Proposta de 1991 altera lei de greve para facilitar paralisações, ao limitar ‘serviços essenciais’ e impedir Justiça de julgar ‘abusividade’. Regras valeriam também para servidores, o que fez Comissão do Trabalho ‘ressuscitar’ projeto.
(Brasília) A decisão do governo de definir regras para greve de funcionários públicos e um julgamento do Supremo Tribunal Federal (STF) sobre o mesmo assunto levaram a Comissão de Trabalho da Câmara dos Deputados a entrar no debate do tema, desengavetando proposta de 16 anos atrás. Para alguns parlamentares, seria bom ter um projeto alternativo para contrapor-se ao do governo – que pelo que se sabe até agora vai tentar limitar as paralisações – e para confrontar uma eventual sentença do STF, outra possibilidade de restrição da greve. O ponto de partida da comissão, contudo, pode acabar mexendo inclusive no direito de greve dos trabalhadores de empresas privadas.
A idéia ressuscitada – projeto de 1991 de autoria do então deputado e hoje senador Paulo Paim (PT-RS) – propõe regras flexíveis à greve no setor público, ao mesmo tempo em que relaxa as regras da atual lei de greve válida para funcionários da iniciativa privada. Por isso, agradou a sindicalistas que a discutiram numa audiência pública realizada pela comissão na semana passada. “A tradição jurídica no Brasil é autoritária contra a greve. A Constituição nos dá o direito de greve, mas na lei se tentou barrar esse direito”, disse Carlos Henrique de Oliveira, diretor-executivo da Central Única dos Trabalhadores (CUT).
O projeto reduz a lista dos chamados serviços essenciais, atividades em que paralisações são proibidas. A lei de greve vigente, de 1989, relaciona onze serviços do tipo, como abastecimento de água, venda de medicamentos, transporte coletivo e controle de tráfego aéreo. Pela proposta de 1991, só urgência médica seria essencial. “O fundamental no nosso entendimento é a vida, e só os serviços necessários à sua manutenção é que podem ser considerados essenciais”, afirmou Paim, na justificativa do projeto.
Servidores públicos
Além de redefinir “serviços essenciais”, o projeto determina que as regras nele propostas também seriam aplicadas ao funcionalismo público. Ou seja, regulamentaria a greve de servidores, estabelecendo onde não poderia haver paralisação por ser atividade essencial. É o que o governo pretende fazer ao elaborar uma proposta sua.
Entidades sindicais de defesa de servidores públicos são contra o governo regulamentar o direito de greve, se antes não aceitar que a categoria tenha negociação coletiva, ou seja, que o patrão, no caso o Estado, sente para ouvir reivindicações e negociá-las. Elas querem que o governo ratifique a convenção 151 da Organização Internacional do Trabalho (OIT), que reconhece servidores como categoria e diz que têm direito à negociação coletiva.
“O governo tem de instituir a negociação coletiva e só num segundo momento, discutir solução de conflitos”, disse o secretário-geral da Confederação dos Trabalhadores no Serviço Público, Josemilton Mauricio Costa.
O representante do Ministério Público do Trabalho na audiência pública também defendeu a negociação coletiva para servidores, embora acredite que isso possa ser feito junto com a regulamentação. “A regulamentação é fundamental e deve ser tratada junto com a negociação coletiva”, disse o procurador Ricardo José Macedo de Britto Pereira.
Enquanto governo e Congresso não definem a regulamentação da greve no setor público, a Corte máxima do país movimenta-se para tapar o buraco legal. Num recente julgamento inacabado, a maioria do STF mostrou-se favorável à aplicação da atual lei de greve a servidores públicos. E como a legislação vigente é mais dura, por ter lista maior de serviços essenciais e por prever que a Justiça julgue a eventual abusividade de uma paralisação, por exemplo, os sindicatos de servidores estão com medo do Supremo.
A CUT, central à qual está ligada à maioria das entidades de servidores, está preocupada particularmente com o voto do ministro do STF que relata o caso, Eros Grau. O voto diz que todo serviço público é essencial, ou seja, qualquer funcionário público estaria proibido de parar. “Se existe serviço público essencial, o trabalho pago a quem o exerce não pode ser supérfluo e não pode deixar de atender às necessidades do trabalhador e sua família”, disse Carlos Henrique.
Ex-dirigente da CUT e integrante da Comissão do Trabalho da Câmara, o deputado Vicentinho (PT-SP) concordou com a avaliação, durante a audiência pública. “Se a categoria é essencial, o trabalhador deve ter condições essenciais de trabalho”, afirmou.
Fonte: André Barrocal – Agência Carta Maior