Longe de ser um ano generoso em termos de pagamentos de bônus de bancos, 2012 prenuncia ser profícuo para recuperar benefícios já concedidos.
A enxurrada de recentes escândalos no setor – desde a manipulação da Libor, o juro interbancário londrino, até vendas fraudulentas de produtos financeiros, passando por descumprimentos e infrações na aplicação de sanções antilavagem de dinheiro – estão levando os grandes bancos a privar, cada vez mais, os funcionários de bonificações que receberam por desempenhos passados que não mais parecem tão favoráveis.
As normas formais de “retomada de recursos”, que dão aos bancos o poder de reduzir ou cancelar a parcela de um bônus individual concedido, mas ainda não pago, estão em vigor no Reino Unido e na União Europeia (UE) desde 2009. Nos Estados Unidos, as autoridades reguladoras pressionaram pela inclusão de normas semelhantes nas reformas promovidas pela Lei Dodd-Frank, mas elas ainda não foram concluídas.
Uma série de grandes bancos europeus – como o HSBC e o Royal Bank of Scotland – fiscalizou medidas de recuperações de ativos por dezenas de vezes nos últimos três anos. Especialistas em remuneração preveem que esse número aumentará significativamente este ano, na medida em que os conselhos de administração tentam convencer os investidores de que eles estão adotando medidas duras para administrar os recentes descumprimentos de metas ou de normas.
O Deutsche Bank levou o princípio de recuperação de ativos ainda mais longe, tornando-se, recentemente, o primeiro banco mundial a adotar normas que lhe permitem destituir o corpo de funcionários de bônus ganhos em empregadores anteriores – iniciativa que poderá ser seguida por outras instituições financeiras.
“Houve toda uma série de incidentes que poderia dar motivos aos bancos para se reapoderar de bônus indevidos, e os conselhos de administração estão perdendo a paciência com os funcionários”, diz um especialista em salários. “Há crescente reconhecimento entre as comissões de remuneração de que essas áreas precisam ficar mais draconianas.”
No mês passado, o HSBC disse que estudaria a possibilidade de reduzir os bônus indevidamente concedidos a atuais e ex-altos executivos, após acusações de que o banco teria administrado dinheiro de grupos ligados ao tráfico de drogas e ajudado a financiar regimes repressivos.
Isso se seguiu à revelação, pelo banco americano J.P. Morgan Chase, de que teria reavido milhões de dólares de bônus de funcionários que foram os pivôs de um prejuízo de US$ 5,8 bilhões com transações. O Standard Chartered, o RBS e o Barclays também puderam se reapossar de bônus de funcionários graduados este ano após a ocorrência de uma série de constrangimentos públicos.
As normas de retomada de recursos normalmente dizem respeito a qualquer elemento injustificado de bônus anuais diferidos e de planos de incentivo de mais longos. Dificuldades jurídicas tornam virtualmente impossível para os bancos reivindicar a devolução de bonificações já pagas.
Altos dirigentes de bancos europeus tendem a ter de 50% a 75% de seu pagamento diferido, normalmente ao longo de um período de três anos. Alguns bancos têm normas mais rígidas – no RBS, por exemplo, todos os pagamentos de bônus acima de 2 mil libras esterlinas são diferidos e sujeitos a recuperação pelo banco.
As normas foram lançadas para garantir que os bancos possam reduzir bônus ou se recusar totalmente a pagá-los, se o real desempenho de uma pessoa física ou divisão não tiver correspondido às expectativas acalentadas quando o benefício foi concedido.
“É decisivo para uma empresa promover um programa de incentivo futuro de longo prazo, principalmente para executivos de alto escalão, a fim de mantê-los sistematicamente vinculados ao sucesso futuro da empresa”, diz Vicki Elliott, da consultoria Mercer.
Os conselhos de administração dos bancos têm, geralmente, ampla autonomia para decidir de quem poderão recuperar bônus – essencialmente qualquer pessoa com bonificações diferidas pendentes – e sobre os valores dos quais poderão se reapossar. Especialistas em remuneração dizem que a redução mais comum é a de 10 a 20%, dependendo do grau de responsabilidade e da gravidade do delito.
Eles citam uma série de gatilhos potenciais necessários para desencadear uma medida de retomada, entre os quais acusações de descumprimentos na área de conformidade e de governança, de multas regulatórias e de vendas fraudulentas – essencialmente qualquer coisa que tenha um impacto financeiro significativo sobre os resultados de uma empresa.
A Mercer destaca que os bônus podem ter seu resgate solicitado em decorrência de descumprimentos individuais, da divisão ou do grupo. Os funcionários individuais tendem a ser os mais atingidos se infringirem o código de conduta ou as regras de conformidade do banco, ou se tiverem sido os responsáveis por prejuízos específicos.
Más condutas individuais também podem desencadear reapreensões mais amplas. Um exemplo recente é o suposto escândalo de transação não autorizada de US$ 2,25 bilhões do UBS. Isso não apenas levou a um fundo total de bônus muito mais baixo para todos os dirigentes de banco de investimentos do UBS como fez com que o banco suíço se reapoderasse de bonificações diferidas em ações concedidas a um grupo de corretores, demitidos em decorrência do episódio.
Normalmente os bancos tentam reduzir os bônus pendentes concedidos para o ano no qual a falha de conduta ocorreu. No entanto, mesmo anos depois do episódio os conselhos de administração podem retomar bônus indevidos concedidos em momento posterior.
O inglês HSBC, por exemplo, está estudando a possibilidade de retomar não menos que 2 milhões de libras esterlinas em ações indevidas concedidas a Michael Geoghegan, ex-principal executivo, e a Sandy Flockhart, ex-diretora da divisão mexicana, em 2010, embora as falhas de conduta tenham ocorrido num período prolongado, que remonta a 2002.
No mesmo sentido o Lloyds Banking Group solicitou a devolução de parte dos bônus concedidos em 2010 a Eric Daniels, ex-principal executivo, e a um grupo de outros ex-diretores, por seu papel na venda fraudulenta de seguros de proteção a pagamentos – a pior das quais ocorreu antes de 2009. O Lloyds também negou a Daniels e a outros ex-diretores 2 milhões de libras esterlinas em bônus que deveriam ser pagos após a integração do HBOS, embora as metas tenham sido cumpridas.
“As normas não são totalmente objetivas”, diz um consultor em remuneração. “Os conselhos de administração precisam demonstrar que estão agindo com bom senso…, mas sua forma de pensar está mudando, no geral. Eles reconhecem que podem ter de se pautar menos por normas e fazer o que têm de fazer.”