Com dossiê da terceirização, CUT retoma pressão no Congresso Nacional

Documento é lançado na Câmara e CUT avisa que fará vigília pelos direitos

Em dezembro de 2013, os trabalhadores terceirizados recebiam 24,7% a menos que os contratados diretos realizavam uma jornada semanal de 3 horas a mais e eram as maiores vítimas de acidentes de trabalho: no setor elétrico, segundo levantamento da Fundação Comitê de Gestão Empresarial (COGE), os trabalhadores morreram 3,4 vezes mais do que os efetivos nas distribuidoras, geradoras e transmissoras da área de energia elétrica.

Com base nesses dados retirados do dossiê “Terceirização e Desenvolvimento: uma conta que não fecha”, é fácil perceber que a ampliação desse modelo de contratação, como querem muitos empresários, representa uma tragédia social para o Brasil e para um segmento formado por 12,7 milhões de trabalhadores, o equivalente a 6,8% do mercado de trabalho.

O documento produzido pela CUT, em parceira com o Dieese (Departamento Intersindical de Estatística e Estudos Socioeconômicos), foi lançado nesta terça (3), no Salão Nobre da Câmara dos Deputados, e é uma atualização do material que a Central divulgou em 2011.

O evento contou com a participação do presidente da Contraf-CUT, Carlos Cordeiro, do secretário de Organização do Ramo Financeiro, Miguel Pereira, e de vários dirigentes da entidade e de sindicatos e federações de bancários.

Trabalho escravo

Além de reforçar as denúncias presentes no conteúdo do dossiê de dois anos atrás, esta nova versão aponta ainda a intimidade entre a terceirização e o trabalho escravo.

Segundo o pesquisador do Centro de Estudos Sindicais e Economia do Trabalho (CESIT) da Unicamp Vitor Filgueiras, “dos 10 maiores resgates de trabalhadores em condições análogas à de escravos no Brasil entre 2010 e 2013, em 90% dos flagrantes, os trabalhadores vitimados eram terceirizados.”

Secretária de Relações do Trabalho da Central, Maria das Graças Costa, afirmou que o material pretende ajudar a municiar a luta contra a terceirização sem limites e demonstrar aos parlamentares, à imprensa e ao Judiciário que o movimento sindical voltará ao ringue.

“A partir de agora, retomaremos a mobilização no Congresso para apontar que não estamos de brincadeira e não admitiremos o trabalho degradante como o preço do crescimento ou de ajustes”, apontou.

A pressão chega num momento em que o tema ressurge no parlamento. A pedido do empresário e deputado federal Laércio Oliveira (SD-SE), o Projeto de Lei 4330/2004, de autoria do também empresário e ex-deputado Sandro Mabel (PMDB-GO), foi desarquivado. O texto permite a terceirização em todos os setores da empresa, inclusive na atividade-fim, a principal, e o presidente da Câmara, Eduardo Cunha (PMDB-RJ), já afirmou que colocará o texto em votação no próximo mês.

No Senado, a bancada do PSDB também pediu o desarquivamento do Projeto de Lei (PLS) 87/2010, com conteúdo semelhante.

PL 4330 nas mobilizações do dia 13

Diante desse cenário, o secretário-geral da CUT, Sérgio Nobre, afirmou que as centrais farão vigília no parlamento semanalmente para que o PL 4330 seja retirado da pauta e a regulamentação da terceirização seja precedida de um debate.

“Queremos uma regulamentação que proteja o trabalhador e nivele os direitos entre terceirizados e contratados direitos. Não o contrário”, falou, reforçando que a pauta estará também nas mobilizações nacionais convocadas pela Central para o dia 13 de março em defesa da Petrobras, da democracia e dos direitos trabalhistas.

Cenário exige pressão constante

Ao lado dos dirigentes da CUT, parlamentares e lideranças de outras centrais também marcaram presença no lançamento do dossiê e enalteceram o papel do movimento sindical perante um cenário majoritariamente conservador.

“Sabemos que a correlação de forças no plenário para a votação não deixam as coisas fáceis, mas seja um deputado com maior ou menor financiamento empresarial, ninguém se elege sem o voto dos trabalhadores. O quadro pode ser desfavorável do ponto de vista da representação, mas os mecanismos de contato direto da sociedade são capazes de barrar propostas que em nada garantirão melhores condições aos trabalhadores”, ressaltou o deputado Glauber Braga (PSB-RJ).

A deputada Erika Kokay (PT-DF) lembrou do projeto de lei (PL 5.483/01) enviado pelo ex-presidente Fernando Henrique Cardoso ao Congresso no final de seu mandato, e arquivado pelo presidente Lula por flexibilizar a legislação trabalhista, para resgatar a importância da Central.

“Foi a pressão da CUT que não deixou vingar o negociado pelo legislado. Agora, estamos aqui para retomar a luta vitoriosa na legislatura passada contra o PL 4330, que virou um guarda-chuva para pisotear todos os projetos que resguardam os direitos dos trabalhadores terceirizados”, defendeu.

Entre essas propostas está o PL 1621/2007, elaborado pela CUT e encampado pelo deputado Vicentinho (PT-SP) e traz pontos caros à Central como a igualdade de direitos entre terceirizados e efetivos, a proibição da terceirização na atividade-fim e a responsabilização da empresa tomadora de serviços, quando a terceirizada deixar de cumprir suas obrigações.

“Precisamos cobrar os parlamentares em seus estados para que se sintam vigiados. Se deixarmos para decidirem aqui, sob o ar-condicionado do Congresso, corremos o risco de nosso projeto ser destruído, assim como nossos direitos”, alertou.

Do outro lado, o Judiciário

Pela manhã, o Grupo de Trabalho Jurídico formado pela CUT e outras entidades que integram o Fórum em Defesa dos Trabalhadores Ameaçados pela Terceirização, reuniu-se no escritório da Central em Brasília para discutir o atual cenário.

No Supremo Tribunal Federal (STF), tramitam três ações sobre o tema. A primeira, a repercussão geral ao processo da empresa Cenibra (Celulose Nipo Brasileira), foi declarada pelo ministro Luiz Fux após ter sido negada.

Neste caso, a Cenibra foi condenada a pagar R$ 2 milhões em uma ação civil pública do Ministério do Trabalho, em 2006, por terceirizar toda a cadeia produtiva, inclusive a atividade-fim, medida considerada ilegal no país.

Com a repercussão geral não é mais a questão específica da companhia que está em julgamento, mas sim se a terceirização da atividade-fim será permitida.Pela manhã, advogados indicaram que melhor caminho para a classe trabalhadora é a regulamentação ser feita pelo parlamento Pela manhã, advogados indicaram que melhor caminho para a classe trabalhadora é a regulamentação ser feita pelo parlamento

O Supremo deverá julgar a Ação de Descumprimento de Preceito Fundamental (ADPF) 324, da Associação Brasileira do Agronegócio (Abag), e o Agravo de Recurso Extraordinário (ARE) 791.932, de empresas de telecomunicações sobre a terceirização de call centers. Apesar do nome complexo, a alegação de ambos os processos é bem simples: restringir a terceirização é limitar a liberdade de contratação.

Além de ingressar com amicus curiae – um pedido para contribuir com informações para o julgamento – no julgamento da Cenibra e preparar intervenção junto à ADPF, por serem os casos mais próximos da decisão, CUT, Força Sindical, Nova Central e CTB também cobram do ministro Fux a realização de uma audiência pública.

Ruim para o consumidor

Diante de um tribunal que não tem o viés trabalhista, como é o caso do STF, o Secretário de Administração e Finanças da Central, Quintino Severo, acredita que a CUT e as demais centrais devam levar também ao julgamento fatores que afetem diretamente o cidadão.

“O tema da terceirização não está voltado somente aos trabalhadores afetados. O que vem se apresentando na sociedade é a menor condição de oferta da qualidade de serviços e, mesmo com salário menores, o custo mais baixo da produção não é repassado ao consumidor. Outra questão é a corrupção. Acredito que se não houvesse tanta terceirização na Petrobras, certamente não teria havido um processo tão grande de corrupção. Se ela contratasse os seus trabalhadores não teria acontecido o que aconteceu”, afirmou.

Para Quintino, a CUT precisa retomar o processo de articulação com o Executivo, o Legislativo e o empresariado com vistas a reconstruir a mesa de negociação quadripartite que discutiu o PL 4330. “Precisamos envolver vários atores que podem contribuir nesse debate, Ministério Público, o TST (Tribunal Superior do Trabalho), mas não tenho duvida que o campo para discussão seja o parlamento”.

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