Por Fatima Oliveira*
A Internet é um meio de comunicação global e multifacético, cujo poder não está devidamente dimensionado, por ser uma tecnologia atraente, nova e que a cada dia cativa mais adeptos. É emergencial assegurar que ela continue um espaço democrático e livre de monopólio dos barões das mídias clássicas. É necessário partir de dados reais sobre o mundo virtual para especular sobre a função social que cabe à Internet. Ou seja, é indispensável saber, pelo menos, quantos são os ditos ”incluídos digitais”.
O jornalista Paulo Henrique Amorim (PHA), no debate ”O papel dos meios de comunicação alternativos na formação e transformação social”, na CUT-SP, no último dia 17, foi profético a respeito de si mesmo, ao dizer: ”Em breve, os grandes grupos empresariais tomarão tudo. Mas ainda há um espectro na Internet à disposição para consolidar grandes portais alternativos”, e que ”precisamos meditar sobre o uso dos parcos recursos existentes para a construção de uma mídia alternativa”. No dia seguinte, teve bloqueado o acesso a seu site, o ”Conversa Afiada”, no Portal iG, da Brasil Telecom, cujo contrato seria até 31.12.2008.
Para o jornalista Luiz Carlos Azenha, ”foi um dia histórico para a Internet e o jornalismo eletrônico brasileiro. Pela primeira vez, ao menos que seja de meu conhecimento, um site foi desplugado do ar sem qualquer aviso aos internautas, sem qualquer explicação oficial da empresa hospedeira”.
PHA, reafirmando que ”essa é a virtude da Internet: último reduto do jornalismo independente”, relembrou: ”não é a primeira vez que me mandam embora de uma empresa jornalística. Só o Daniel Dantas me ‘tirou do ar’ duas vezes: na TV Cultura e no UOL. E ele sabe que não vai me tirar nunca. Com isso, se encerrou a vida desse blog num portal da Internet. Nenhum blog de relevância política nos Estados Unidos, por exemplo, está pendurado num portal”. Mudou-se para www.paulohenriqueamorim.com.br
A pesquisa ”Digital World: State of the Internet”, de janeiro de 2008, da comScore, informou que 824 milhões de pessoas no mundo acessaram a Internet, de casa e do trabalho – não foram contabilizados acessos de computadores públicos, como cibercafés, telefones celulares e PDAs – e que ”a Internet já deixou de ser uma mídia centrada nos Estados Unidos para se transformar em global. Hoje, 21% das pessoas que acessam a Internet são dos Estados Unidos. Em 1996, eram 66%”.
Outras constatações da pesquisa: para a maioria dos usuários, a Internet é uma importante fonte de notícias; as três maiores marcas globais da web são Google, Yahoo e o Baidu (site de buscas chinês); dois em cada três internautas navegam em redes sociais, como Orkut, MySpace, Facebook, LinkedIn; o vídeo online, na onda da popularidade do YouTube, é o lazer dominante da web – mais de 250 milhões de visitas em janeiro de 2008; e a distribuição web no mundo, no período pesquisado, é a seguinte: Ásia/Pacífico: 308,8 milhões; Europa: 232,8 milhões; América do Norte: 183,8 milhões; América Latina: 59 milhões; e Oriente Médio e África: 39,9 milhões.
Dados do Ibope/NetRatings informam que o volume de internautas residenciais ativos no Brasil chegou a 21,4 milhões em dezembro de 2007, dos quais quase 10 milhões acessaram e leram blogs em 2007, ou seja, 45% dos internautas ativos no mês. São dados que evidenciam o potencial de poder da Internet como local privilegiado para espaços alternativos de formação de opinião, de poder. Donde é possível entender o afã que move o velho e o novo baronato da mídia com vistas a cercear e a monopolizar a blogosfera, pois ela democratiza o poder, dando voz a quem não a possuía.
Em suma, o cenário do episódio iG X PHA é um atentado explícito à liberdade de expressão, que toda pessoa de bem deve repudiar veementemente, agora ou cale-se para sempre.
*Fatima Oliveira é médica e escritora. Indicada ao Prêmio Nobel da paz 2005