Conselheiros, incluindo Bradesco, ganham até duas vezes mais que executivos

Denise Carvalho e Fernando
Valor Econômico

Profissionais que fazem parte do conselho de administração de um grupo de companhias, que inclui OGX, MPX, Bradesco, banco Cruzeiro do Sul e Ambev, tiveram uma remuneração de fazer inveja aos executivos mais bem pagos do país.

Um levantamento feito pelo Valor com dados de 189 empresas disponíveis no site da Comissão de Valores Mobiliários (CVM) mostra que, em alguns casos, a bolada individual dos conselheiros representou o dobro da maior remuneração paga nas diretorias das empresas nas quais trabalham e até dez vezes mais que o pagamento médio feito aos seus pares do conselho. Nesse grupo, pagamentos de conselheiros estão perto R$ 1 milhão por ano, mas podem superar R$ 10 milhões.

A pesquisa inclui as maiores companhias de capital aberto do país que divulgaram dados sobre remuneração até 15 de abril. Não entraram na amostra as 39 empresas, como Itaú e Vale, que usam uma liminar para não revelar parte dos números, sob o argumento de que a publicação coloca em risco a segurança dos executivos. A CVM passou a exigir, a partir de 2010, a publicação da remuneração máxima, média e mínima dos administradores das empresas no chamado Formulário de Referência.

A decisão foi resultado do embate entre a autarquia e as empresas, que preservou em parte os profissionais ao mesmo tempo que permitiu aos acionistas identificar eventuais distorções.

Para profissionais especializados em contratação de administradores de alto escalão ouvidos pelo Valor, a remuneração milionária destoa do valor praticado pelas empresas de mesmo porte – algo entre R$ 30 mil e R$ 35 mil por mês, ou cerca de R$ 400 mil por ano.

“A remuneração de R$ 400 mil é paga a profissionais proeminentes, que podem ter ocupado cargos de prestígio em grandes empresas e no governo”, diz o headhunter Dárcio Crespi, sócio da Heidrick & Struggles.

“O bom senso diz que a remuneração do conselheiro deve ser proporcional ao tempo dedicado à empresa. Por isso, sua remuneração nunca deve ser maior que a do principal executivo”, diz o consultor Antônio Carlos Martins, especializado em recrutamento de administradores.

Todas as empresas mencionadas no quadro foram procuradas. Bradesco, Ambev, Randon, Bombril, Tractebel e Usiminas não quiseram comentar.

OGX e MPX, controladas pelo empresário Eike Batista, pagaram R$ 50,1 milhões e R$ 6,8 milhões a conselheiros. As empresas informaram, porém, que esses valores não constituem remuneração da função de membro do conselho. Os valores foram pagos a um ex-executivo do grupo, que também era membro do conselho e exerceu a opção de vender ações concedidas por Eike Batista.

A maior remuneração do conselho do banco Cruzeiro do Sul, em 2010, foi R$ 5,2 milhões, 68% maior que a principal remuneração da diretoria, de R$ 3,1 milhões.

Em nota, o banco diz que adota as melhores práticas de governança e que seus colaboradores contribuem para os “ótimos resultados” da instituição. Segundo o Cruzeiro do Sul, “a justa remuneração a todos os funcionários, diretores e conselheiros é consequência de tudo isso”.

Na BM&FBovespa, a remuneração do presidente do conselho, Armínio Fraga, é de R$ 1,4 milhão por ano, quatro vezes maior que a média paga a seus pares. Segundo a assessoria da empresa, há um pagamento fixo adicional semestral, equivalente ao dobro do recebido no período. “O componente fixo tem por objetivo compensar adequadamente os conselheiros pela sua participação nas reuniões”, informa nota da companhia.

A remuneração adicional do presidente do conselho de administração é paga porque ele exerce um maior número de funções. Entre suas atribuições, Fraga desempenha, por exemplo, papel de representante institucional, além de presidir as reuniões do conselho e das assembleias de acionistas.

O que está por trás da polêmica recorrente que envolve salários é que as empresas que pagam esses valores em geral têm controladores e pessoas ligadas a ele no conselho. Para o especialista em governança Renato Chaves, essa situação é um “disparate”, uma vez que os controladores já recebem dividendos de acordo com sua fatia nas empresas.

“O artigo 109 da Lei das S.A. equipara todos os acionistas quanto à participação nos lucros sociais, de acordo com a classe de ação possuída. O pagamento de altos salários desvirtua essa relação.”

Na Gerdau, por exemplo, quatro dos sete conselheiros remunerados são da família controladora. O pagamento médio dos membros do conselho somou R$ 4,6 milhões em 2010. Outros dois integrantes comuns ao conselho e à diretoria foram remunerados apenas como diretores. Em dividendos, o bloco de controle recebeu R$ 57 milhões no ano passado.

Por meio da assessoria, a Gerdau diz que a diferença entre a remuneração do conselho e da diretoria é decorrente da forma de reporte dos números à CVM. “A CVM exige que seja informada apenas a remuneração da diretoria estatutária, no entanto, a empresa possui outros 65 diretores não estatutários, cujo valor não faz parte do Formulário de Referência.”

As empresas têm incorporado uma parte de remuneração variável aos salários dos conselheiros, que vai na contramão do que recomenda o Instituto Brasileiro de Governança Corporativa (IBGC).

Porém, há quem defenda a remuneração com mais de sete dígitos para conselheiros, mesmo que sejam controladores.

Leonardo Salgado, diretor da empresa especializada em remuneração Hay Group, defende que os conselheiros tenham pagamento até maior que o de executivos, dependendo da responsabilidade.

“Em muitas empresas familiares, o papel do conselho não se resume a opinar e cobrar o cumprimento de metas dos executivos. Mas, principalmente, definir os rumos, como movimentos de fusões e aquisições”, diz Salgado. “Não raro, suas responsabilidades são maiores que as dos executivos.”

Aos olhos dos investidores, porém, a preocupação nem sempre é o tamanho do salário. A atuação ativa dos controladores no conselho pode disfarçar, por exemplo, a dificuldade dos fundadores de sair do negócio. “Além de desmotivar a contratação de executivos, essa atuação pode ser um sinal de que a empresa não tem projeto de sucessão”, diz Isabella Saboya, sócia do Jardim Botânico Investimentos.

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