Os governos federal, estaduais e municipais torraram entre janeiro e julho deste ano R$ 106,8 bilhões em pagamento de juros aos credores da dívida pública, valor superior ao orçamento da União para o ano inteiro nas áreas de saúde, educação e programas sociais, estimado em R$ 100,8 bilhões. Essa é a manchete do jornal O Estado de São Paulo desta quinta-feira 28.
“Esse é o resultado da política de juros altos do Banco Central. Os recursos dos impostos pagos pelo povo brasileiro, que deveriam ser alocados em políticas públicas, estão sendo desviados para enriquecer uma pequena parcela de detentores de títulos públicos. É uma transferência de renda que não pode continuar no Brasil”, critica Carlos Cordeiro, secretário-geral da Contraf/CUT.
O orçamento da União para o ano de 2008 é de R$ 52,5 bilhões na saúde, R$ 31,7 bilhões na educação e R$ 16,5 bilhões nos programas sociais, aí incluído o Bolsa Família.
Veja abaixo a matéria completa do Estadão.
Governo paga R$ 106,8 bi em juros
Fernando Nakagawa e Fabio Graner
Os governos municipais, estaduais e federal já pagaram este ano mais de R$ 100 bilhões em juros aos credores da dívida pública. Dados apresentados ontem pelo Banco Central mostram que essa despesa somou R$ 106,803 bilhões de janeiro a julho, com alta de 14,9% ante igual período de 2007, novo recorde. Já o esforço fiscal para pagar os juros – chamado superávit primário – também bateu recorde, refletindo a arrecadação de impostos, que não pára de crescer.
Apesar disso, o gasto com juros ainda foi maior que a receita, o que provocou déficit nominal – indicador a que o governo pretende dar mais ênfase a partir de 2010. O ministro da Fazenda, Guido Mantega, trabalha com a possibilidade de superávit nominal daqui a dois anos. Em sete meses deste ano, no entanto, o resultado nominal foi negativo em R$ 8,579 bilhões. Mesmo assim, o déficit acumulado no ano foi 35% menor do que de janeiro a julho do ano passado e o mais baixo nesse período desde 1993.
A receita em alta também permitiu a queda do déficit nominal em períodos de 12 meses. De 2,06% do Produto Interno Bruto (PIB) até julho de 2007, ele caiu para 1,94% no mês passado.
A despesa recorde de juros pagos aos bancos e investidores é explicada por vários fatores, segundo o chefe do Departamento Econômico do BC, Altamir Lopes. Um deles é a alta da inflação, que eleva a despesa nos papéis corrigidos por indicadores de preço. Nos sete meses de 2008, o pagamento nos títulos atrelados ao Índice de Preços ao Consumidor Amplo (IPCA) passou de R$ 22 bilhões, quase igual à despesa de todo o ano passado (R$ 24,7 bilhões).
Outra explicação vem da taxa básica de juros (Selic). Com o aperto monetário iniciado em abril, o custo dos papéis que seguem a Selic sobe. No início do ano, a despesa mensal com esses títulos era de cerca de R$ 5 bilhões. Em julho, já estava em R$ 7,7 bilhões. Também pesam nessa conta o aumento do estoque da dívida e a oscilação cambial, segundo Altamir.
Mas a despesa recorde com juros tem sido compensada, pelo menos em parte, pelo esforço fiscal do setor público. Em sete meses, a economia para pagar os juros atingiu R$ 98,225 bilhões, 23,4% mais que igual período de 2007. Em 12 meses, o valor corresponde a 4,38% do PIB, ligeiramente acima da meta de 4,30% para o ano – quando se incluem os recursos para o Fundo Soberano do Brasil (FSB). Diante do quadro, Altamir disse ser “factível” cumprir a meta de superávit primário no ano.
O economista-chefe da LCA Consultores, Bráulio Borges, destaca o papel da arrecadação no bom desempenho do setor público. “A arrecadação continua forte no Imposto de Renda e no Imposto de Importação. Além disso, a Previdência tem apresentado números bons e Estados e municípios têm gastado menos devido às restrições da lei eleitoral.”