A última fase da fusão com o Santander deixou muitos clientes do antigo Real irritados e contribuiu para que o banco espanhol chegasse à liderança de reclamações.
Levantamento feito pelo iG com números de reclamações em São Paulo, estado com a maior quantidade de ocorrências, mostra que os registros contra o Santander este ano, até 14 de maio, subiram 58% na comparação com igual período de 2010. A instituição financeira também superou o Itaú Unibanco em número de reclamações, somando 795.
Os dados são do Sistema Nacional de Informações de Defesa do Consumidor (Sindec), programa que integra em rede as ações da Defesa do Consumidor do Ministério da Justiça. Representa o trabalho do Coordenador do Sistema Nacional de Defesa do Consumidor e dos Procons integrados.
Na mesma comparação, o Banco do Brasil é o segundo colocado, com 675 registros e aumento de 40%. Itaú Unibanco fica em terceiro lugar, com 645 reclamações, mas queda de 11,7%. Já o Bradesco é o quarto colocado entre os maiores bancos do país, com 531 registros e recuo de 5,3%.
Marcelo Zerbinatti, diretor de processos e gestão de mudanças do Santander, reconhece que o banco passou por problemas técnicos na última fase da fusão, ocorrida em fevereiro. “Quando demos início à integração dos sistemas das agências, tivemos problemas técnicos na Internet, que duraram de três a cinco dias”, conta. “Esse fato acabou causando congestionamento nas linhas de Call Center.”
Ele acredita que, após esse pico, o ritmo de reclamações tenha caído. “Acompanhamos hora a hora o nível de reclamações no Call Center, e ele está diminuindo”, disse. De acordo com o diretor, a tendência é que o ritmo de registro de insatisfações fique num patamar menor que antes da migração.
Integração de sistemas elevou reclamações
Em 1º de novembro de 2007, um consórcio composto pelo Santander Espanha comprou quase a totalidade do capital do ABN AMRO, que controlava o Real. Em 30 de abril de 2009, o Banco Real foi incorporado pelo Santander Brasil e foi extinto como pessoa jurídica independente.
O último passo da integração aconteceu em fevereiro, quando os sistemas tecnológicos das agências foram unificados. Segundo Juvandia Moreira, presidenta do Sindicato dos bancários de São Paulo e região, apesar de o processo ter demorado três anos para ser completado, a junção tecnológica foi feita de maneira rápida demais.
“Nós alertamos o Santander várias vezes, pedindo para que fizessem essa última transição por áreas, numa mudança paulatina, para evitar transtornos”, diz. “Mas o banco decidiu fazer isso de uma vez.”
Segundo ela, a fusão entre o Banco do Brasil e a Nossa Caixa também gerou muitas reclamações, em função do mesmo problema. Porém, nas uniões entre Bradesco e BCN e Itaú com Unibanco, o nível de reclamação de funcionários e clientes foi menor.
O dinheiro sumiu
Entre as reclamações que envolvem o Santander no sindicato estão erro de endereços e em saldos das contas. “Houve caso de saldo que apareceu zerado”, disse Juvandia. O Banco Real era conhecido pela bandeira ligada à sustentabilidade.
Também facilitava o acesso dos jovens ao sistema bancário, oferecendo contas aos universitários. Muitos de seus clientes continuaram fiéis, em função do tratamento que recebiam. O executivo Rodrigo era um deles. “Sempre gostei muito do Real. Para mim, era o que tinha o melhor atendimento”, afirma.
“Quando mudei de empresa, passei a receber meu salário no Itaú. Mesmo pagando taxas mensais, continuei transferindo tudo para o Real”, diz o gerente comercial, que também preferiu não divulgar seu sobrenome.
Mas as coisas mudaram depois que o Real foi comprado pelo Santander.
Rodrigo diz que teve seu cartão clonado, com a retirada de R$ 2,6 mil de sua conta. “Um problema parecido já tinha acontecido quando eu era cliente do Real, e tudo foi resolvido sem problemas”, afirma. “Mas, no Santander, chegaram a sugerir que eu havia fraudado a conta e não queriam me pagar.”
A situação só se resolveu depois que Rodrigo enviou uma carta ao banco dizendo para que ficasse com o produto do roubo. Insatisfeito, o executivo fechou sua conta depois do ocorrido.
Já a secretária Mônica, que também preferiu não divulgar o sobrenome, conta que, depois da mudança de Real para Santander, os funcionários da agência onde tem conta não atendem o telefone. Ela reclama ainda da frenética troca de gerentes na agência. “Combinava tarifas e planos com um gerente para, no mês seguinte, entrar outra pessoa e começarmos tudo do zero”, conta. Segundo a secretária, a dança das cadeiras continua até hoje. “Nos contatos que tenho com os funcionários, sinto que estão desmotivados.”
No Twitter, os saudosistas
Casos como o de Mônica e de Rodrigo tornaram-se mais frequentes e reclamações podem ser vistas todos os dias nas redes sociais. No Twitter, por exemplo, continuam sendo postadas frases saudosistas. “De um banco eficaz, pró-ativo e com pessoas com boa vontade …. o #bancoreal passou a ser um banco de má vontade. É geral!” diz Marcos Teles de Farias.
Na Proteste, entidade civil independente de Defesa do Consumidor, semelhante ao Procon, as reclamações sobre o Santander dispararam. A alta foi de 580%, de cinco registros entre janeiro e abril de 2010, para 34 no mesmo período desse ano. No Banco do Brasil o aumento foi de 107%, para 27 registros; no Bradesco foi de 100%, para 26; e no Itaú ficou em 54%, para 68 reclamações.
Tatiana Viola de Queiroz, advogada da Proteste, registrou casos de penhora de salário nessa migração. “Uma pessoa entrou com reclamação pois teve 80% de seu salário penhorado pelo Santander, que alegou estar descontando dívidas atrasadas”, disse. Em outra ocasião, uma conta corrente registrou um débito de R$ 3.400,00 por tarifas não pagas.
No mais novo capítulo da fase de pós-integração, sindicato e banco fizeram um acordo sobre demissões. Nessa semana, foi fechado um entendimento para a criação de um centro de realocação interno no banco. O acordo foi assegurado depois que o sindicato recebeu informações, em abril, de que, num estudo interno, o banco avaliava a possibilidade de demitir milhares de pessoas.
“Queremos um relacionamento duradouro com os clientes”, diz Santander
Marcelo Zerbinatti, diretor de processos e gestão de mudanças do Santander, disse que fica preocupado ao ouvir reclamações sobre má vontade no atendimento do banco. “A orientação é atender a todos da melhor maneira possível. Não queremos fazer negócios com os correntistas que durem apenas uma semana, 15 dias. Queremos um relacionamento de ganha-ganha.”
O executivo afirmou que é difícil discutir cada reclamação feita na reportagem, por não ter o histórico dos clientes. Ele disse, entretanto, que a troca freqüente de gerentes não é praxe. “Na migração, orientamos as agências a manter clientes ligados aos antigos gerentes, para evitar problemas.”
Ele também afirma que as agências são orientadas a atender os correntistas o mais rapidamente possível e, quando isso não é possível, retornar. “O cliente pode estar ligando em horário de pico da agência, e encontrar dificuldades. Temos estudos e projetos para melhorar nossos canais de atendimento.”
No caso do saldo zerado, Zerbinatti acredita que possa ter havido um problema específico na conta do consumidor. Ele garante que, após os simulados, a migração não apontou nenhuma alteração em saldos. “O que pode acontecer é, às vezes, o cliente não entender o novo extrato, e nossa equipe não ter sanado adequadamente as dúvidas.”
Erros de correspondência e clonagem
O executivo disse também que a migração de cadastros foi feita em maio de 2009. “Tínhamos canais abertos para resolver os problemas de endereço.”
No episódio da clonagem de cartão, Zerbinatti afirmou que algumas ocorrências exigem um tempo maior de apuração, o que pode ter levado à insatisfação do cliente. “De qualquer maneira, a orientação é primeiro resolver o problema do correntista, e depois partir para os procedimentos de rotina.”