Agência Carta Maior
Najar Tubino
As consequências do sistema econômico custam vidas, lesões fatais, traumas em famílias em todo o mundo. Não importa se é uma economia rica e desenvolvida, como o caso da União Europeia, onde em cada grupo de quatro cidadãos um tem algum distúrbio mental. Ou que a cada nove minutos ocorra um suicídio – 58 mil conforme os dados oficiais ainda do final da década passada. No Brasil em 2013, foram registradas 53.646 mortes violentas- uma a cada 13 minutos – a maioria de jovens da periferia das regiões metropolitanas. Uma pesquisa do Ministério da Saúde apontou a morte de 1.118.651 pessoas entre 1991 e 2000 – mais de 309 homicídios, 62.800 suicídios e 309.212 mortes por acidentes e violência no trânsito. A Organização Mundial de Saúde estima que sete milhões de pessoas morreram em consequência da poluição atmosférica e por poluição domiciliar .
Em São Paulo morreram 99.084 entre os anos de 2006-2011, conforme pesquisa do Instituto de Sustentabilidade e Saúde, dirigido pelo pesquisador da USP, Paulo Saldiva. Desde o ano passado o ar contaminado e o poluente material particulado passaram a ser consideradas causas ambientais de mortes por câncer – de pulmão, na sua maioria. No Rio de Janeiro ocorreram 36.194 mortes no mesmo período. Somadas as duas frotas de veículos das maiores capitais brasileiras – SP e RJ – o total ultrapassa 10 milhões de veículos. A poluição causa doenças no sistema cardiovascular e pulmonar, e embora o Brasil tenha um programa de monitoramento do ar há 25 anos, apenas 1,7% dos municípios mantém estações de monitoramento. Em São Paulo existem 86, no Rio de Janeiro 80 e no Rio Grande do Sul 20, são os estados mais avançados nesta questão.
Dois milhões de mortes por acidentes de trabalho
A professora e juíza do trabalho Martha Furtado de Mendonça Schmitt, de Belo Horizonte, elaborou uma pesquisa sobre o trabalho e saúde mental na visão da Organização Internacional do Trabalho (OIT).
“Os acidentes fatais no mundo causaram a morte de dois milhões de trabalhadores e os não fatais atingiram 330 milhões. As doenças relacionadas ao trabalho atingem 100 milhões de trabalhadores no mundo. O custo atual dos acidentes e doenças relacionadas ao trabalho é equiparado a 4% do PIB mundial. Os maiores problemas de saúde relacionados foram o estresse e as disfunções músculo-esqueléticas”, registra a pesquisadora.
Martha Schmitt também aponta para o número crescente de casos de Karoshi – palavra japonesa que significa morte por excesso de trabalho – no país asiático, tendo por causas a tensão, alta demanda e excesso de obrigação em acatar ordens. Na Alemanha os casos de faltas ao trabalho por transtornos mentais dobrou nos últimos anos. Desde 1995, as doenças mentais tornaram-se a principal causa de aposentadoria precoce – a percentagem dobrou a partir de 1980. Já no Reino Unido o Departamento de Trabalho e Aposentadoria Inglês aponta as doenças mentais e os distúrbios comportamentais como os responsáveis pelo maior gasto do setor – que junto com as doenças relacionadas ao sistema nervoso são a causa da metade das despesas com os benefícios por incapacidade, num total de 3,9 bilhões de libras. Em março de 2010, a Organização Internacional do Trabalho atualizou a Recomendação 194, incluindo as desordens mentais e comportamentais. No Brasil, ainda citando a pesquisadora mineira, em 2007 foram registrados 653.090 acidentes e doenças do trabalho. As notificações por doenças mentais cresceram 1324%, em segundo lugar as doenças osteomusculares registraram crescimento de 893%.
Na Europa custa de 3 a 4% do PIB
A União Europeia firmou um Pacto pela Saúde Mental em 2008, com metas para todos os estados membros, em consequência das “incidências significativas sobre os sistemas econômico, social, educativo, penal e judicial”, além disso a “estigmatização, a discriminação e o desrespeito aos direitos e a dignidade a pessoa doente continua a ser uma realidade, que se opõe aos valores europeus fundamentais”. A doença mental custa a União Europeia de 3 a 4% do PIB, sobretudo através da perda de produtividade. Ou seja, além da falta ao trabalho, as doenças mentais são uma das principais causas de aposentadoria e pensões por invalidez. Em 2014, o Parlamento Europeu decretou o “Ano Europeu do Cérebro e das Doenças Mentais”.
Na China, onde os migrantes deixam suas famílias para trabalhar nas fábricas dos centros industriais, os filhos “deixados para trás”, sofrem de ansiedade e depressão, um índice que atinge 15% das crianças, segundo Zheng Yi, presidente da Sociedade Chinesa de Psiquiatria da Criança e do Adolescente. A depressão já é considerada um problema de saúde pública pela Organização Mundial de Saúde e atinge 400 milhões de pessoas. Nos Estados Unidos o problema tem um contorno mais complicado porque envolve diretamente a indústria farmacêutica. Os psiquiatras que elaboram o Manual Diagnóstico e Estatístico de Transtornos Mentais (DSM), considerado uma referência não somente nos EUA, mas para outros países, são comprovadamente ligados à indústria. E tem aumentado o número de doenças de uma maneira absurda.
Experimento nocivo
A questão se tornou tão grave que o Instituto Nacional de Saúde Mental (NHI) decidiu excluir de financiamento as pesquisas que se baseiam nas categorias do guia. O psiquiatra Allen Frances, autor do livro “Saving Normal” – Salvando os normais -, que participou da elaboração do guia, denunciou a dobradinha médico-indústria:
“Estamos transformando os problemas diários em transtornos mentais e tratando-os com comprimidos… parte do problema é que o sistema de diagnóstico é muito frouxo… mas o principal problema é que a indústria farmacêutica vende doenças e tenta convencer os indivíduos de que precisam de remédios. Eles gastam bilhões de dólares em publicidade enganosa para vender doenças psiquiátricas e empurrar medicamentos”, disse ele em uma entrevista.
O transtorno do momento é o de déficit de atenção e de hiperatividade. Num mundo digital, onde as crianças já viram celebridades na internet, desde que saem da barriga da mãe e são fotografadas diariamente, logo em seguida, ganham o seu primeiro celular, é inevitável que o sistema nervoso acelere. O inconveniente da agitação é tratado com remédio, e os Estados Unidos são campeões na produção e consumo da Ritalina, o medicamento indicado para estes casos – são 38 toneladas produzidas e 34 consumidas.
Diz o psiquiatra Allen Frances : “o TDHA ocorre em 3% das crianças, mas é diagnosticado em 11% e, ridiculamente, em 20% dos adolescentes homens. Nós estamos fazendo um vasto e descontrolado experimento em nossas crianças, banhando seus cérebros imaturos com produtos químicos fortes sem saber seus efeitos de longo prazo”.
Morrendo à míngua
No Brasil, o Ministério da Saúde considera que 3% da população apresentam transtornos mentais severos e persistentes, mas de 9 a 12% – ou seja, até 15% da população -, em todas as faixas etárias apresentam transtornos mentais leves e necessitam de cuidados eventuais. Também registra a dependência de álcool entre os 12 e 65 anos em 9 a 11% da população.
No momento em que os burocratas da diplomacia mundial começam a reunião preparatória para a próxima Conferência do Clima em Lima – a COP ocorrerá em 2015 na capital da França – é fundamental ter em conta o seguinte: a população mundial tem problemas gravíssimos no seu cotidiano, como consequência do sistema econômico, que só aumenta a concentração de renda na mão de uma elite cada vez menor, e deixa a grande maioria numa corrida sórdida por sobrevivência. E, no dia a dia, vai perdendo a batalha econômica, para uma elite que não quer saber se as condições de vida no Planeta estão piorando, o que significa que vai piorar ainda mais a vida de milhões de pessoas. Muito antes dos governantes se dignarem a traçar metas de mudanças no sistema econômico, onde somente o poder financeiro comanda, ou muito mais difícil, definirem metas de redução de consumo de petróleo, que significa reduzir frotas de veículos e mudar os sistemas de transporte no mundo – além é claro de acabar com o poder das petrolíferas e as ligações do mercado com a elite árabe – milhões de trabalhadores continuarão morrendo à míngua, doentes, enlouquecidos, e pior, se considerando culpados.