Agências internacionais
Valor Econômico
Os espanhóis, alarmados com a situação terrível de seus bancos, estão transferindo dinheiro para fora do país no ritmo mais acelerado desde que esses registros começaram a ser feitos, segundo mostram números divulgados ontem.
A Espanha é o próximo país na linha de tiro da crise da dívida da zona do euro, com regiões perdulárias e bancos abalados ameaçando abrir um rombo nas finanças do governo e levando os custos dos financiamentos a níveis que sinalizam a necessidade de socorro.
A Comissão Europeia chegou a oferecer um auxílio direto de um fundo de resgate da zona do euro para recapitalizar os bancos espanhóis e proporcionar mais tempo para o governo reduzir seu déficit fiscal. Isso ajudou a diminuir, ontem, o prêmio de risco que os investidores estão exigindo para manter em carteira os títulos de dívida de dez anos da Espanha, em vez dos títulos referenciais alemães, mas ele continuou perto do recorde da era do euro, de 520 pontos-base.
Dados do Banco da Espanha, o banco central, mostraram que um total líquido de 66,2 bilhões de euros foram enviados para fora do país em março, o maior número desde que os registros começaram em 1990. O número compara-se a uma entrada líquida de 5,4 bilhões de euros em março de 2011. No ano, as saídas esbarram nos ? 100 bilhões.
Os espanhóis estão preocupados com a saúde de seus bancos, abalados pela exposição que eles têm ao crash imobiliário de 2008, e estão enviando dinheiro para contas de depósito a prazo em economias mais fortes do norte da Europa. O número sobre a fuga de capital antecede a nacionalização do quarto maior banco espanhol, o Bankia, em maio, quando ficou claro que ele não conseguiria arcar com perdas resultantes de investimentos ruins no setor imobiliário, que se combinaram com a recessão. Ou seja, o quadro mais recente pode ser ainda pior, mas ainda não há dados disponíveis.
O governo de centro-direita da Espanha contratou auditores independentes para avaliar a saúde de seu sistema financeiro, num esforço para restabelecer a confiança em seus bancos. A Espanha precisa apresentar seus planos de reestruturação do Bankia para a Comissão Europeia, segundo disse ontem um porta-voz do braço executivo da União Europeia. Ele acrescentou que uma solução doméstica para a crise bancária do país seria melhor que um resgate pela UE.
Algumas fontes em Madri estimam que o total necessário para resgatar os bancos com problemas hoje seria de 50 bilhões de euros, incluindo os 19 bilhões de euros para o Bankia e recursos para outras “cajas”. A questão é de onde virá o dinheiro.
Ontem, rumores de que o departamento europeu do Fundo Monetário Internacional (FMI) iniciou discussões sobre um plano de resgate para a Espanha trouxeram alento aos mercados. No entanto, a diretora-gerente do FMI, Christine Lagarde, negou a existência de um plano de assistência para a Espanha, depois de se reunir com a vice-presidente do país, Soraya Sáen de Santamaría.
O Banco Central Europeu (BCE), por sua vez, aumentou a pressão por um sistema unificado de garantias para os depósitos bancários na zona do euro, afirmando que o continente precisa de novas ferramentas para enfrentar uma corrida bancária diante da crise de dívida.
O principal executivo da Comissão Europeia, Olli Rehn, alertou que a área da moeda comum pode se desintegrar sem mecanismos mais fortes de enfrentamento da crise e de disciplina fiscal mais firme.
O duplo alerta foi feito em um momento em que as preocupações sobre os bancos espanhóis e a sobrevivência da Grécia na zona do euro levaram a moeda comum para o menor nível em dois anos sobre o dólar, e provocaram uma corrida por ativos considerados mais seguros como os bônus franceses – que tiveram o rendimento de 10 anos caindo para a mínima desde a criação do euro.
Eleitores irlandeses parecem no caminho de aprovar em referendo um tratado vital de disciplina fiscal da Europa para continuar recebendo ajuda da UE. Mas a proximidade de uma segunda eleição geral na Grécia, no dia 17, gera inquietação.
O presidente do BCE, Mario Draghi, pediu que os líderes europeus esclareçam sua visão sobre a moeda única rapidamente, alertando o Parlamento Europeu de que o banco central não pode preencher o vácuo pela falta de decisões políticas. “Nós vamos evitar fuga de bancos solventes. O dinheiro dos clientes será protegido se construirmos esse fundo de garantia dos depósitos europeu. Isso vai assegurar que os clientes sejam protegidos”, disse Draghi, defendendo um sistema de supervisão e regulação bancária para a União Europeia.
A Alemanha, principal contribuinte da UE e que tem relutado em arriscar mais dinheiro de seus contribuintes em ajuda aos parceiros da zona do euro, até agora rejeitou tal mecanismo de garantia conjunta. A chanceler alemã, Angela Merkel, evitou comentar os pedidos de uma união bancária, mas disse que a Europa deveria estar preparada para considerar todas as opções para enfrentar a crise de dívida soberana. “Há passos de integração que exigirão mudanças no tratado. Nós não estamos neste estágio hoje, mas não há tabus”, afirmou a jornalistas.
Outra autoridade do BCE, Joerg Asmussen, membro do conselho executivo, afirmou em Frankfurt que os cerca de 25 bancos mais importantes na zona do euro deveriam ser supervisionados por um regulador supranacional, ao invés de autoridades somente nacionais.
Aos parlamentares, Draghi disse que a crise financeira “aprofundou a aversão ao risco de uma maneira dramática”. “Eu peço que todos os governantes tenham isso em mente, porque é melhor errar por excesso no começo do que por escassez”, afirmou Draghi, citando o fracasso de reguladores nacionais em avaliar corretamente as necessidades dos bancos Dexia e Bankia.
O tom dramático das autoridades da UE e do BCE aumentam a pressão para que a Alemanha retire sua oposição a medidas de socorro mais firmes, antes de uma reunião nos dias 28 e 29 de junho que pode ser o ponto de virada na crise da zona do euro.