O Comitê de Estabilidade Financeira (Comef) do Banco Central vai avaliar, em reunião marcada para esta quinta-feira (14), a situação do mercado de crédito imobiliário, que sofreu desaceleração nos últimos meses devido à baixa nos recursos captados na poupança.
O BC tem indicado que não vê riscos sistêmicos, mas avalia os impactos mais setoriais. Nos últimos dias, fiscais tiveram encontros com representantes dos bancos para, segundo apurou o Valor, colher informações sobre os riscos de uma parada súbita desse segmento do mercado.
Procurado pelo Valor, o Banco Central informou que essa é uma reunião ordinária do Comef, que ocorre trimestralmente, e que já há algum tempo o mercado de crédito imobiliário tem sido objeto de avaliação mais detalhada no seu Relatório de Estabilidade Financeira (REF). “O setor é objeto de estudos sempre”, declarou.
O Comef, formado por integrantes da diretoria do BC, tem o papel de definir as estratégias, diretrizes e encomendar estudos relacionados à estabilidade financeira e prevenção do risco sistêmico. Em 2014, uma das suas reuniões antecedeu medidas de liberação de depósitos compulsórios. Hoje, porém, o BC está pouco permeável a adotar medidas do tipo, que iriam na contramão do aperto monetário.
Mas o setor imobiliário apresentou uma extensa agenda de pleitos, incluindo uso de recursos da faixa livre da caderneta de poupança e mecanismos para incentivar bancos a ampliarem aplicações no segmento.
O conselho curador do Fundo de Garantia do Tempo de Serviço (FGTS) deve analisar no dia 26 proposta para ampliar o valor dos imóveis financiados com seus recursos. Mas a avaliação do setor imobiliário é que esses recursos não resolvem o problema de falta de dinheiro.
As estimativas são de que, neste ano, seriam necessários mais R$ 50 bilhões para atender à demanda, dos quais R$ 30 bilhões apenas para a Caixa Econômica Federal.
O FGTS tem um orçamento de R$ 56 bilhões para habitação em 2015, com prioridade para a renda mais baixa, e não a classe média, como contempla a proposta em estudo. A competição pelos recursos é grande. O governo já vem estudando a criação de uma nova faixa do “Minha Casa, Minha Vida” com recursos do FGTS, com foco na renda mais baixa.
Uma das possibilidades em estudo pelas áreas técnicas do governo é realocar para habitação recursos do saneamento básico, que tem orçamento de R$ 7,5 bilhões, e de infraestrutura, com orçamento de R$ 12 bilhões. Essas áreas estariam com uma execução mais lenta que habitação.
Embora a Caixa seja o gestor do FGTS, a proposta final de flexibilização do uso do fundo deve refletir a posição do governo como um todo, incluindo ministérios do Trabalho, Transportes, Fazenda e Casa Civil, entre outros. O governo detém a maioria do conselho curador do FGTS, com 12 cadeiras, enquanto os trabalhadores têm cinco representantes, e os empresários, seis.
As notícias de que o governo planejava mudanças nas regras das Letras de Crédito Imobiliário (LCIs) e restringir o crédito direcionado e de que a Caixa iria aumentar os juros anteciparam a demanda por financiamentos. Tal combinação ampliou o estresse no sistema em um momento em que as captações dos bancos na poupança já vinham caindo. Os saques superaram os depósitos em R$ 29 bilhões de janeiro a abril.
A expectativa inicial era que, neste começo de ano, caísse a demanda por financiamentos imobiliários. Mas, no primeiro trimestre, a concessão de crédito direcionado à habitação para pessoas físicas somou R$ 26,016 bilhões, o que significa certa estabilidade em relação aos R$ 26,142 bilhões contratados no primeiro trimestre de 2014.
No caso do FGTS, uma das propostas em estudo é aumentar o valor dos imóveis que poderiam ser financiados, dos atuais R$ 190 mil para R$ 300 mil. Para evitar críticas de que os recursos estariam beneficiando a classe média, a proposta contempla a cobrança de taxas de juros maiores. Outro argumento que procurará sensibilizar o conselho curador do FGTS é a preservação de empregos na construção civil.
Outras hipóteses defendidas pelo setor imobiliário, que estão sendo analisadas dentro do governo, é obrigar que os bancos apliquem a chamada faixa livre da poupança, que corresponde a 5% dos recursos captados em caderneta, em novos financiamentos. As estimativas são de que essa fonte de recursos possa movimentar R$ 20 bilhões.
Também está sendo contemplada dentro do governo a hipótese de criar mecanismos que obriguem bancos com margem para aplicar a destinar efetivamente recursos a novos financiamentos imobiliários.
Hoje, a Caixa, o Banco do Brasil, o HSBC e o Santander estão sem novos recursos para aplicação, enquanto o Itaú e o Bradesco têm margem. Uma das possibilidades é não permitir mais que os bancos cumpram as suas exigibilidades com a compra de papéis como Certificados de Recebíveis Imobiliários (CRIs).
O setor imobiliário tem insistido na tese de que, sem a liberação dos depósitos compulsórios da caderneta de poupança, será difícil mobilizar o volume de recursos necessário para atender à demanda do mercado e evitar uma queda dos preços de imóveis.
Depois das negativas do Banco Central e da Fazenda à liberação de compulsórios da caderneta de poupança para novos financiamento, o setor imobiliário procurou o Palácio do Planalto na esperança de rever a decisão.
Procurada pelo Valor, a Caixa declarou em nota que “que realizou ajustes nas taxas e cotas das operações que utilizam recursos da poupança (SBPE), no último mês de abril. Assim como os demais bancos, a Caixa teve impacto da redução da captação da poupança e da elevação da taxa Selic”.