Valor Econômico
Fernando Travaglini, de Brasília
Os grandes bancos retomaram neste ano uma antiga prática de mercado para aumentar seus estoques de crédito e que havia sido resfriada pela crise financeira detonada em 2008: a compra de carteiras de empréstimos de instituições de menor porte.
Até financiamentos para pequenas e médias empresas, nicho conhecido como “middle market”, entraram na mira das grandes instituições nacionais e estrangeiras. O objetivo é recuperar parte do espaço perdido durante a crise.
O Bradesco, por exemplo, ampliou em 60% a média mensal de compras de contratos de financiamento de veículos em relação ao que vinha praticando no último trimestre de 2009.
Operações de consignado adquiridas de outros bancos cresceram 80%, segundo dados do balanço do primeiro trimestre. No total, a carteira de empréstimos ao consumo adquirida pulou de R$ 5 bilhões, em dezembro do ano passado, para R$ 7,7 bilhões em março deste ano. As compras ajudaram o banco a alavancar seus ativos e reduzir a distância para os concorrentes Banco do Brasil e Itaú Unibanco no período.
O Banco do Brasil também é uma das instituições mais ativas nesse segmento e está bastante agressivo. Em veículos, quase 30% da carteira própria (que exclui a parceria com a BV Financeira) vem da compra de operações de instituições menores.
Os bancos médios sempre usaram a cessão (venda) de carteira de crédito como uma das principais fontes de recursos. Mas, durante a crise de 2008 e 2009, o negócio esfriou.
As operações ficaram restritas a compras com os recursos dos depósitos compulsórios, liberados pelo Banco Central para ampliar a liquidez no sistema, sob a exigência de que o dinheiro que deixasse de ser depositado em seus cofres fosse aplicado em papéis de pequenas e médias instituições.
Mas no fim do ano passado as conversas entre os bancos grandes e médios voltaram e as compra foram retomadas.
Tradicionalmente, as instituições costumam operar de duas formas. Uma delas é o acordo entre dois bancos, em que os pequenos se comprometem a ceder um valor fixo ao comprador em troca de pagamentos com custo definido. Esse tipo de parceria se manteve mesmo durante a crise, já que eram garantidas por contratos.
Os chamados limites, no entanto, praticamente secaram. Nessa modalidade, os grandes disponibilizam uma linha de crédito para os pequenos, nos moldes de um cheque especial, e liberam recursos mediante a garantia dada em operações de crédito. As taxas cobradas, que giravam ao redor de CDI + 2%, pularam para CDI + 5% no auge da turbulência, inviabilizando os negócios. Somente no fim de 2009, com a normalização do mercado, os limites voltaram.
O Bonsucesso, por exemplo, assinou neste ano cinco linhas com outros bancos, afirma o diretor-executivo Jorge Lipiani. O total, entre acordos e linhas, chega a R$ 4 bilhões, superior até mesmo à carteira do banco, que é de R$ 3 bilhões. “Os acordos foram incrementados e as linhas voltaram. Os grandes bancos estão com apetite e têm capacidade”, diz Lipiani.
Esses recursos têm dado um importante impulso para o crescimento do crédito entre as instituições de menor porte no começo do ano. Renato Oliva, presidente da Associação Brasileira de Bancos (ABBC) alerta, no entanto, que a procura por empréstimos hoje é diferente do que era antes da crise.
“A demanda não é mais tão flexível à nossa oferta. Antes havia uma demanda reprimida, que hoje está mais estável.” Para Oliva, está havendo uma concentração dos ativos na mão de poucas instituições e isso pode levar a um desequilíbrio de forças no sistema financeiro.