Crise no Egito atrapalha captações e eleva spreads de risco de crédito

Valor Econômico
Cristiane Perini Lucchesi

A crise no Egito, que se agravou nesta semana, elevou os spreads de risco de crédito de países emergentes e fez com que empresas adiassem emissões de títulos de dívida externa. O mercado não está fechado, mas ficou mais estreito e caro e as companhias que não têm urgência para captar recursos preferiram esperar por um momento de maior calmaria dos investidores.

A Braskem resolveu não lançar neste momento seus eurobônus denominados em euro, segundo o mercado. A empresa visitou investidores na Europa, mas percebeu uma maior volatilidade e resolveu esperar. A Cyrela, que planeja emitir títulos perpétuos (sem vencimento final), também evitou colocação nesta semana. A área de relações com investidores da Cyrela disse desconhecer a transação, que ainda deve envolver neste momento só o departamento financeiro da empresa.

Não só no Brasil as companhias se recolheram desde meados de janeiro, mas em todos os mercados emergentes. A Gulf General, companhia de Dubai, adiou emissão de US$ 300 milhões, por causa das condições menos favoráveis do mercado durante esta semana. A empresa mexicana de construção ICA, que ia tentar lançar perpétuos, acabou emitindo títulos de vencimento em dez anos, no total de US$ 400 milhões, e pagou taxas de juros polpudas ao investidor, de mais de 9,125% ao ano.

O banco brasileiro BVA, que planejava lançar até US$ 150 milhões em títulos de vencimento em três anos, segundo o mercado, emitiu US$ 45 milhões e com juros de 9,125% ao ano. Mesmo o Itaú Unibanco, que é grau de investimento, preferiu pagar menos do que ampliar o volume e levantou US$ 250 milhões em papéis de dívida subordinada, que entram como capital no balanço da instituição financeira, durante a semana passada. Os especialistas recomendam que o governo do Brasil espere um momento de maior tranquilidade para emitir no exterior, principalmente se forem bônus em reais.

O First Citizens, de Trinidad e Tobago, captou US$ 175 milhões, o que também foi considerado pouco pelos analistas. O rendimento foi de 4,903% ao ano e o prazo, de cinco anos. “Obviamente que o Egito não ajudou, mas eu já esperava uma semana mais calma, por conta do feriado do final de ano na China que reduz muito a demanda da Ásia”, diz Michael Schoen, diretor responsável pela área de mercado de capital de dívida do Credit Suisse para a América Latina.

Ele lembra que os números sobre a atividade econômica americana têm surpreendido positivamente e os temores de inflação têm crescido, o que eleva os rendimentos dos títulos do Tesouro americano, referência no mercado de renda fixa no mundo todo. Sobre esses rendimentos é que recaem os spreads de risco-país e os spreads de risco de cada empresa. Os juros dos papéis de vencimento em 30 anos passaram de 4,335% ao ano no final do ano passado para 4,6214% ao ano anteontem. O risco-Brasil (do CDS de cinco anos) chegou a bater em 121 pontos básicos, alta de 16% em relação ao menor nível do ano. O risco-Egito chegou a atingir 429,865 pontos, alta de mais de 80% no ano.

A quinzena foi fraca em captações também por causa do excesso de oferta, principalmente entre os bancos brasileiros. Desde o início do ano, Santander, Bradesco, Safra, Daycoval, Cruzeiro do Sul, BVA, Itaú Unibanco e Banco do Brasil já lançaram títulos no mercado externo em 2011, no total que chega a US$ 3,645 bilhões.

“Os investidores estão mais cauteloso, com os portfólios cheios e, portanto, com caixa mais baixo disponível para novos investimentos”, comenta Andre Silva, responsável da área de renda fixa para América Latina do Deutsche Bank.

“Eu vi algumas transações de emergentes e de bancos europeus sendo adiadas, na expectativa de maior estabilidade”, diz Alexei Remizov, responsável pela área de renda fixa para Brasil do HSBC Securities. “Mas não vi um cancelamento massivo de transações por enquanto”, afirma.

Os analistas comentam que também do ponto de vista do calendário dos balanços o momento não é favorável para emissões.

Schoen lembra que a situação do Egito é bem diferente de crises financeiras como as da Ásia, em 97, da Rússia, em 98, ou outras crises de dívida externa de países. “Hoje, temos uma disputa política, mas os compromissos de dívida continuam sendo cumpridos”, lembra. O Egito tem um total de US$ 46,6 bilhões vencendo neste ano, a maior parte dívida interna, segundo a “Bloomberg”. De papéis da dívida externa, os vencimentos mais próximos são de US$ 1 bilhão em julho. Hoje, o que mais preocupa é a crise política se agravar e abalar a estabilidade da região, inclusive nos países que são grandes produtores de petróleo.

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