*“Life’s a journey, not a destination
and i just can’t tell just what tomorrow brings…”
Amazing – Aerosmith
* “A vida é uma jornada, não um destino
e, simplesmente, não posso dizer o que o amanhã nos trará…”
Circula por estes dias um texto de Gabor Steingart chamado “Uma baixa causada pela globalização: a morte dos sindicatos”.
Como não deixa de ser um tema instigante, penso que vale a pena debatê-lo. Aqui vai a minha contribuição.
1-Tudo é relativo
Acho que é uma bobagem esse negócio de ficar anunciando por aí, como novidades insofismáveis, o fim disso ou daquilo.
Cito aqui alguns fins anunciados (e não concretizados) nos últimos tempos:
-fim da história;
-fim da luta de classes, das classes sociais;
-fim de uma “raça” se referindo a um partido de esquerda;
-fim do governo Lula;
-fim do socialismo;
-fim do capitalismo;
-fim da família;
-fim da religião;
-fim do trabalho;
-fim dos livros;
-fim dos muros;
-fim da vida;
-fim do mundo;
E agora: o fim dos sindicatos.
O mundo é redondo e por isso dá voltas. O que o autor está argumentando não é mentira. Mas é relativo. O contexto que ele descreve se encaixa bem na Europa e na América do Norte. No entanto, como já escrevi outras vezes, os Estados Unidos da América não é um exemplo razoável de opção para um outro mundo possível.
É importante olharmos a América Latina dos últimos anos.
A MIDIAELITE – grande mídia que pertence a uma dúzia de ricos, tem se mostrado preocupada pelas eleições latino-americanas que, há cerca de 10 anos, vem elegendo candidatos de esquerda ou centro-esquerda. Dizem ser um absurdo “esse povo pobre, semi-analfabeto e mal-informado” ter o poder de decidir as eleições (lembram de uma capa recente da Revista Veja de 16/8/06 com o seguinte chamado “Ela pode decidir a eleição” – referência a uma moça negra, nordestina, educação média e pobre?).
O fato é que a população de países como Brasil, Venezuela, Bolívia, Uruguai, Argentina, dentre outros deste continente, têm optado pela esperança de testar alternativas de governo que não sejam evidentemente conservadoras, liberais, reacionárias e elitistas.
2-O Brasil de Lula
Enquanto Gabor Steingart anuncia a morte dos sindicatos em nível mundial, nos últimos 4 anos o sindicalismo brasileiro renasceu. As greves voltaram. As massas de trabalhadores saíram às ruas e assembléias buscando novos direitos e reajustes salariais depois de 15 anos vivendo em uma situação defensiva como a descrita no artigo dele.
E, ao avaliarmos o resultado das eleições no Brasil deste ano, temos plena consciência de que o povo e os movimentos sociais querem mais para os próximos anos.
Os números mostram que quase a totalidade das categorias, organizadas em sindicatos e associações, tem obtido aumentos reais de salários e novos direitos. Os empregos formais cresceram em quase 5 milhões de postos no governo Lula. Os trabalhadores rurais continuam organizados para buscar muito mais nos próximos anos. Centrais sindicais como a CUT – que representa milhões de trabalhadores, tiveram aumento e não redução de representação, o que mostra que virão bons embates de classe por aí.
Ao perceber a jogada do SFN (Sistema Financeiro Nacional), os bancários criaram a Contraf-CUT (Conf. Nacional dos Trab. Do Ramo Financeiro), que tem o desafio de voltar a agregar todos os trabalhadores que cedem sua mão-de-obra ao sistema, cerca de 1 milhão, e não somente os 400 mil bancários signatários da CCT (Convenção Coletiva de Trabalho), única no país que garante direitos mínimos para uma categoria nacionalmente.
Enfim, no debate ideológico de Garbor Steingart, é importante demarcar bem os limites espaciais e temporais dos objetos, pois penso que são distintos. Espaciais porque a análise pode até se aproximar da situação vivida pelos sindicatos na Europa e nos Estados Unidos. Porém, como descrevi, não é adequada para o contexto de aumento dos movimentos sociais na América Latina. Temporal, porque o tipo de capitalismo na América Central e do Sul é aquele a que chamamos de Capitalismo Tardio, diferente daquele implementado nos países desenvolvidos desde a crise de 29 e da 2ª Grande Guerra e que viria a ser chamado de ciclo de ouro do capitalismo.
É neste contexto do segundo mandato democrático-popular de Lula que a CUT continuará adotando seus princípios classistas, de autonomia e independência e seguirá capitaneando os setores organizados (e aqueles ainda por se organizar) para tornar o Estado Brasileiro o espaço dos interesses públicos e não privados, lutando por mais renda, terra e trabalho para todos.
3-Os anunciados fins… furados
Bom, quanto a esse negócio de decretar a morte ou o fim disso ou daquilo, lembro o seguinte:
Anunciaram o fim de uma “certa raça” e do governo Lula, falando sobre o PT e seus simpatizantes. O partido elegeu o Presidente da República com 58,3 milhões de votos, aumentou de 3 para 5 estados governados e foi o partido mais votado para o Parlamento Nacional em milhões de votos.
Enquanto isso, o PFL – partido do anúncio apocalíptico, quase desapareceu. Acabou o Carlismo na Bahia e só elegeu 1 governador.
A famosa luta de classes tem se mostrado cada vez mais evidente. E que bom!
Vejam as eleições daqui, da Bolívia, Venezuela, Nicarágua (não haviam anunciado o fim do Sandinismo?).
No passado, haviam anunciado o fim da vida com a morte. Vieram aqueles que diziam que a morte era só o começo…
Contam também que houve Aquele que fez o impossível: Anunciaram a morte de um certo Lázaro… mas, contra a lógica, o fizeram viver de novo.
Com o advento do mundo da web e dos e.books, anunciaram o fim dos livros. Engraçado! Pois o próprio Bill Gates para falar sobre o tema escreveu um livro, como disse Alberto Manguel.
Recentemente a Revista Exame anunciou o fim do salário, dizendo “neoliberalisticamente” que esta era uma boa notícia. O fato é que o embate pelo salário, e não pelas remunerações que não são constantes, continua. O Salário Mínimo, por exemplo, teve o maior aumento dos últimos 20 anos e queremos muito mais, pois assim as profissões que demandam formação técnica terão que ser mais bem remuneradas. Será o famoso mercado de trabalho qualificado. Bom não!
E não é que em 1989 anunciaram o fim dos muros. Como esse mundo dá voltas! Sabem quem está construindo muros de apartheid? Tem um ali em Israel isolando palestinos… tem outro, com quilômetros e quilômetros de comprimento, isolando mexicanos e latinos dos Estados Unidos da América.
4-As dualidades permanecem
Falo que tudo é relativo, pois vejo o mundo como o princípio taoísta do yin-yang, princípio da dualidade, onde sempre haverá os opostos e chances de um lado se sobrepor ao outro. E no mundo dos humanos também é assim. Sempre existirão as opções políticas.
É como diz o professor Antonio Candido quando nos lembra que séculos atrás não havia tecnologia para produzir alimento suficiente para todos. Malthus até chegou a anunciar o caos, pois a população crescia exponencialmente e a produção alimentar aritmeticamente. Foi alarme falso. Hoje, a produção mundial de alimentos é absurdamente suficiente para os 6 bilhões de habitantes. Mas, política e economicamente, o mundo prefere jogar comida fora (caros e belos restos no lixo!) e deixar milhões passando fome, a ter o risco dos alimentos ficarem muito baratos e causarem prejuízos aos produtores.
No mundo do trabalho é a mesma coisa. No século XIX, os proletários trabalhavam umas 16 horas por dia. Aí vieram os anos de welfare state. Vieram as reduções de jornada e ampliação de direitos.
Agora, com as terceirizações e busca frenética de mercados mundiais miseráveis, todos estão trabalhando “full time”, umas 16 horas por dia novamente. No entanto, a sociedade está adoecendo. Já estão percebendo que não há vantagem em se matar de tanto trabalhar para mostrar a tal “competência”
5-Mudanças constantes
Tenho convicção de que as coisas mudam. E podem mudar para melhor. E melhor para a maioria e não para alguns. Sempre nascerão aqueles que querem o bem comum e também aqueles que só pensam em si mesmos.
Acredito que um outro mundo é possível. A população do “terceiro mundo”, apesar do desgosto da elite dominante, tem mostrado essa vontade de participar do bolo das riquezas que cresceu sempre e nunca foi distribuído.
São os novos tempos (de hoje).
* William Mendes é secretário de Imprensa da Contraf-CUT