IPO do banco digital representa golpe de morte na Caixa pública e social

Gestão Pedro Guimarães, de olho na abertura de capital da nova subsidiária nos Estados Unidos, na Nasdaq, tenta provar modelo de negócio da versão virtual do banco, com inclusão dos beneficiários do Casa Verde e Amarela e do Bolsa Família

Face a uma das mais graves crises econômicas, sociais e sanitárias das últimas décadas, a Caixa Econômica Federal se mostrou essencial para amenizar os efeitos da pandemia do novo coronavírus. O banco, que é 100% público e possui caráter social, atendeu mais de 100 milhões de cidadãos brasileiros por meio do pagamento do auxílio emergencial e de outros benefícios voltados à população mais vulnerável. Essa ação ocorreu sob um governo de orientação ultraliberal, que pretende desmantelar o Estado e as empresas públicas.

Neste contexto, e alinhada com a estratégia de desinvestimentos do governo Jair Bolsonaro, a gestão Pedro Guimarães busca, de maneira atabalhoada, provar modelo de negócio do banco digital, criado em 2020 a partir do Caixa Tem, um aplicativo usado para distribuir o auxílio emergencial. A informação consta na edição desta quinta-feira (11) do jornal O Estado de S. Paulo, que anuncia ser o objetivo da direção do banco abrir o capital da nova subsidiária nos Estados Unidos, na Nasdaq. A manobra foi denunciada por Sergio Takemoto, presidente da Federação Nacional das Associações do Pessoal da Caixa (Fenae), para quem a suposta abertura de capital do banco digital poderá representar um golpe de morte na Caixa pública e social.

Segundo o Estadão, enquanto aguarda a aprovação do BC para segregar a operação, passo necessário para a oferta inicial de ações (IPO, na sigla em inglês), a atual gestão do banco público prepara a inclusão na base do aplicativo Caixa Tem de um contingente de três milhões de beneficiários do programa Casa Verde e Amarela (substituto do Minha Casa Minha Vida) e de outras 19 milhões de famílias do Bolsa Família. Recentemente, a Caixa assumiu a gestão e o pagamento do DPVAT, seguro destinado a indenizar vítimas de acidentes de trânsito, e pretende oferecer ainda microcrédito e criar um ecossistema por meio de um “marketplace”, para incorporar varejistas ao aplicativo, a pretexto de aumentar a rentabilidade do negócio.

Para Rita Serrano, representante dos empregados no Conselho de Administração da Caixa, o avanço digital do banco público distingue-se das demais instituições financeiras digitais por sua origem e trajetória singulares, surgindo no meio de uma grave crise sanitária e econômica, a partir de esforços dos empregados que empreenderam e inovaram com recursos exclusivamente públicos. “Essa experiência é um exemplo de eficiência e inovação pública sem paralelo na iniciativa privada. Portanto, todo esse salto de qualidade tecnológica deveria ser usado para fortalecer o banco, melhorar a segurança das operações e impulsionar o seu papel como instituição pública, mas o que a direção da Caixa pretende é transferir toda essa herança para o banco digital e em seguida privatizar”, alerta.

De acordo com Rita Serrano, que votou contra a proposição do banco digital no Conselho de Administração, por considerá-la profundamente danosa para a manutenção e sustentabilidade da instituição pública, a primeira questão a ser colocada é de como fidelizar e manter ativas as 105 milhões de poupanças digitais com o fim do auxílio emergencial, desemprego crescente e a ausência completa de um projeto de desenvolvimento para o país que gere emprego e renda. E completa: “A oferta de microcrédito, anunciada pelo gestor Pedro Guimarães como chamariz para o segmento dos mais pobres, só é possível acontecer nas dimensões pretendidas se for tratada como política pública, de governo, e para isso é necessário dispor-se de ferramentas de orientação para pequenos negócios e acompanhamento”.

A conselheira opina que a criação de uma subsidiária, com natureza jurídica de sociedade anônima, abre grande espaço a que se faça com ela o que já se anunciou antes fazer com a própria Caixa: abertura de capital e privatização, o que poderá causar prejuízos à sustentabilidade, integridade e autonomia do único banco 100% público do país, tão necessário ao Estado brasileiro. “Se o governo não tivesse um banco como a Caixa, uma instituição púbica com capacidade técnica, expertise e compromisso, o auxílio emergencial talvez tivesse que ser pago, em pleno século 21, com cheque enviado pelos Correios, como ocorreu nos EUA. A Caixa é um banco público, patrimônio da sociedade, e não podemos permitir seu fatiamento”, avalia.

O presidente da Fenae concorda com esse raciocínio. Ele considera a criação do banco digital mais uma etapa para privatizar a Caixa. “O coração do banco, a função pública e social da instituição será transferida para um outro CNPJ, que não é o da Caixa. Qual será o futuro dos programas e benefícios sociais se estiverem sob o controle do mercado privado, que apenas aposta no lucro? As políticas públicas que atendem a população mais vulnerável do país serão garantidas?”, questiona Sergio Takemoto.

O dirigente declara que esse é mais um duro golpe, no sentido da privatização do banco público. “A gestão Pedro Guimarães já está fazendo a privatização de seguros, faz também a privatização das loterias e anuncia que pretende privatizar o setor de cartões, gestão de terceiros, a questão do FGTS. Tudo isso ameaça a sobrevivência da Caixa. São justamente os setores mais rentáveis e que dão suporte e sustentação à parte social que o banco desempenha”, denuncia.

Defesa da Caixa pública e luta contra o retrocesso nas unidades

Na avaliação da Fenae, a reestruturação imposta pela direção da Caixa é consequência direta da linha ultraliberal e do retrocesso praticado pelo governo Bolsonaro no ambiente de trabalho. Hoje, o quadro de pessoal é bastante reduzido, o que sobrecarrega empregados, precariza o atendimento e reduz o papel social da Caixa. Por isso, mais uma vez, a Federação cobra mais contratações e denuncia as metas desumanas e abusivas, que extrapolam o razoável e pioram ainda mais as condições já precárias de trabalho enfrentadas pelos bancários nas unidades, agravada pela conjuntura política e econômica do país. “Este é o cenário contra o qual a Fenae e outras entidades representativas lutam hoje na Caixa”, reitera o presidente Takemoto.

Fonte: Fenae

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