Convicções políticas, ideológicas e filosóficas variadas, diferentes visões de mundo, defesa de interesses corporativos e de classe. Tudo isso faz parte da essência do regime democrático e se constitui num bem civilizatório. Desse choque de ideias surge o caminho republicano a ser seguido. A honestidade intelectual, a tolerância e a conduta ética são requisitos fundamentais para o enriquecimento desse debate. Mas os barões do monopólio da mídia e seus porta-vozes no parlamento ignoram esses preceitos e apelam para a mentira e a calhordice para manter seus privilégios.
A reação furiosa ao discurso de posse do novo ministro das comunicações, Ricardo Berzoini, segundo o qual o governo vai promover o debate sobre a regulação econômica da mídia, só reafirma a urgência de o Brasil consolidar sua democracia através da democratização das comunicações.
Políticos conservadores e de direita como Aloisio Nunes Ferreira, Alvaro Dias e Eduardo Cunha têm todo o direito de expressar suas posições alinhadas com a manutenção do status quo do monopólio midiático. Isso é um coisa. Outra bem diferente é fazer da mistificação mais rasteira e da mentira mais deslavada seus únicos argumentos nesse debate.
Senão vejamos : é evidente que esses políticos experientes têm conhecimento de que em todas as democracias avançadas do capitalismo central a mídia é regulada. Sabem também que as legislações que regem as comunicações em países como Portugal, Suécia, Estados Unidos, Inglaterra, França, Alemanha, Dinamarca, e mais recentemente Argentina e Uruguai, têm como base a vedação de oligopólios e monopólios, o incentivo a produções locais e regionais, a pluralidade e o equilíbrio entre emissoras estatais, públicas e privadas.
Contudo, a bancada do PIG não hesita em acusar o PT de atentar contra a liberdade de expressão, cláusula pétrea da Constituição. Canalhice pura. O que os lutadores pela democratização da mídia pregam há anos é exatamente o contrário. Defendem, isto sim, a mais ampla liberdade de expressão, algo impensável no Brasil enquanto poucas famílias controlarem todas as plataformas de comunicação.
Como legisladores que são, os parlamentares inimigos da regulação estão carecas de saber que o que se pretende, basicamente, é regulamentar os artigos 220, 221, 222, 223 e 224 do Capítulo 5 do Título VIII da Constituição de 1988, que trata da Comunicação Social. Não regulamentados até hoje justamente devido ao lobby dos barões da mídia, esses artigos proíbem o oligopólio e o monopólio, estabelecem a descentralização da produção de conteúdo (hoje 70% são produzidos no eixo Rio-São Paulo) e determinam o equilíbrio da radiodifusão com a divisão entre os sistemas estatal, público e privado.
O projeto do ex-ministro Franklin Martins, que deve ser o ponto de partida do debate fomentado pelo Ministério das Comunicações, não tem um item sequer que abra brecha para qualquer tipo de censura. O Globo, Folha, Veja e Estadão que fiquem sossegados. Eles poderão continuar publicando suas bobagens e mentiras à vontade. Ninguém vai tocar no lixo de jornalismo que praticam. O objetivo é dar vez e voz para uma sociedade complexa como a nossa, com múltiplas visões econômicas e políticas e grande diversidade social, regional e cultural.
Bepe Damasco é jornalista e blogueiro com longa trajetória em assessorias políticas, parlamentares e sindicais