Para os bancários do Rio Grande do Sul, setembro não é apenas o mês da chegada da primavera e da Campanha Nacional, que outra vez promete muita peleia (luta) contra os banqueiros. É também o mês da Semana Farroupilha, que resgata as lutas, os heróis e o legado da Guerra dos Farrapos (1835-45), como forma de manter vivas as tradições, a cultura gaúcha e os ideais de liberdade, igualdade e humanidade da bandeira do Estado.
Em Porto Alegre, o Parque Harmonia, situado à beira do Rio Guaíba, abriga desde 1987 o Acampamento Farroupilha, com a montagem este ano de 370 galpões pelos Piquetes e Centros e Departamentos de Tradições Gaúchas (CTGs e DTGs). O local vira uma cidade campeira e oferece infraestrutura da prefeitura, onde funcionam espaços administrativos, praça de alimentação, lojas, feiras e estabelecimentos comerciais, como padaria, açougue e supermercado.
A previsão é de cerca de 800 mil visitantes até o dia 20, feriado estadual, data que marca o início da Revolução Farroupilha, em 1835.
Com vocação cultural, o Sindicato dos Bancários de Porto Alegre e Região (SindBancários) participa ativamente desse movimento de preservação das raízes culturais do Estado, montando o galpão do Piquete dos Bancários, fundado em 2002, na gestão do presidente do Sindicato, Devanir Camargo da Silva. A iniciativa conta com o apoio da Fetrafi-RS, Apcef-RS e do Esporte Clube Banespa de Porto Alegre.
“Aqui, piquete não é somente um grupo de trabalhadores que busca convencer outros para aderirem à greve, mas é também um espaço de convívio, preservação da cultura gaúcha e confraternização, organizado por entidades ou grupos de pessoas, como ocorre na Semana Farroupilha”, explica o patrão do Piquete dos Bancários e diretor de Esportes, Cultura e Lazer do SindBancários, Edson Ramos da Rocha
Espaço cultural
Edson fica praticamente dia e noite no galpão, recebendo os bancários que trazem seus colegas, familiares e amigos para tomar chimarrão, fazer churrasco, arroz carreteiro ou outra comida campeira, ouvir canções gauchescas, contar “causos” (histórias inacreditáveis, mas verdadeiras), jogar truco e tomar um trago. Este ano, o patrão até passou a dormir no galpão.
Muitos frequentadores usam a pilcha, a indumentária gaúcha. Os peões (homens) colocam bota, bombacha (calça larga), lenço no pescoço, guaiaca (cinturão com lugar para guardar dinheiro), faca e chapéu; as mulheres (prendas), vestidos largos e compridos.
Há também apresentações culturais com música gauchesca e danças folclóricas, bem como o disputado torneio de truco. O cartunista do site do SindBancários e do jornal O Bancário, Augusto Bier, promove este ano a exposição de charges “Rio Grosso do Sul”, que reúne cartuns que abordam o cotidiano do gaúcho, sempre de uma forma bem-humorada. Impossível não soltar boas gargalhadas! Também ocorre uma mostra de fotografias, na sua maioria do fotógrafo Caco Argemi, que retratam os oito anos de história do Piquete dos Bancários.
Porteira aberta
A porteira do Piquete dos Bancários foi aberta no dia 31 de agosto, quando o galpão já estava montado. Edson manifestou orgulho e satisfação e agradeceu as parcerias que viabilizaram a estrutura. “Não medimos esforços para oferecer o melhor para a categoria”, destacou.
O presidente do SindBancários, Juberlei Bacelo, lembrou que o papel da atual gestão, além do enfrentamento aos banqueiros, é marcar presença nas mais diversas áreas, em especial com ações culturais. “A Semana Farroupilha coincide com o início da Campanha Nacional. Que os ideais farroupilhas tragam inspiração para a mobilização que teremos que ter pela frente”, observou.
Equipado com fogão campeiro, onde nunca falta água quente para o mate, o recinto tem mesas e cadeiras em estilo rústico e um bolicho, onde o bancário pode comprar refrigerante, cerveja e canha (cachaça da boa). Quatro churrasqueiras se encontram na parte de entrada do galpão. “Dá para assar um boi e uma ovelha inteira”, exagera o diretor do SindBancários e da Contraf-CUT, Paulo Stekel.
Chama Crioula
O Piquete dos Bancários também faz, durante uma hora, a guarda a Chama Crioula. Trata-se de um símbolo idealizado por jovens estudantes vindos do interior gaúcho para a Capital, que procuravam um espaço onde pudessem reviver suas origens do campo e cultivar sentimentos regionalistas.
À meia-noite do dia 7 de setembro de 1947, antes da extinção do fogo simbólico da pátria, Paixão Cortes e dois amigos, então estudantes do Colégio Júlio de Castilhos, retiraram uma centelha da chama e a conduziram a cavalo ao saguão do colégio, onde ardeu em um candeeiro até a meia-noite do dia 20 de setembro.
Durante esse período, os jovens realizaram uma programação que contou com cantos, poesias, palestras e exposições sobre a cultura gaúcha. Desde então, a Chama Crioula passou a representar um local onde o povo do Rio Grande cultiva as suas tradições.
Peleando por dignidade
A cada ano que passa, o número de freqüentadores aumenta cada vez mais. Ano passado, cerca de mil pessoas visitaram o Piquete dos Bancários.
A porteira ficará aberta até o dia 20, quando também ocorre o Desfile Farroupilha, em Porto Alegre, com carros alegóricos e apresentações do Movimento Tradicionalista Gaúcha, reunindo milhares de pessoas. No dia seguinte, o galpão será desmontado.
“O Piquete dos Bancários é a integração da categoria nas atividades de resgate da cultura e da história do povo gaúcho e brasileiro. Em tempos de globalização não podemos deixar de aprender com as lições de bravura e combatividade de nossos antepassados para construir um mundo mais justo, humano e solidário”, ressalta o diretor do SindBancários e secretário de imprensa da Contraf-CUT, Ademir Wiederkehr, que criou o slogan “Peleando por Dignidade”, lançado em 2009 e agora estampado em banners, camisas e casacos.
Como diz o refrão do hino rio-grandense, entoado pelos gaúchos com mais paixão do que o hino nacional, “sirvam nossas façanhas de modelo a toda terra”.
O Piquete dos Bancários é mesmo trilegal, tchê!