Moro já era político desde a Lava Jato

Novas revelações de conversas mostram ações em que a principal motivação para o vazamento era política, e não jurídica
Brazilian Justice Minister and former judge Sergio Moro gestures during a hearing at Senate's Constitution and Justice Comission in Brasilia on June 19, 2019. - Moro -who has faced calls to resign over allegations he improperly collaborated with anticorruption prosecutors to keep leftist icon Luiz Inacio Lula da Silva out of the 2018 presidential race- said that the alleged conversations questioning his impartiality do not go beyond a "sensationalist" attack and a "revanchism" for his work. (Photo by EVARISTO SA / AFP)

Novas revelações de conversas do atual ministro de Justiça e Segurança, Sérgio Moro, com procuradores da Lava Jato, reveladas neste domingo pela Folha de S. Paulo e o The Intercept Brasil, evidenciam o viés político da operação. Os diálogos mostram que, mesmo sabendo da ilegalidade, a equipe se articulou para vazar informações sigilosas da delação da Odebrecht para a oposição venezuelana após uma sugestão do então juiz Sergio Moro.

As conversas privadas pelo aplicativo Telegram em agosto de 2017 indicam que a principal motivação para o vazamento era política, e não jurídica, e que os procuradores sabiam que teriam que agir nas sombras. “Talvez seja o caso de tornar pública a delação dá Odebrecht sobre propinas na Venezuela. Isso está aqui ou na PGR?”, sugeriu Moro ao coordenador da força-tarefa da Lava Jato em Curitiba Deltan Dallagnol às 14h35 do dia 5 de agosto.

Deltan respondeu mais tarde, explicando como eles poderiam fazer a operação: “Não dá para tornar público simplesmente porque violaria acordo, mas dá pra enviar informação espontânea [à Venezuela] e isso torna provável que em algum lugar no caminho alguém possa tornar público”. Antes, Deltan já havia dito a Moro, em meio a uma conversa sobre os vazamentos: “Haverá críticas e um preço, mas vale pagar para expor e contribuir com os venezuelanos”.

A intenção de expor informações secretas comprometedoras contra o governo de Nicolás Maduro, agindo politicamente, o que não é papel do MPF, chegaria em um momento bastante tenso. Em julho daquele ano, os EUA tinham ameaçado Maduro com novas sanções se a Venezuela prosseguisse com a fundação de uma Assembleia Constituinte — uma nova entidade legislativa criada para fortalecer o governo e desmoralizar o Congresso, dominado pela oposição.

Uma semana depois, Trump faria uma ameaça de ação militar pela primeira vez desde o começo das tensões entre Washington e Caracas, quando Hugo Chávez foi eleito presidente em 1999. A divulgação não autorizada de informações sigilosas por parte dos procuradores poderia caracterizar, em tese, o crime previsto no artigo 325 do Código Penal, que pune com até dois anos de prisão o agente público que “revelar fato de que tem ciência em razão do cargo e que deva permanecer em segredo, ou facilitar-lhe a revelação”.

Moro pede licença

Parece que os vazamentos já começaram a afetar o ex-juiz Sérgio Moro. O ministro da Justiça e Segurança Pública ficará afastado do cargo na próxima semana “para tratar de assuntos particulares“. O período de afastamento do ministro se dará de 15 a 19 de julho. O despacho presidencial que autoriza a licença de Moro está publicado no Diário Oficial da União (DOU) de hoje, sem mais informações sobre os motivos da decisão.

Defensores de Moro também tem ficha suja

Mesmo estando moralmente nu após as revelações da Vaza Jato, o ex-juiz ainda é o político mais popular do país e conta com uma legião de políticos dispostos a defendê-lo incondicionalmente. A tropa de choque bolsonarista no Congresso tem se mostrado fiel. Não é pra menos. O herói anti-corrupção mal chegou no governo e já começou a passar pano para a lama bolsonarista. Perdoou o caixa 2 de Onyx Lorenzoni, fechou os olhos para o laranjal do PSL e não se incomodou com as estreitas relações da família Bolsonaro com as milícias. Pelo contrário, o ministro tem se mostrado bastante confortável em integrar o governo da extrema direita.

As farras do judiciário brasileiro podem acabar

Os desmandos do Poder Judiciário brasileiro estão na mira do Congresso Nacional, que acelerou nas últimas semanas a votação de um projeto que prevê a punição de juízes e promotores pelo crime de abuso de autoridade.

A medida é vista como urgente por operadores do Direito, diante do nível de abusos cometidos nos últimos anos contra indivíduos e instituições por setores do Judiciário. Muitos, porém, veem com ressalvas a iniciativa e consideram que a elaboração de uma nova lei não irá, por si só, reverter a balança da Justiça em favor dos mais pobres e das causas populares.

A proposta já foi aprovada na Câmara e no Senado e faz parte do pacote conhecido como “10 Medidas Contra a Corrupção”, lançado em 2016 pelo Ministério Público Federal, que se aproveitava na época do sucesso da operação Lava Jato.

Não constava da versão original a punição por abuso de autoridade, que foi incluída pelos deputados em 2017. Como o projeto sofreu novas alterações no Senado, ele terá de voltar à Câmara.

A tramitação da matéria ganhou celeridade no Congresso Nacional após o desgaste da Lava Jato causado pelas reportagens do site The Intercept Brasil, com acusações de conluio entre o ex-juiz Sérgio Moro e procuradores da força-tarefa para manipular investigações e, entre outras ilegalidades, condenar sem provas o ex-presidente Luiz Inácio Lula da Silva.

Maioria da população considera conduta de Moro ilegal

Pesquisa Datafolha divulgada na sexta-feira (6) mostra que a maioria dos entrevistados (58%) acredita a postura de Sergio Moro enquanto juiz federal foi inadequada no âmbito da operação Lava Jato. O mesmo percentual defende que as suas decisões sejam revistas caso as conversas divulgadas pelo Intercept Brasil sejam comprovadas. Conforme o jornal Folha de S.Paulo, apenas 31% dos entrevistados que ouviram falar sobre as trocas de mensagens entre Moro e procuradores federais, entre eles Deltan Dallagnol, aprovam a conduta do atual ministro da Justiça e Segurança Pública do governo de Jair Bolsonaro (PSL). Não souberam opinar 11% deles. A aprovação do ex-juiz também caiu de 59% para 52% em relação à pesquisa mais recente, realizada em abril.

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