Nesta terça-feira, 23, a CUT se reúne para debater em profundidade o Programa de Aceleração do Crescimento (PAC), anunciado ontem pelo governo federal, e suas conseqüências sobre a vida dos trabalhadores e trabalhadoras.
Algumas conclusões, porém, já são possíveis, apesar de o trabalho de análise ter sido feito, ontem, a partir de informações parciais, já que as medidas provisórias, decretos e projetos de lei que alicerçam o PAC não estavam disponíveis até o final do dia. Ao mesmo tempo, insistentes pedidos de entrevista por parte da grande imprensa – também em busca de traduzir o projeto governamental – ocuparam grande parte do tempo de dirigentes da Central.
A sinalização que o governo faz, de que buscará maior ousadia no crescimento, é importante, mas o conjunto das propostas precisa ser aperfeiçoada, com a inclusão de reivindicações históricas da CUT. Porém, é necessário ressaltar, avaliam dirigentes da Central ouvidos ontem, que o PAC guarda uma diferença positiva fundamental entre iniciativas de governos anteriores: coloca o Estado na proa do esforço de desenvolvimento.
Emprego – Uma das críticas que a Central lançou ao PAC foi a ausência de metas oficiais de números de empregos com carteira assinada. “A série de medidas apresentadas pelo governo vão impulsionar o crescimento, sem dúvida, embora ainda seja difícil prever em que medida. Porém não há nenhuma garantia, sem a adoção de metas de geração de empregos, que serão criados postos de trabalho decentes, com direitos trabalhistas e perspectiva de melhora de vida do trabalhador”, afirma o presidente da CUT, Artur Henrique. “O que temos cobrado do governo é que metas oficiais de emprego sejam objeto da mesma obsessão até agora empenhada pelo controle da inflação”.
A tônica dos comentários da CUT é a defesa do desenvolvimento com distribuição de renda, o que só é possível se o crescimento colocar o trabalho como questão primordial do projeto brasileiro. “Crescimento todos queremos, mas não qualquer tipo de crescimento”, afirma Artur.
Evidente também ficou a falta do conceito de contrapartidas sociais – compromisso formal, cujo desrespeito fica sujeito a sanções econômicas, de manutenção e geração de postos de trabalho, investimento na formação e valorização do trabalhador – para os empréstimos públicos em investimentos privados. “Reivindicamos que facilidades, isenções e empréstimos estatais estejam vinculados à geração de empregos de qualidade”, segundo o presidente da CUT.
Servidores – Um ponto de alto potencial explosivo é a limitação proposta para os gastos com a folha de pagamento da União. “Esse é um tema importante para a CUT e que jamais deveria ter sido objeto de um ‘pacote’ governamental. Existe uma mesa de negociação permanente com os trabalhadores públicos, construída com muito esforço, que deveria ter sido consultada”, analisa Artur.
A CUT, segundo o presidente, vai mobilizar as entidades do funcionalismo para organizar uma mobilização conjunta que pressione o Congresso Nacional a alterar o projeto de lei complementar preparado pelo governo para tratar do tema.
A proposta preserva os acordos firmados até o ano passado e garante aumento real para os próximos quatro anos, mas por outro lado, ao limitar os gastos da folha na ordem de IPCA + 1,5% , ameaça a contratação de novos trabalhadores, indispensáveis para o fortalecimento e qualificação do serviço público. No entanto, há a garantia de que a substituição de trabalhadores terceirizados por trabalhadores concursados não entrará nos cálculos da limitação. O princípio que norteia este aspecto da proposta, que pode ser chamado de “primarização”, deve ser valorizado e ampliado.
Direitos preservados – O secretário-geral da CUT, Quintino Severo, destaca que, pela primeira vez em décadas, um conjunto de propostas de governo não pretende retirar direitos. "Não há reforma trabalhista em pauta, nem algo parecido. Para nós, isso é extremamente importante”, diz.
Em busca de polêmica, a mídia destacou a criação do fundo de investimento em infra-estrutura com recursos do FGTS. Enquanto a Força Sindical (que havia aprovado a idéia no Conselho Curador do FGTS) promete entrar com ação no STF contra a medida, a CUT considera que utilizar recursos do fundo em projetos que criam emprego, ao invés de só alocá-los na ciranda financeira, como ocorre hoje, é positivo, desde que:
– a remuneração mínima seja garantida nos níveis atuais, de TR + 3%
– que os investimentos oriundos desse fundo tenham a garantia de contrapartidas sociais
– que a gestão dos recursos, incluindo a decisão de seu destino, tenha a participação decisiva dos trabalhadores.
Ao final da discussão desta tarde, o Portal do Mundo do Trabalho trará novas informações. Todo o nosso debate sobre o PAC está fundamentado no documento Propostas da CUT para o desenvolvimento com distribuição de renda, veja documento abaixo:
PROPOSTAS DA CUT PARA O DESENVOLVIMENTO COM DISTRIBUIÇÃO DE RENDA
Apresentação
A Central Única dos Trabalhadores – CUT defende um modelo de desenvolvimento sustentável que articule políticas de crescimento econômico e valorização do trabalho com políticas de distribuição de renda, geração de emprego e democratização das relações de trabalho.
A CUT compreende que a construção de um Brasil soberano, justo e desenvolvido, passa necessariamente pelo fortalecimento da democracia e dos movimentos sociais. Assim, apresentou ao então candidato Lula uma Plataforma que expressa as necessidades da classe trabalhadora do nosso país e aponta elementos essenciais para a construção de um novo Brasil. Essa Plataforma Democrática da Classe Trabalhadora se assenta sob quatro eixos essenciais, que são:
· Um Projeto Nacional para a justiça social e a soberania nacional;
· Pelo Desenvolvimento com Distribuição de Renda;
· Por mais Democracia e organização do Estado no Brasil;
· Mais Direitos para o Povo.
As propostas aqui apresentadas são um conjunto de iniciativas que – reconhecendo e tendo como ponto de partida os avanços já conquistados sob o primeiro mandato do governo Lula – destravem os impasses e alavanquem novas conquistas para a classe trabalhadora brasileira. Trata-se de uma contribuição para o enfrentamento da exclusão social, expresso principalmente pelo desemprego e pela concentração da renda.
Propostas
1. Ampla reforma política democrática:
· instituição e utilização regular de mecanismos de democracia direta como plebiscitos, consultas e referendos
· garantia de liberdade de organização e funcionamento institucional e parlamentar aos Partidos Políticos
· contra a cláusula de barreira
· instituição de financiamento público das campanhas eleitorais.
· instituição da fidelidade partidária
2. Implementação de uma política de redução do superávit fiscal e das taxas de juros para ampliar o crescimento econômico e garantir distribuição de renda;
3. Ampliação e democratização do Conselho Monetário Nacional, incluindo representantes dos trabalhadores e trabalhadoras e de outros setores produtivos;
4. Estabelecimento de meta anual de crescimento e emprego (com a mesma importância e centralidade das metas de inflação para as políticas governamentais);
5. Reforma tributária que institua o Imposto sobre Grandes fortunas e Heranças e que elimine a guerra fiscal entre estados e municípios;
6. Substituição da incidência da contribuição patronal para o INSS da folha de pagamento para o faturamento das empresas;
7. Ampliação dos investimentos em infra-estrutura (energia, portos, estradas, linhas ferroviárias e hídricas), saneamento básico, transporte público e habitação popular em consonância com a preservação ambiental:
· Criação de novas linhas de crédito pelos bancos públicos, com o estabelecimento de contrapartidas sociais
· Discussão sobre o papel dos Fundos de Pensão e contrapartidas sociais
· Revisão a lei das Parcerias Público-Privadas (PPP’s), estabelecendo regras de transparência, com controle social
· Revisão da Lei de Responsabilidade Fiscal (LRF)
8. Desenvolvimento de um amplo programa de construção de moradias populares que inclua nas regras de utilização do FGTS acesso para a modalidade de auto-construção;
9. Implementação de Política de Valorização dos serviços e servidores públicos:
· Retirada das áreas sociais da Desvinculação das Receitas da União (DRU), como por exemplo educação e seguridade social
· Consolidação da negociação coletiva, através de lei (já debatida na Câmara Setorial do Serviço Público, no âmbito do Fórum Nacional do Trabalho)
· Definição de Plano de Cargo, Carreira e Salários para os trabalhadores do setor público
· Acesso e ingresso na Administração Pública apenas por concurso público
· Garantia de reposição de pessoal nas vagas existentes
10. Garantia de mais recursos para as políticas sociais no orçamento da União:
· Estabelecimento de metas para implantação de equipamentos sociais (creches, educação infantil, entre outras)
· Adoção do orçamento participativo (plano plurianual, lei de diretrizes orçamentárias e orçamento público)
11. Fortalecimento dos instrumentos estatais de promoção e financiamento do desenvolvimento;
12. Não privatização das empresas estatais e anulação do leilão de privatização da Vale do Rio Doce;
13. Garantia do desenvolvimento rural sustentável com a aceleração da Reforma Agrária que propicie a democratização da terra e o fortalecimento da agricultura familiar, com a ampliação de assentamentos, distribuição de terras com apoio técnico e financiamento subsidiado à agroindústria cooperativada para a pequena propriedade e incremento da política de apoio à agricultura familiar;
14. Criação de linhas de financiamento mais adequadas às cooperativas autênticas e nova regulamentação para esses tipos de empreendimentos (economia solidária);
15. Criação de novas linhas de financiamento e redução da burocracia na intermediação financeira para pequenas e médias empresas no Banco Nacional de Desenvolvimento Econômico e Social – BNDES, com contrapartidas sociais;
16. Combate ao trabalho escravo, infantil e todas as formas de discriminação através de políticas ativas do Estado, em conjunto com as demais representações da sociedade civil;
17. Combate ao trabalho informal e ao processo de precarização do trabalho via terceirizações, através do fortalecimento dos instrumentos de fiscalização;
18. Programas de transferência de renda, com foco na inclusão no mundo do trabalho, através de aprendizagem prática + capacitação profissional e escolarização + orientação para reinserção ao trabalho, valorizando as diversidades regionais;
19. Rigor na preservação do meio ambiente e da biodiversidade, que resguarde a soberania sobre a Amazônia brasileira.
20. Constituição de um novo formato e papel para o Conselho de Desenvolvimento Econômico e Social equilibrando a participação popular para torná-lo um real instrumento de aconselhamento da Presidência da República;
21. Democratização das Relações de Trabalho com o reconhecimento legal das Centrais Sindicais, garantia de organização no local de trabalho e implementação de mecanismos/legislação que coíbam as práticas anti-sindicais;
22. Instituição de nova forma de funcionamento dos Fóruns de Competitividade tornando-os efetivamente espaços de negociação das políticas setoriais, envolvendo governo, representação dos trabalhadores(as) e empresários;
23. Revisão do funcionamento dos diversos conselhos tripartites transformando-os em espaços efetivos de formulação, deliberação, negociação e execução;
24. Envio ao Congresso de legislação que estabeleça a negociação coletiva quando forem introduzidas novas tecnologias que alterem o ritmo de trabalho.
25. Aprovação de Projeto de Lei que limite as horas extras, substituindo o artigo 59 da CLT;
26. Redução da jornada de trabalho sem redução de salários (de 44 horas para 40 horas semanais);
O compromisso e a responsabilidade da CUT é com a representação e defesa dos interesses dos trabalhadores e trabalhadoras brasileiras e com a construção de uma sociedade mais justa, centrada na valorização do trabalho e no desenvolvimento sustentável e solidário. Tendo clareza de seu papel assume uma postura ativa de contribuição na definição do nosso futuro.
Direção Executiva da Central Única dos Trabalhadores – CUT
Janeiro de 2007
Fonte: CUT