A estabilidade monetária é uma conquista importante, mas o país não pode prescindir do crescimento e da distribuição da renda, afirma o Departamento Intersindical de Estatística e Estudos Socioeconômicos (Dieese), em nota técnica sobre a inflação divulgada na terça-feira (10). “Uma política de combate à inflação que ignore a necessidade de crescimento, distribuição de renda, elevação do emprego e dos salários no Brasil pode pôr em risco os avanços conquistados no período recente”, diz o instituto.
Na análise, o Dieese observa que as causas da recente elevação da inflação não estão claramente determinadas. “Há um conjunto de situações que, de uma forma ou de outra, pressiona para cima o nível geral de preços.”
Entre esses fatores, estão alimentos, commodities, aquecimento da demanda, oligopólios, tarifas públicas, preços administrados, inflação mundial e as próprias expectativas criadas no mercado. Assim, os técnicos chamam a atenção para o que chamam de alarmismo, estimulado por alguns dos chamados formadores de opinião.
“A exacerbação, às vezes por motivos inconfessáveis, da importância de variações sazonais de alguns preços também ajuda a criar expectativas negativas em relação ao comportamento futuro da economia. Na esteira desse alarmismo, setores formadores de opinião propugnam, em defesa da estabilização, o aumento das taxas de juros, o que, neste instante, só beneficiará os rentistas e o setor financeiro.”
Esses mesmos setores, acrescenta o Dieese, apontam os reajustes salariais como causa de aceleração da inflação. “Para justificar tal argumento, utilizam a produtividade do trabalho como referência para a concessão de aumentos salariais, sem se ter claro como medir essa produtividade”, critica a nota.
O Dieese lembra ainda que a arrecadação de impostos tem aumentado. As principais causas dessa elevação são o recolhimento do PIS/Cofins e do Imposto de Renda da Pessoa Jurídica (IRPJ). O primeiro indica o aumento de faturamento, enquanto o segundo significa aumento de lucro.
Em um país de forte memória inflacionária, é importante não descuidar do combate à inflação, “especialmente em períodos de aceleração”, defende o Dieese. “A terapia de enfrentamento, contudo, não pode prescindir de amplo diagnóstico que incorpore objetivos mais abrangentes relacionados ao desenvolvimento do país.”
O instituto sustenta que o aumento de preços não está, necessariamente, vinculado aos salários. “Não há dúvidas de que a demanda cresceu nos últimos anos e tem influência sobre a elevação dos preços nos últimos meses”, reconhece. Mas os técnicos consideram que o consumo das famílias tem crescido em ritmo próximo a do Produto Interno Bruto (PIB).
Os gastos das famílias são o principal componente da demanda agregada, e realmente são mais sensíveis às variações salariais. Mas despesas do governo e investimentos, outras duas categorias que compõem a “absorção interna”, têm mostrado crescimento a uma velocidade maior que os gastos das famílias, segundo a nota.
Com maior demanda por mão de obra, é normal que os salários cresçam, lembra o Dieese. “Apesar de as empresas entenderem que o ritmo de crescimento da produtividade é inferior ao dos salários desde 2010, desconsideram os expressivos ganhos de produtividade ocorridos desde 1990. As negociações coletivas, por sua vez, sempre buscam manter o poder de compra dos salários entre as datas base e incorporar aumentos de produtividade já apropriados pelas empresas. Em outras palavras, as negociações não projetam o futuro, mas apenas tentam recuperar algo consolidado no passado, ganhos já auferidos pelas empresas.”
Os técnicos do instituto citam outros custos relacionados à atividade empresarial “que superam em larga medida a falsa questão dos aumentos salariais”. Entre esses custos, estão taxas de juros, câmbio, logística, estrutura tributária, preços de commodities, tarifas indexadas de energia elétrica e telecomunicações. Fatores que afetam a competitividade das empresas. “Nesse sentido, há uma enorme variedade de ajustes a serem feitos antes de se chegar aos salários.”