Assis Moreira
Valor Econômico
No seu encontro da primavera europeia, os principais banqueiros do mundo escolheram o castelo de Kronborg, nas proximidades de Copenhague, para uma tradicional recepção. Simbolicamente, o local é conhecido como o “Castelo de Hamlet”, o célebre personagem de William Shakespeare marcado pela passividade e melancolia – similar ao sentimento europeu.
Em três dias de debates organizados pelo Instituto Internacional de Finanças (IIF), que reúne os maiores bancos do mundo, o sentimento geral é de incerteza sobre qual será o destino da Grécia, da Espanha e da zona do euro.
Não há nada de novo em termos de diagnóstico. É como se os banqueiros, até então chamados de “os senhores do mundo”, estivessem esperando para as próximas semanas alguma ação contundente do BCE e dos governos sobre a união bancária. Haveria garantia dos depósitos na zona do euro, a possibilidade de aumentar o tamanho dos fundos e até mesmo a possibilidade de maiores transferências fiscais entre países.
Mas a constatação dos banqueiros é de que não existe bala de prata para acabar com a crise do euro. Esperam um plano crível, mas sabem que isso passa por mais integração europeia. “Está todo mundo pessimista com a falta de perspectivas”, disse um banqueiro.
Ninguém se arrisca a dar palpites sobre eventual saída de algum país da zona do euro. O compasso de espera tem a ver com as indefinições eleitorais na Grécia. Os banqueiros cruzam os dedos: a exposição dos bancos europeus nos cinco países mais problemáticos – Grécia, Irlanda, Itália, Portugal e Espanha – chega a 1,5 trilhão de euros.
A questão imediata é a recapitalização dos bancos da Espanha, frisou o chairman do HSBC, Douglas Flint. A reestruturação do sistema espanhol é considerada um fato consumado. Um banqueiro argumenta que em países em melhores condições, como Austrália, Canadá, Turquia e Brasil, não há mais de cinco grandes bancos controlando 70% dos negócios de varejo e competindo entre si fortemente.
O único grande banqueiro espanhol no encontro foi Francisco Gonzalez, presidente do BBVA. E usou um tom quase ofendido, para reagir ao que chamou de “confusão total” sobre a Espanha. Reclamou da comparação com a Irlanda e prometeu que em breve o sistema bancário será inteiramente novo. Indagado sobre quem vai pagar pela capitalização, Gonzalez respondeu que a Europa é que tem que arcar com o ônus. No geral, ouvindo o discurso do executivo, a Espanha parece um país modelo.
Na noite de ontem, o palestrante foi o ex-ministro grego Lucas Papademos. Para ele, se a Grécia sair do euro será uma catástrofe. E exemplificou a que ponto está a fragilidade dos bancos: a perda de depósitos alcançou 80 bilhões de euros em dois anos. Ao Valor, Papademos disse que a soma representava 25% do total dos depósitos.
Os banqueiros tampouco sabem o que esperar do G-20, que se reúne dias 18 e 19 no México. Restou a Flint avisar que os mercados estão ansiosos por boas estratégias de coordenação global para garantir assistência aonde for necessário para bancos e países em dificuldades. E tentar dar estímulos para restaurar o crescimento.
Além das incertezas, os bancos sentem a pressão da crescente regulamentação para limitar os riscos. O comissário de mercado interno da União Europeia, Michel Barnier, afirmou que os países europeus deram 4,6 trilhões de euros em apoio público para seus bancos desde 2008 e que é hora de se acabar com essa garantia estatal. Barnier explicou que as autoridades têm o poder de forçar os bancos a se recapitalizar com recursos privados, de seus acionistas, mas não dinheiro público.
O projeto é suficientemente flexível para complementar a união bancária que o BCE pede. Mas qualquer proposta que inclua elementos que federalizem riscos do setor na Europa dificilmente terá o apoio dos 27 países do bloco. E a proposta tampouco se tornará efetiva antes de 2015 ou mesmo 2018. Richard Waugh, executivo-chefe do Bank of Nova Scotia, terceiro maior banco do Canadá, parecia exasperado ao dizer que a crescente regulação bancária está se tornando “intrusiva” e não protegerá os bancos com gestão ruim.
Quanto ao Brasil, houve um reconhecimento de que o país vai desacelerar como todo o conjunto de países emergentes.
Ao final da recepção no Castelo de Hamlet, que se transformou numa homenagem a sua despedida do cargo de presidente do IIF, o presidente do Deutsche Bank, Josef Ackermann usou a citação mais célebre da literatura ocidental para falar da Europa: “A questão, no momento, não é ser ou não ser (“to be or not to be”, do original inglês) e sim fazer ou não fazer.”