Centrais combatem “midiocracia” e defendem “protagonismo do Estado”

Responsáveis de comunicação das centrais sindicais de vários países das Américas do Sul e Central estiveram reunidos na quarta-feira (23), em Montevidéu, para definir um plano de ação que potencialize as mobilizações pela democratização do setor e garantam a “efetiva liberdade de expressão, sequestrada da sociedade pelos grandes grupos e corporações midiáticas”.

De acordo com a CSA, criou-se na região uma “ditadura comandada por grandes grupos econômicos corporativos que dominam o latifúndio midiático”, poder que lhes proporciona “capacidade de incidir sobre os entornos políticos e sociais e influir no cotidiano dos trabalhadores e trabalhadoras”.

Frente à ação daninha de monopólios e oligopólios que controlam a comunicação do continente, “promovendo golpes de Estado, como na Venezuela e em Honduras”, ficou estabelecido que as entidades vão fortalecer a rede sindical e a articulação com meios comunitários, alternativos e populares para contribuir decisivamente nos “processos de mudanças legislativas” na matéria.

No evento que contou com apoio da Fundação Friedrich Ebert Stiftung (FES), dirigentes e assessores de comunicação sindical da Argentina, Brasil, Colômbia, Panamá, Paraguai, Peru e República Dominicana debateram com Gustavo Gomez, secretário nacional de Comunicações e assessor especial do presidente do Uruguai, José Mujica, e com o secretário geral da Confederação Sindical dos Trabalhadores das Américas (CSA), Víctor Báez, sobre a importância do movimento de “re-regulação” em curso na América Latina e o protagonismo dos movimentos sindical e social para combater o processo de concentração de meios e concentração de conteúdos.

CRUZAMENTO DE PROPRIEDADES

Conforme Gustavo, o fato é que os conglomerados de comunicação já não são empresas exclusivamente midiáticas, “pois há um cruzamento de propriedades com o latifúndio, empresas agropecuárias, transnacionais e bancos, que faz com que não defendam apenas a ideologia, mas os interesses econômicos bastante concretos dos seus proprietários”.

Na avaliação do especialista uruguaio, “há um cenário nefasto onde estão dadas algumas oportunidades” para o campo democrático-popular, citando explicitamente o fato de que a convergência digital possibilita um amplo debate com a sociedade a respeito da definição de novas regras para a ocupação dos novos espaços, “para que não se acabe reproduzindo o mesmo lixo, só que em alta definição”.

No caso da capital uruguaia, citou Gustavo, a tv digital está possibilitando que se garanta a existência de sete canais comerciais, sete públicos e sete comunitários. “Aproveitamos o fato de termos de fazer uma adaptação da lei às novas tecnologias para, a partir de um processo de ampla participação social, com muito diálogo com todos os setores, começarmos a regulação. Sem dúvida, com a nova lei houve um aprofundamento da liberdade de expressão com o surgimento de novos atores a partir da democratização do espectro. Agora está garantida a participação de emissoras comerciais, públicas e comunitárias, na base de um terço para cada, o que representa uma mudança na qualidade da correlação de forças”, avaliou.

Sem a ruptura com a brutal dominação e alienação exercidas pelos grandes meios, analisa, a disputa de fundo pela hegemonia da sociedade, com mudanças estruturais, “fica impossível”. Um presidente pode até manter-se no governo, declarou, “mas jamais poderá transformar a realidade”. Daí a necessidade do protagonismo dos movimentos sociais, não só para “empurrar os governos temerosos e vacilantes”, como para derrotar os governos “cúmplices” desta odiosa manipulação.

Para o secretário-geral da CSA, Victor Báez, o combate à hegemonia neoliberal e à “midiocracia” se dá a partir da ampliação das vozes e do fortalecimento dos direitos, com uma “nova ordem informativa”. Citando o caso europeu, “onde a mídia defende o arrocho de salários e a retirada de direitos sociais, enquanto cala sobre a necessidade de cobrar impostos dos ricos”, Victor denunciou a postura anti-democrática e anti-popular das corporações midiáticas.

“São essas corporações hoje o poder de fato, pois colocam e depõem governos conforme os seus interesses. Daí a relevância do nosso trabalho de comunicação, de ampliarmos o investimento neste setor estratégico na luta de ideias. Esta ação é fundamental para combatermos os desmandos do setor financeiro, cuja superexploração está tornando o mundo insustentável”, frisou.

Conforme o assessor de Comunicação da CSA, Alexandre Praça, o evento deu consequência às resoluções do II Congresso da entidade, realizado recentemente em Foz do Iguaçu. “A CSA apontou a comunicação como um espaço de disputa estratégica, de luta de ideias e do futuro das nossas democracias. Se a comunicação é um direito humano fundamental, deve ser exercido por toda a sociedade e não continuar sendo privilégio e propriedade de umas poucas famílias. Não podem existir direitos humanos sem a liberdade de palavra, de imprensa, de informação e expressão”, destacou.

MEIOS PÚBLICOS DE QUALIDADE

O encontro voltou a sublinhar o papel protagonista do Estado para garantir a liberdade de expressão de todos os atores e setores da sociedade, “assegurando as condições legais, tecnológicas e comunicativas para tanto”. “A luta pela democratização da comunicação faz parte também da reconstrução dos meios públicos de qualidade que foram diretamente atacados pela ofensiva neoliberal”, denuncia a resolução da CSA.

Entre os inúmeros exemplos de ações positivas em curso no período, foi citada a Lei de Meios da Argentina; os avanços obtidos pelo governo uruguaio na questão da TV Digital; o processo de efetivação do projeto de democratização no Equador e a mobilização do Fórum Nacional pela Democratização da Comunicação (FNDC) no Brasil, com reconhecida participação da Central Única dos Trabalhadores (CUT), que de forma ampla e plural, tem incorporado novos atores na mobilização por um novo marco regulatório que oxigene o setor, fazendo com que o governo saia da letargia.

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