Logo após a aprovação do Regimento Interno do 32º Congresso Nacional dos Funcionários do Banco do Brasil (CNFBB) e as saudações dos representantes das forças políticas com atuação no movimento sindical bancário do Banco do Brasil e das federações que compõem a Comissão de Empresa dos Funcionários do Banco do Brasil (CEBB), antes da primeira mesa sobre “Diversidade para construir um banco realmente do Brasil”, o congresso homenageou o dirigente sindical, membro da CEBB, falecido em junho de 2021, vítima da Covid-19, na manhã deste domingo (8).
“A ideia desta primeira mesa é falarmos sobre a importância da diversidade para construirmos um banco realmente do Brasil”, explicou a secretária de Juventude e representante da Confederação Nacional dos Trabalhadores do Ramo Financeiro (Contraf-CUT) na CEBB, Fernanda Lopes.
O jornalista, professor universitário e ex-deputado federal Jean Wyllys (PT-RJ) abriu a exposição da mesa sobre diversidade citando filósofo alemão Peter Sloterdijk, considerado um dos grandes renovadores da filosofia contemporânea, para falar que, em momentos de grave crise política e econômica, há uma tentativa dos setores conservadores dominantes de criar inimigos que justifiquem seus ataques. “São velhos preconceitos, falsas certezas, velhos discursos que estão em nós, que começam a ser manipulados para culpar pessoas, apontar culpados pela infelicidades e fracassos. Isso Também aconteceu no Brasil”, explicou.
Wyllys disse que a crise que se iniciou em 2008 nos Estados Unidos só chegou ao Brasil em 2013, no governo Dilma. “Os que não queriam perder privilégios não queriam pagar nada para sustentar direitos sociais. Esses grupos criaram inimigos internos. Começa o movimento antipetista”, analisou Jean Wyllys ao destacar que tudo que era manejado pelo PT, pelas agendas de esquerda, conceitos como equidade de gênero, direito das mulheres ao aborto legal, legalização das drogas para combater o narcotráfico, casamento civil entre pessoas do mesmo sexo, lei de identidade transgênero, “foi atacado duramente por uma campanha de comunicação massiva que utilizava os novos meios de comunicação e que nãos estava restrita apenas ao Jornal Nacional da Rede Globo.”
“É óbvio que o Banco do Brasil seria também atingido, um banco que seguia que linhas de orientação democráticas e inclusivas, que contratava dava possibilidade de ascensão a pessoas de grupos distintos”, observou Jean Wyllys. O jornalista lembrou que o BB foi fundamental para a política de inclusão social e de diversidade do governo Lula. “Espero que os funcionários do BB resistam a esse panorama de ataque às políticas de diversidade e inclusão de pessoas LGBT, indígenas e quilombolas. São setores afetados por coisas muito maiores, que envolvem disputas políticas e também de comunicação”, finalizou.
Política de diversidade no BB
Logo após explanação de Jean Wyllys, foi transmitido o vídeo do depoimento de Luciene Cortes, mulher, preta e ex-funcionária do Banco do Brasil, que contou como é a realidade de uma mulher preta na carreira do BB.
A funcionária aposentada do Banco do Brasil, Izabela Campos Alcântara Lemos, uma das primeiras diretoras mulheres do Banco falou sobre o início da implantação da política de diversidade no BB e os resultados que podem ser vistos ainda hoje.
“Participei de um momento muito importante e desafiador, que preparou o terreno para coisas que aconteceram posteriormente. Em 1987, não víamos mulheres como diretoras do banco. O que víamos eram mulheres em cargos administrativos, mais próximos aos trabalhos realizados nas agências”, lembrou.
No início de 2003, o banco nomeou a primeira mulher como diretora, a Rosa Said e, em 2004, Izabela Lemos foi nomeada como diretora. “Precisamos realizar um grande esforço para inserir a sustentabilidade nas práticas do banco, repensar o meio ambiente, os direitos humanos, já entrando na questão da diversidade, com compromissos assumidos em âmbito internacional. O banco aderiu ao programa de equidade de gênero do Governo Federal, e como o banco já estava inserido nesta questão, nos organizamos para a realização dos programas”, disse.
A partir da adesão ao programa de equidade de gênero, a questão de diversidade, a partir daí, foram nomeadas mais mulheres diretoras. “Se em 195 anos não havia nenhuma mulher, naquele período chegamos a ter cinco diretoras”, disse.
Também houve naquela fase a possibilidade de inclusão de dependentes de uniões homoafetivas nos planos de saúde e, posteriormente na Previ.
Igualdade de gênero
Outro ponto foi a presença das mulheres na diretoria. “Naquele momento era mais uma questão política e tínhamos que fazer constar nos documentos estratégicos da empresa”, explicou Izabela.
Logo no início o banco teve a primeira funcionária transgênero. “Naquela época ninguém falava sobre isso. Discutimos sobre a necessidade de tratar desse tema e o cuidado de como receber essa pessoa”, disse.
“Hoje temos mais mulheres no banco do que algum tempo atrás, mas não é a mesma proporção da população brasileira. E mesmo assim, se a entrada no banco se dá por meio de concurso, porque não há a ascensão aos cargos de diretoria”.
Aproveitar o momento
“Hoje o banco tem a primeira mulher como vice-presidenta e no CA, a presidenta é mulher, a representante dos minoritários e mulher e a Débora como representante dos funcionários. E a representante dos minoritários, é atuante na área de diversidade. É um momento propício para colocarmos esse debate”, defendeu Izabela. “Mas, hoje existe um processo em que o banco volta a falar de meritocracia como um modelo coloca a responsabilidade ascensão ou não muito mais na própria mulher”.
Mas, Izabela também alerta que hoje o banco possui documentos que definem políticas de diversidade e a Comissão de Valores Mobiliários (CVM) determina que o banco forneça informações e documentos sobre a diversidade no banco. “O banco precisa ter coerência e ela pode ser cobrada. Quando a gente vê um comercial que foi derrubado porque o governo não quer tratar do assunto. Ele pode ser cobrado pela falta de coerência”, observou.
Todos perdem com o racismo e com a discriminação
O professor doutor José Vicente, fundador e reitor da Universidade Zumbi dos Palmares, fechou a mesa sobre diversidade para construir um banco realmente do Brasil. No início da sua fala agradeceu a oportunidade de estar passando um Dia dos Pais diferenciado, podendo falar de diversidade. “Essa questão continua colocada como um desafio para nossa geração. Nós caminhamos, fizemos a luta política, fomos para o Congresso, para as ruas, formalizamos a luta em direitos e imaginávamos que a luta não precisaria mais de esforço para se tornar realidade. Juntamente com o reconhecimento de que havia racismo, de que racismo é um dano irreparável e que precisava ter um freio, o governo reconhece o racismo como crime. Mesmo com tudo isso, nós vemos nos últimos anos a lei não ser respeitada. Infelizmente, nenhuma dessas medidas legais e institucionais deram conta de permitir que a presença do negro seja próxima daquilo que ele representa na sociedade.”
O professou doutor chamou também atenção para o número de empresas ou uma parte considerável delas que têm comprometido com a importância dessa questão. “Muitas empresas têm internalizado muitas dessas práticas, muitas dessas medidas e têm implementada muitas dessas ações para que a gente tenha essa pluralidade e essa igualidade no ambiente empresarial. Todas as informações sobre diversidade que as empresas nunca tiveram, paulatinamente elas foram obrigadas a produzir, principalmente o recorte de raça. Essa igualdade que a gente advoga é uma igualdade que ainda não permitiu que até hoje tivéssemos um negro na presidência das grandes empresas, uma mulher negra na presidência das empresas do nosso país.”
Vicente destacou outro acontecimento que estamos vendo se constituir, ganhar corpo. “A responsabilização. Seja civil, seja administrativa, seja até criminal daquelas empresas que não praticam a inclusão, a igualização ou daquelas empresas que diante do fato concreto ou praticam ou permitem ou se omitem diante do crime racial.’
Para ele, todos perdem com o racismo e com a discriminação, todos perdem com o racismo estrutural. “Permanece colocado a todos nós o desafio de superar essa agenda. O desafio está colocado de forma mais confortável do que tínhamos anteriormente. Nós progredimos, nós saímos de um patamar, no qual o tema não estava na agenda, para colocá-lo na letra da Lei. As cotas e as políticas afirmativas estão dentro de uma lei. Agora, isso precisa efetivamente ser cumprido. Está nas nossas mãos a mudança que nós precisamos é a mudança que nós tivermos capaz de tornar realidade. Para fazer mudança a gente precisa estar junto na mesma direção, precisamos estar com entusiasmos, precisamos estar com a determinação e precisamos estar com compromisso de que nós precisamos e devemos fazer a mudança que nosso tempo necessita. A mudança que necessitamos para um futuro muito breve é um ambiente corporativo, um ambiente empresarial, é uma sociedade em que as oportunidades sejam disponibilizadas de forma igualitária, para todos aqueles que cumpram os requisitos estabelecidos e que se constitua num acesso que nem a cor e nem a raça sejam um elemento limitador e seja um elemento impeditivo, para a gente fazer com que a igualdade e a justiça se manifestem e se tornem uma rotina na gestão das empresas e da sociedade.”