Investigado por sonegação de impostos, Moro se diz vítima de lawfare

Contra membro do TCU, Moro e Podemos ainda usam Lei de Abuso de Autoridade, da qual já foram opositores

Em sua defesa no Tribunal de Contas da União (TCU) contra um pedido de indisponibilidade de seus bens, por suposta sonegação de impostos, o ex-juiz, ex-ministro, ex-consultor e agora presidenciável Sérgio Moro (Podemos) disse estar sendo vítima de lawfare. “O termo que deriva das palavras inglesas law (lei) e warfare (guerra), podendo ser traduzido literalmente por guerra jurídica, foi apresentado pela primeira vez aos tribunais do país em outubro de 2016, pelos advogados Cristiano e Valeska Zanin Martins”, explica o secretário de Assuntos Jurídicos da Confederação Nacional dos Trabalhadores do Ramo Financeiro (Contraf-CUT), Lourival Rodrigues. “Na época, eles haviam iniciado a condução da defesa de Luiz Inácio Lula da Silva, apontando evidências de manipulação do sistema Judiciário como arma para alcançar finalidades político-sociais, sendo a principal delas a desconstrução da imagem e da reputação do ex-presidente”, completa.

“Para nós este momento [em que Moro se coloca agora como vítima de lawfare] tem um grande significado”, disse o casal Zanin Martins em artigo publicado nesta terça-feira (8), na coluna Maquiavel, da revista Veja. “Na sua defesa [ao TCU] consta a reclamação de que ele [Moro] estaria sendo vítima de lawfare, algo que ele próprio disse ser apenas um ‘rematado exagero’ retórico na famigerada sentença proferida no caso do ‘tríplex’ do Guarujá”, pontuam os advogados.

As suspeitas contra Moro

Sérgio Moro está sendo alvo de um pedido de indisponibilidade de bens, feito na última sexta-feira (4) pelo subprocurador-geral do Ministério Público, Lucas Furtado, ao Tribunal de Contas da União (TCU). Existem suspeitas de sonegação de impostos sobre os pagamentos que ele recebeu do Grupo Alvarez & Marsal (A&M).

A holding, baseada nos Estados Unidos, contratou os serviços de consultoria de Moro, logo após o ex-ministro deixar o governo Jair Bolsonaro (PL), em abril de 2020. A contratação suscitou contra Moro suspeitas de práticas ilegítimas de revolving door – quando agentes de alto escalão do Estado migram para o setor privado – e também de lawfare, por possível perseguição direcionada a investigados na Operação Lava Jato.

Tais suspeitas originaram o primeiro pedido de investigação do subprocurador Lucas Furtado, em dezembro de 2021, e aceito pelo ministro Bruno Dantas do TCU, que derrubou o sigilo do processo e expôs que, de 2013 a 2021, a A&M recebeu R$ 83,5 milhões pelos serviços de consultoria, dos quais 78% (R$ 65 milhões) para os processos de recuperação judicial de empresas envolvidas na Lava Jato, incluindo Odebrecht, OAS e Queiroz Galvão.

O Grupo A&M, entretanto, não quis informar ao TCU o quanto pagou a Moro no período em que o ex-ministro trabalhou com eles, alegando que o Tribunal não seria o órgão competente para investigar uma relação privada. No dia 31 de janeiro, o próprio subprocurador Lucas Furtado fez o pedido de arquivamento da investigação, acolhendo o entendimento de que o dinheiro pago a Moro era privado, portanto, o TCU, de fato, não seria competente para investigar o contrato.

Contrato milionário

Alguns dias depois, entretanto, em 4 de janeiro, Furtado reiniciou o debate ao fazer um novo pedido ao TCU, desta vez solicitando a indisponibilidade dos bens de Moro, após o juiz ter afirmado durante uma live que recebeu R$ 3,6 milhões por 12 meses (cerca de R$ 10 mil por dia) pelos trabalhos prestados ao escritório Alvarez & Marsal.

A fim de averiguar se não houve sonegação de impostos, Furtado pede agora que o TCU determine que Moro apresente a íntegra dos dois contratos firmados com a holding (um celebrado como pessoa jurídica, a Moro Consultoria, e o outro celebrado como pessoa física). A apresentação dos dois contratos, segundo o subprocurador, seria “a única forma de comprovar a remuneração pactuada”, entre as duas partes, “já que os recibos isolados (além de inconclusivos no caso dos emitidos nos EUA) provam os valores neles registrados, mas não a inexistência de outros, referentes a verbas da mesma ou de outra natureza”, ressalta.

Furtado quer ainda investigar se houve “pejotização” no contrato firmado entre Moro e a empresa americana, para fugir da incidência dos tributos do regime CLT, e também se, para não pagar imposto de renda sobre seus tributos, o ex-juiz não declarou sua saída definitiva do Brasil quando viajou para morar nos Estados Unidos durante o ano em que prestou serviços ao Grupo A&M.

Em resposta ao novo pedido de investigação, Moro disse que o “procurador do TCU” pratica “abuso de poder”. O seu partido, o Podemos, também entrou com um pedido no Senado para investigar Furtado à luz da Lei de Abuso de Autoridade. O irônico é que tanto Moro quanto o Podemos fizeram manifestações contra a lei, na época em que foi discutida e promulgada, em 2019, afirmando que a legislação teria sido criada como uma retaliação da classe política à Lava Jato.

“A forma como Moro desenvolveu sua relação com a empresa responsável pela recuperação judicial das empresas investigadas pela operação Lava-Jato, a qual ele próprio disse ter sido o responsável à época em que era juiz, é no mínimo suspeita. Portanto, é de interesse público sua investigação, ainda mais agora sendo candidato a Presidência da República”, aponta o secretário de Assuntos Jurídicos da Contraf-CUT, Lourival Rodrigues.

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