Ato público em Porto Alegre mostra que assédio moral é ruim para todos

Evento reuniu dirigentes sindicais e representantes do MPT e MTE

Já imaginou chegar ao seu ambiente de trabalho, uma agência bancária, e seu chefe, sem qualquer explicação, dizer que a partir daquela data você vai trabalhar dentro do cofre do banco isolado dos outros colegas e sem nada para fazer? Nunca imaginou isso? Mas isso ocorre e não é com pouca frequência. Essas e outras situações ilustraram, na manhã de quarta-feira (23) o ato público sobre o Assédio Moral nos Estabelecimentos Bancários, no Auditório da Casa dos Bancários, em Porto Alegre.

O encontro, organizado numa parceria entre o Ministério Público do Trabalho (MPT), o Sindicato dos Bancários de Porto Alegre e a Fetrafi-RS, demonstrou o quanto o assédio moral está impregnado nas políticas de gestão dos bancos e que é ruim para empregados, patrões e até para os assediadores. Tudo começa com as metas. Cada vez maiores, cada vez mais inatingíveis e segue com a perversidade do praticante de assédio, em geral o chefe ou gestor das políticas.

O jeito de fazer os bancários chegarem às metas é tratando mal, fazendo sofrer. Algo que não precisa ser assim. Aliás, os participantes da mesa chegaram a um consenso para além do fato de que o assédio moral se disseminou por empresas públicas e privadas. A prática da pressão continuada, cotidiana, traz prejuízo para as próprias organizações e também para os assediadores. Mas como combater essa prática? Com informação, com justiça e com coragem.

Participaram o presidente do SindBancários, Mauro Salles, a diretora da Fetrafi-RS, Denise Falkenberg Corrêa, o procurador chefe adjunto do Ministério Público do Trabalho (MPT), Rogério Fleischman, a procuradora do MPT, Bruna Desconzi, e o auditor fiscal do Ministério do Trabalho e Emprego (MTE), Pedro Jacobs. Na plateia, inúmeros trabalhadores de bancos e muitas vítimas de assédio moral, além de operadores do direito e jornalistas.

Do aprendizado à prática da fiscalização

Pedro Jacobs há muitos anos lida com práticas de assédio moral. Há tanto tempo que teve que aprender a reconhecer o problema. Conta ele que, nos anos 1980 e 1990, fábricas de calçados no Vale do Sinos, eram não apenas praticantes, como propagadoras de uma cultura de rendimento do trabalho por meio da aplicação continuada de mecanismos que fizessem com que as pessoas pensassem apenas em trabalhar e produzir.

“Há uma dificuldade de provar o assédio moral. O trabalhador assume como ele sendo o incompetente. Assume a ideologia da chefia. Fiscalizei fábricas de calçados e percebi que havia um controle sobre as idas ao banheiro. Naquela época, anos 1980 e 1990, a lei permitia que crianças a partir de 12 anos trabalhassem nas esteiras. Havia controle sobre o número de vezes em que uma pessoa podia ir ao banheiro. E o banheiro tinha um vão entre o chão e a porta para que a pessoa fosse observada e controlada. Eles sabiam o que a pessoa ia fazer”, conta Jacobs.

De lá para cá, muita coisa mudou, mas ainda precisa melhorar. Há a dificuldade acima mencionada de provar o assédio moral, mas há também literatura técnica que classifica os tipos. Assim, o assédio moral pode ser classificado em vertical (cometido por chefe sobre comandado) horizontal (entre pessoas com o mesmo nível hierárquico) ou ascendente, quando um grupo de trabalho assedia o próprio chefe. Este último é o mais raro de todos, mas acontece.

Quanto ao conceito, basicamente, o assédio moral se apresenta como uma conduta abusiva e reiterada que atenta à dignidade e que tem por finalidade segregar ou excluir o trabalhador ou um grupo de trabalhadores, causando danos de natureza psicológica. As consequências são danosas para a vítima. Além de aumentar a frequência de faltas (absenteísmo), disfunção sexual, danos psicológicos e até o suicídio.

O auditor fiscal diz que a Consolidação das Leis do Trabalho (CLT) trata, em seu artigo 483, do tema. Ao assediador recai a punição de rescisão indireta, por justa causa. Mas é preciso ficar atento a algumas questões. O assédio moral é uma prática reiterada, ou seja, se repete e não pode ser confundido com o dano moral ou o dano material.

Por um lugar melhor para trabalhar

Ela sofreu assédio moral quando trabalhava em um escritório de advocacia. Foi isolada e suas tarefas repassadas a estagiários. Durante um mês, nem seu chefe nem nenhum outro colega dirigiu-lhe a palavra para explicar a ela o porquê passava os dias sem que falassem com ela e sem designar-lhe tarefas. Até que a paciência acabou.

Bruna Desconzi foi aprovada em concurso público, transformou o próprio sofrimento num motivo para lutar pela erradicação do assédio moral no ambiente de trabalho. É a partir de Santa Maria, onde a procuradora atua, que tomou algumas iniciativas.

Desde então, já conseguiu, por meio de um TAC, a partir de um caso de assédio moral de uma grande empresa investir os R$ 10 mil obtidos em uma campanha de mídia que teve a confecção de um spot de TV, anúncios em jornais de Santa Maria, além de uma cartilha.

Mesmo esse esforço, segundo Bruna, não tem dado resultado. Há casos absurdos de empresas que fazem os trabalhadores cumprirem jornadas desgastantes. Um caso foi o de uma grande empresa que obrigava e registrava em ponto jornadas de trabalho regulares de até 20 horas diárias.

O assédio moral é sinal dos tempos pós-modernos na concepção da procuradora. Trata-se de uma noção de que a identidade das pessoas está muito impregnada do ambiente do trabalho. Mas isso não é natural. Tem sido construído à base de uma política de gestão que exige metas. “Tudo é o trabalho. A política? É saber qual vai ser o novo gerente a ocupar o cargo vago. A religião? É a do chefe. E até o futebol é o da empresa. Vivemos só para o trabalho. Esquecemos que existe vida fora do trabalho. Cada vez saímos mais cedo de casa e voltamos mais tarde”, ensina Bruna.

Reconheça e saiba o que fazer contra o assédio moral

Assediador

– Responsabilidade civil
– Responsabilidade Criminal
– Demissão por justa causa
– Adoecimento ético

Empresas

– Absenteísmo
– Queda na produtividade

Assédio organizacional

– Gestão por injúria (avaliação coletiva): assédio a um grupo
– Gestão por estresse (é o mais comum): cobrança de metas e avaliação pelo resultado e não pelo esforço.

Exemplos

– Ameaça de demissão
– Não assa trabalho
– Imposição de metas
– Processo seletivo de trabalhadores humilhante
– Horário para ir ao banheiro

Fiscalização

– Produção de relatório

Produção de prova

– Testemunhos de colegas
– Gravação de áudio
– Gravação de vídeo

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