incentivar políticas de produção interna destes bens atualmente importados.

9) PROGRAMA DE GERAÇÃO DE EMPREGO E RENDA NA AGRICULTURA

Programa especial de geração de emprego e renda na agricultura a partir do fortalecimento da agricultura familiar e garantia de preços mínimos.

10) AUMENTO DA RENDA DISPONÍVEL DOS TRABALHADORES POR MEIO DAS ALTERAÇÕES DAS REGRAS DO IMPOSTO DE RENDA
A política tributária é um dos principais instrumentos de distribuição de renda de uma nação. Para que essa política seja justa e eficaz, é necessário um sistema tributário que tenha como um dos seus princípios a progressividade. Isto é, os cidadãos de renda mais elevada devem pagar proporcionalmente mais impostos do que os cidadãos de menor renda.

Este princípio está presente no parágrafo 1º do artigo 145 da Constituição Federal, que diz: “os impostos terão caráter pessoal e serão graduados segundo a capacidade econômica do contribuinte (…)”. Para a CUT, ele deve nortear a revisão das regras do IRPF.

Assim, as propostas da CUT para a estruturação de novas regras para o IRPF são:

1. Correção da tabela do IRPF pela taxa de inflação integral do período, corrigindo-se a defasagem que o aumento da inflação gerou sobre o acordo em vigor.

2-Ampliar o número de faixas do IRPF, de modo a recuperar o caráter progressivo desse imposto, tal qual verificado em outros momentos da história do País.

3-Aumentar o limite de renda tributável isenta do IR, com vistas a permitir a elevação da renda disponível das famílias de baixa renda.

4-Diminuir a alíquota da 1ª faixa de contribuição.

5-Atualizar anualmente a tabela do IRPF conforme o índice de inflação.

6-Considerar como rendimentos não tributáveis os recebimentos de aposentadorias e pensões pagas pelo INSS ou Regimes Próprios de Previdência, até o teto definido para o Regime Geral de Previdência Social.

7-Estabelecer que os ganhos oriundos do 13º Salário, que atualmente tem tributação exclusiva, passem a incorporar a remuneração anual possibilitando assim a restituição do imposto recolhido sobre ele, quando devida.

8-Aumentar os valores mensais de dedução de gastos com dependentes.

9-Elevar o limite individual anual de dedução das despesas com instrução do contribuinte e/ou de seus dependentes.

10-Deduzir todas as despesas com educação própria e dos dependentes.

11-Deduzir os gastos com medicamentos de uso contínuo, mediante comprovação.

12-Deduzir os gastos com próteses ortopédicas, equipamentos para deficiência e equipamentos de suporte a vida (tal qual marca-passo).

13-Retornar a dedução dos aluguéis até um limite a ser definido como mínimo para garantia do direito à moradia, bem como a incorporação a esses gastos os pagamentos de taxas incluídas no valor da moradia, tais como condomínio.

14-Eliminar o limite de desconto das contribuições previdenciárias do empregador ao INSS quando da formalização do empregado doméstico.

15-Deduzir mensalmente os valores gastos com saúde, educação e previdência complementar, tal como acontece com as deduções com dependentes.

Com vistas a viabilizar o debate em torno dessas propostas e a sua futura transformação em decisões governamentais, a CUT defende a instauração de um espaço de negociação na qual participe os representantes dos trabalhadores, conforme acordado em 2006 no acordo do Salário Mínimo e reajuste da tabela do IRPF.

B) POLÍTICAS ECONÔMICAS
11) REDUÇÃO DAS TAXAS DE JUROS E DOS SPREADS BANCÁRIOS

12) AMPLIAÇÃO E DEMOCRATIZAÇÃO DO CONSELHO MONETÁRIO NACIONAL: Ampliação e democratização do CMN, por meio da indicação de representantes do setor produtivo – representações dos trabalhadores e dos empresários – no Conselho.

13) SISTEMA DE METAS DE INFLAÇÃO MAIS FLEXÍVEL: Sistema de Metas de Inflação mais flexível, com a efetiva utilização do intervalo de taxas de inflação admissíveis, sem determinar qual a meta-centro.

14) SUSPENSÃO DO SUPERÁVIT PRIMÁRIO: Suspensão do superávit primário e ampliação dos investimentos em obras de infra-estrutura, a valorização do serviço público e das políticas sociais, a exemplo dos Territórios da Cidadania.

15) RENEGOCIAÇÃO DAS DÍVIDAS DAS PEQUENAS EMPRESAS E DOS TRABALHADORES: Estruturação pelo Governo Federal de Plano de Renegociação de Dívidas com o setor público e o setor privado para pequenas empresas, assalariados e trabalhadores em geral.

16) MECANISMOS QUE ASSEGUREM A EFICÁCIA DA POLÍTICA DE REDUÇÃO DO COMPULSÓRIO: Criação de mecanismos como multas, taxas, punições administrativas, entre outras, que assegurem a concessão de crédito à economia e que os recursos liberados pelo governo federal cheguem à economia real, não sendo utilizados pelos bancos para outros fins.

17) CRÉDITO PARA A AGRICULTURA FAMILIAR E PARA O SETOR HABITACIONAL: Ampliação das ações para garantir crédito e seguro para a agricultura familiar, como também o crédito imobiliário, visando combater o déficit habitacional.

C) INVESTIMENTOS

18) REDUÇÃO DA TAXA DE JUROS DE LONGO PRAZO (TJLP) E LINHAS ESPECIAIS DE FINANCIAMENTO POR MEIO DO BNDES: Como forma de apoio aos investimentos e manutenção da atividade produtiva, o BNDES deve sinalizar positivamente em relação ao futuro, por meio da redução da taxa de juros de longo prazo (TJLP), além de constituir linhas especiais de financiamento para os setores produtivos mais atingidos pela crise. Em contrapartida, as empresas beneficiadas devem se comprometer com metas de manutenção e geração de emprego e renda.

D) REGULAMENTAÇÃO DO SISTEMA FINANCEIRO NACIONAL E INTERNACIONAL

19) REGULAMENTAÇÃO DO ARTIGO DE Nº 192 DA CF: Regulamentação do artigo nº 192 da Constituição Federal, que trata da regulação e do papel social do Sistema Financeiro.

20) FORTALECIMENTO DO PAPEL DOS BANCOS PÚBLICOS: Exercer o papel de liderança destes bancos no sistema financeiro brasileiro, por meio, entre outros, da ampliação da oferta de crédito e redução o spread bancário especialmente nas linhas e segmentos que hoje não são plenamente atendidos aos segmentos que hoje não são atendidos pelas demais instituições financeiras, como o crédito rural, o microcrédito, o crédito ao pagamento da folha de pagamentos, entre outros.

21) CONTROLE DO FLUXO DE CAPITAIS: Estabelecer mecanismos que promovam maior tempo de permanência dos capitais financeiros investidos no Brasil.

22) MERCOSUL: Fortalecimento do Mercosul como forma de reduzir os impactos dos fluxos de saída de capitais externos. Este fortalecimento deve enfatizar os aspectos de complementaridade dos projetos e o desenvolvimento da dimensão social, com o estabelecimento de contrapartidas e aplicação da Declaração Sócio-Laboral.

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